terça-feira, 29 de outubro de 2013

A COISA ESTÁ ACEFALADA



















Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 29/10/2013 - A144

O caso da IN/RFB 1.397 é por demais emblemático. E por dois motivos. Primeiro, evidenciou o grau extremo de insanidade que essa norma encerra. Segundo, por provocar uma enérgica e fantástica reação do contribuinte. O governo, tão acostumado a tripudiar sobre o contribuinte, achou que não havia limite para a expansão da tirania fiscal. A Instrução Normativa 1.397/2013 obrigaria meio mundo de empresas a reabrir seus últimos balanços para identificar dividendos supostamente distribuídos em excesso por conta de um imbróglio jurídico criado pelo próprio fisco federal. Esse fato resultaria num terremoto a sacudir mais ainda a combalida imagem do Brasil nos mercados internacionais, onde somos vistos com desconfiança por causa da famigerada insegurança jurídica.

De forma atabalhoada, a Receita Federal acabou prestando um grande serviço à nação com sua IN 1397, cuja efetivação provocaria um rombo de dezenas de bilhões de reais no caixa de muita gente grande. Por já está tão habituado a tirar o couro do contribuinte, o governo resolveu degolar de vez o patrimônio das empresas para ficar com sua carcaça. Só que, diante do perigo real e imediato, o contribuinte, dessa vez, reagiu. Reagiu como o filho crescido que cansou de apanhar do pai. A pressão organizada de diversas entidades forçou o recuo do governo, que acabou engavetando a diabólica IN 1397. Oficialmente, o fisco desistiu da cobrança para preservar a segurança jurídica do país. Na realidade, fez isso porque foi encostado na parede.

Todo esse furdunço nos leva a concluir que o fisco não está totalmente à vontade para fazer o que quiser. Tudo que faz de excessivo; faz porque o contribuinte deixa fazer. E um bom exemplo de submissão está estampado na Lei Complementar 123/2006 (Simples Nacional), que em tese existe para resguardar o direito das pequenas empresas. Na verdade, essa dita norma mostra um mundo ao revés com o qual sonhavam os pequenos empreendedores. A LC 123 é um primor naquilo que os nossos legisladores são mestres por excelência, que é a arte da embromação erudita. Num dado momento, diz que a tributação do ICMS é de determinada forma. Em outro momento, diz outra coisa. Aqui, a carga é leve; mais à frente, a carga é violenta. Ou seja, a lei diz, desdiz, vai em cima, vai embaixo; tudo é meticulosamente construído para criar uma falsa impressão de ambiente fiscal favorável à pequena empresa.

Nas reuniões do Conselho Nacional de Política Fazendária, já não existe mais pudor ou bom senso quando o objetivo é aumentar a arrecadação a qualquer preço. Não importa quantas regras legais ou morais tenham que ser quebradas ou quantos diretos constitucionais tenham que ser violados. A embriaguez do poder é total e absoluta. E assim, tomados de arroubos confiscatórios os membros do Confaz atacam a pequena empresa sem dó nem piedade, como o leão que ataca o filhote recém-nascido da mamãe antílope. As entidades que deveriam defender o micro empresário se omitem e se apequenam diante do poder governamental. Na realidade, a omissão é geral. E o exemplo mais ostensivo dessa omissão está na aviltante tributação do ICMS sobe as empresas do Simples Nacional. Dessa forma, pergunta-se: Onde estavam essas entidades quando concordaram com os termos da LC 123? E o que fazem agora? Nada. Corre rumores do tal movimento em torno do Simples Universal, o qual está fazendo muito barulho, mas que provavelmente será acachapado pelo poder tributante do Confaz. Ou seja, a omissão de quem deveria defender o pequeno empresário mostra que a coisa toda está acefalada.

Outro grande exemplo de omissão e condescendência está nos transtornos de operacionalização da Declaração de Ingresso no Amazonas. A falta de gerenciamento adequado desse novo dispositivo de controle fiscal está enlouquecendo os contribuintes alcançados pela norma. Nosso ente fazendário estadual, apesar de contar com pessoal técnico de excelente qualidade, se engasgou com a D.I.A. de tal forma que não está conseguindo encontrar uma saída honrosa do imbróglio que se meteu. E se o problema não está na equipe técnica, está na gestão da coisa. O que então dizer às vítimas do sistema opressor? Poder-se-ia dizer: Mirem-se no exemplo dos bravos combatentes da IN 1397.



terça-feira, 22 de outubro de 2013

OS IMPOSTOS ESTÃO MATANDO AS EMPRESAS



















Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 22/10/2013 - A143

Na quinta-feira última, o Jornal da Globo exibiu uma reportagem que ilustra de forma cabal o nível extremo que chegou o descontrole fiscal no Brasil. A matéria tratou do lançamento do vídeo game Playstation 4, da Sony, cujo preço estimado para venda ao consumidor será de R$ 4.000,00. Com esse valor em mãos é possível viajar para Miami, comprar o PS4 por lá, ficar três dias hospedado num hotel simples, voltar para o Brasil e ainda sobrar um bom trocado. A Sony argumenta que isso acontece por causa da alta carga tributária do país. A reportagem mostra que, além do mais, pesa também o famigerado Custo Brasil e uma de Taxa de Insegurança Jurídica, consequência da preocupação das empresas com a política intervencionista do governo. O preço do PS4 nos Estados Unidos é de US$ 399,00. Dessa forma, fica no ar a suspeita de que a Sony se aproveitou da balbúrdia tributária para vender o seu produto pelo maior preço do planeta. O pior é que dificilmente alguém conseguiria encontrar justificativas absolutamente incontestáveis para provar que a empresa está errada na sua argumentação.

Nem todos podem se proteger do campo minado que se tornou o nosso sistema tributário. O empresário que está diariamente labutando para manter vivo o seu negócio é obrigado a se virar nos trinta diante do tsunami fiscal que invade a sua loja, levando embora o seu dinheiro, suas mercadorias, seu patrimônio etc. A pressão é tamanha e é constante. Lembra o indivíduo que depois de usar toda a pasta de dente, continua a espremer, espremer, espremer. Quando não tem mais nada ele aperta o bico do tubo com um alicate para sair mais um pouquinho. É assim que se comportam os entes fazendários. Por exemplo, o tributo Finsocial, posteriormente rebatizado de Cofins, foi instituído pelo Decreto-Lei 1940/82 com alíquota inicial de 0,5% onde após sucessivas e intermináveis majorações chegou aos atuais 7,6%. Ou seja, simplesmente aumentou 1.420%. E o governo não está satisfeito. Outro caso emblemático se refere ao prazo de recolhimento do PIS, em cujo Boletim IOB 26/1987 consta o prazo de seis meses para o devido recolhimento aos cofres públicos. O prazo foi diminuindo, diminuindo até ser cobrado antecipadamente via sistema monofásico. Ou seja, a nossa política fiscal é resultado da perversa combinação aumento de carga com prazo apertado. Não seria de se estranhar se o governo resolvesse cobrar todos os impostos do ano logo em janeiro. Portanto, o fisco começou a apertar, pressionar, sufocar; foi gostando da brincadeira. E assim, enquanto não houver um levante empresarial a coisa só tende a piorar.

O desespero é geral; tradicionais famílias de comerciantes estão vendo morrer o sonho dos seus ancestrais e os novos empreendedores lutam desesperadamente contra a mão abortiva do fisco. Como se não bastasse o peso da carga tributária faz-se presente na alma empresarial as enlouquecidas obrigações acessórias como um espírito maligno a infernizar a vida de quem trabalha. O cipoal entrelaçado da multiplicidade desmedida dos controles impostos pela legislação tributária é absolutamente impraticável. Isso é percebido quando se busca informações nas entidades fazendárias onde é possível constatar que os funcionários não conseguem explicar para o contribuinte as regras que eles mesmos criam. Lidar diariamente com assuntos burocráticos/fiscais nesses órgãos é sentir na carne o pleno significado da palavra inferno.

Na sua recente visita a Manaus, a ex-senadora Marina Silva parafraseou o poeta Victor Hugo ao afirmar que nada é mais poderoso do que uma ideia cujo tempo chegou. Ela afirmou ainda que quando a sociedade assume para si a responsabilidade, a agenda; os políticos são obrigados a fazer, a atender as demandas sociais. Quando o povo apenas fica na expectativa de ver suas demandas atendidas os políticos vão fazer o que quiserem. Ou seja, é insustentável do ponto de vista político achar que alguém vai lhe propor um destino. A sra. Marina disse ainda que quando a escravidão era um problema dos senhores de engenho, o regime escravista se matinha de pé. Quando se transformou num problema da sociedade, dos poetas, dos artistas, dos padres, de todo mundo, a escravidão foi extinta. Talvez as palavras da ex-senadora nos faça refletir sobre o nosso comportamento em relação à tirania fiscal. Há muito tempo estamos tratando o aperto fiscalista como um problema da relação empresa/governo, quando na realidade é um problema de todos, visto que o impacto total e final recai sobre o consumidor, o qual acaba pagando absurdamente mais caro do que o razoável. Quem sabe não estaria na hora de envolver toda a sociedade nessa luta contra o extrapolado e desmedido poderio tributante, tão acostumado a tratar a legislação tributária como massa plástica que pode ser moldada ao sabor das conveniências. Concluindo o raciocínio, assim como nos orgulhamos de ser gigante pela própria natureza é chegado o momento de sermos gigantes pela natureza das decisões que tomarmos.



terça-feira, 15 de outubro de 2013

SIMPLES PAGA MAIS E PAGA EM DOBRO



















Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 15/10/2013 - A142

As normas tributárias brasileiras vão surgindo aos sobressaltos. É taxação demais, é sobreposição de regras, é decisão tomada no meio da madrugada, é susto dum lado, é obscuridade do outro etc. A Revista Consultor Jurídico divulgou por esses dias alguns dados assustadores, tais quais: Nos últimos 25 anos foram publicadas no Brasil 4.785.194 normas legais, sendo que 309.247 tratam de assuntos tributários. Ou seja, em média, foram editadas 31 normas tributárias por dia, sendo que somente 7,6% estavam em vigor até o dia 01 desse mês. Segundo o periódico, a estrutura de controle fiscal imposta pelos entes fazendários obriga as empresas a cumprir, em média, 3.512 normas tributárias diferentes. A compreensão técnica de cada uma delas exige que o Contador se debruce num mundaréu de páginas inundadas de tecnicismos, contradições, casuísmos, conexões infinitas com outras legislações, linguagem extremamente árida, violações do ordenamento jurídico etc. Os dados são do IBPT, que aponta também o valor de R$ 45 bilhões que as empresas gastam por ano somente com a estrutura necessária para o gerenciamento e acompanhamento das infindáveis e ultra complexas obrigações acessórias. Isso, fora o valor dos impostos pagos. Ao que parece, as normas tributárias brotam de cérebros alienados e absolutamente desconectados da realidade empresarial. Tais pessoas ficam enclausuradas em torres de cristal isoladas do mundo. Sua função é viajar nas ondas maionesísticas enquanto psicografam instruções técnicas vindas do além.

O resultado de tantas convulsões tributárias se traduz no circo de horrores que deparamos diariamente. Uma das evidências mais grotescas que está aí, molestando o nosso Estado de Direito, é a absurda cobrança ilegal do ICMS substituição tributária das empresas enquadradas no Simples Nacional (sistema integrado de pagamento de impostos e contribuições das microempresas e empresas de pequeno porte). Uma empresa que fatura anualmente até R$ 180.000,00 está obrigada ao pagamento de 1,25% de ICMS. No outro extremo, um faturamento anual de R$ 3.600.000,00 está sujeito à alíquota máxima de ICMS de 3,95%. A tabela do Simples Nacional das empresas comerciais contempla 20 faixas de tributação. Ou seja, não é nada simples. Essas exemplificações constam na sagrada legislação do Simples Nacional (Lei Complementar 123/2006).

Sabemos nós que a expansão dos produtos alcançados pela substituição tributária do ICMS vem acontecendo num ritmo alucinante, indicando assim que brevemente toda cobrança será antecipada. A mistureba de produtos que é e que não é ST gera uma confusão sem fim nas empresas. É confuso tanto para a empresa administrar como é confuso também para o ente fazendário fiscalizar. Ou seja, nada no Brasil é fácil. E o governo está aí, cumprindo sua missão de infernizar a vida daqueles que trabalham de sol a sol.

Pois bem. A legislação da substituição tributária do ICMS atropelou a Lei Complementar 123. Os entes fazendários estaduais tributam o pequeno, o micro, o nano, da mesma forma que tributa o maior contribuinte. Desse modo, quem deveria pagar 1,25% de ICMS sobre seu faturamento está pagando 17%. E isso não é o pior de tudo. O pior mesmo é ainda por cima pagar em dobro. Quanto menor a empresa, mais propensa está ao pagamento dobrado de ICMS. Esse fato acontece porque o ICMS dos produtos ST é pago antecipadamente, não havendo assim taxação posterior (na venda do produto). É muito comum a aplicação da alíquota unificada do Simples sobre o total do faturamento mensal, o que leva a empresa a pagar novamente o ICMS dos produtos ST que estão misturados aos outros produtos.

O problema é que o ato de separar o joio do trigo exige investimentos substanciais em caros sistemas de informática, além da adoção de burocráticos procedimentos gerenciais. Também, é preciso contratar profissionais especializados para administrar as situações tributárias específicas de cada produto movimentado. Dessa forma, é impossível para uma pequena empresa suportar vultosos custos administrativos. As grandes, não conseguem cumprir a ultra prolixa complexidade legal. Quanto mais, as pequenas.

Não à toa, é muito comum se discutir os altos índices de mortalidade entre os pequenos empreendimentos. Há estudos que apontam o Brasil como o país onde mais nascem empresas. E também, onde mais empresas morrem. Muita gente que fecha as portas, simplesmente abandona tudo sem comunicar o fato aos órgãos especializados. Por isso, os índices verdadeiros são muito maiores do que os oficiais, que são baseados em dados da Receita Federal e de outros estudos técnicos. Tais estudos mencionam fatores relacionados à falta de preparo administrativo dos novos empreendedores como o principal agente causador das falências empresariais. Na verdade, o real agente mortificante é o peso esmagador dos tributos. Todo mundo sabe disso.


terça-feira, 8 de outubro de 2013

CERCO FISCAL



















Reginaldo de Oliveira

Publicado no Jornal do Commercio dia 08/10/2013 - A141

Desde o dia 23 do mês passado a Secretaria de Fazenda da Bahia passou a utilizar uma ferramenta que permite o rastreamento automático de cargas e documentos fiscais eletrônicos de veículos de carga através de um aparelho de radiofrequência. Trata-se do Sistema de Identificação, Rastreamento e Autenticação de Mercadorias (Brasil ID), que entrou em funcionamento, em formato piloto, no posto fiscal Benito Gama, em Vitória da Conquista, onde circulam cerca de 1500 caminhões por dia. O projeto Brasil ID é uma arrojada e estratégica iniciativa que envolve um conjunto de ações e parcerias entre entidades públicas e privadas, cujos objetivos passam pela redução do custo do transporte, inibição de roubo de carga, garantia de procedência e combate ao contrabando de mercadorias. A expectativa é que além de conferir agilidade aos desembaraços de notas fiscais nos postos de fronteira, o sistema permitirá um controle muito mais preciso e amplificado das administrações tributárias. A próxima fase do projeto, prevista para o próximo mês, é a sua integração ao transporte aéreo. O estado do Amazonas, em conjunto com outros 12 estados, está envolvido na implantação desse projeto, sendo que, até o momento, ainda não de forma tão avançada quanto os estados da Bahia e do Ceará.

Segundo o sr. Pedro Júnior, auditor fiscal da SEFAZ/CE, o governo cearense já investiu R$ 49 milhões somente na aquisição de equipamentos que radiografam as cargas dos caminhões. Isso, fora outros muitos milhões aplicados na reforma e construção de postos fiscais, capacitação de servidores e incremento da sua estrutura de tecnologia da informação. A administração tributária do Ceará vem apostando todas as suas fichas no aparelhamento do seu sistema de inteligência fiscal, onde o posto fiscal de Tianguá está servindo de laboratório para a aplicação de diversos projetos, que incluiu, primeiramente, um leiaute que só permite a saída do caminhão após o processamento eletrônico da carga. Outras ações estão sendo operacionalizadas, como instalação de circuito fechado de TV, sistema Brasil ID, integração dos dados processados com diversas outras entidades (Polícia Rodoviária, Polícia Federal, Ibama, Receita Federal etc.), balança dinâmica, inteligência do processamento interno integrado com o ambiente nacional e o mais interessante, que é o Raio X da carga. O scaneamento por Raio X tem detectado muitas operações fraudulentas, visto que a visualização do conteúdo é comparada com a descrição da nota fiscal. A qualidade das imagens é impressionante, o que impede qualquer tipo de camuflagem, visto que tudo é detectado nos mínimos detalhes. Os números da movimentação do posto de Tianguá mostram que o esforço de modernização está valendo a pena. No comparativo dos anos 2011/2012 houve um aumento de 37,49% no credenciamento, incremento de 25,64% dos autos de infração e crescimento da arrecadação na ordem de 29,64%. Esses dados estão incitando os outros estados a também seguir pelo mesmo caminho que o fisco cearense decidiu trilhar.

Quem vive assombrado com o projeto SPED vai ficar paranoico ao saber que o Sistema Público de Escrituração Digital é apenas uma importante peça da colossal estrutura de controle fiscal que vem sendo aprimorada pelos entes fazendários das diversas esferas governamentais. Dinheiro e tecnologia existem em abundância. O grande empecilho é o fator humano; é a gestão estratégica da coisa. Por tais motivos, vem se desenvolvendo dentro do casulo antes meramente burocrático uma postura profissional semelhante à observada nas empresas privadas. E a razão de tanto empenho é o oceano de dinheiro represado pela sonegação fiscal. O fisco já consegue ter noção do mundo de dinheiro que pode ingressar nos cofres públicos. Por isso, não poupará esforços para botar a mão nesse dinheiro. Daí, a necessidade de apostar nas equipes de alto desempenho para a viabilização de projetos de elevado potencial estratégico.

As consequências desse cerco fiscal podem revoltar o sonegador contumaz que insiste em acreditar que o país só está de pé devido ao fato de ainda se conseguir sonegar alguma coisa. Ou então enfurecer os convictos de que as empresas quebrarão no momento em que o governo cobrar plenamente todos os tributos previstos em lei. De certo, o que precisa mesmo acontecer é uma reação organizada e efetiva do empresariado, não tanto contra o fisco, mas contra a gestão temerária dos entes públicos. É impressionante o quão livre e aberto é o caminho para a prática de todo tipo possível e imaginável de desmando com o dinheiro público. Da mesma forma, é igualmente impressionante a inércia do poder econômico que assiste a tudo sem mover uma palha. Vamos torcer para que o peso das ações fiscais possa, enfim, quebrar o gelo. 



terça-feira, 1 de outubro de 2013

É PRECISO IR ALÉM DO DISCURSO


















Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 01/10/2013 - A140

O tempestuoso Odorico Paraguaçu, personagem caricato e realista criado pelo iluminado Dias Gomes, é a representação fidedigna do político brasileiro. Através do filme O Bem Amado é possível enxergar os bastidores rocambolescos da administração pública. O aspecto mais curioso do filme está na forma habilidosa que prefeito esgrime seu vocabulário enrolativo, o que lhe permite contornar situações complicadas que ele mesmo cria – tudo é resolvido no gogó.

Há um exercício de observação superinteressante de se fazer, que é simplesmente assistir aos discursos dos nossos honoráveis homens públicos. Impressiona constatar inacreditáveis verossimilhanças em todo o desenrolar das suas peças de oratória; também, há paralelos nos gestos, nas expressões e até no figurino. Parece que todo mundo veio da mesma escola de arte embromática. Assim, o tempo passa, novas gerações chegam e tudo continua como dantes. Ou seja, ninguém apresenta algo inédito e revolucionário como, por exemplo, um discurso honesto.

Pois é, a nossa amada e idolatrada presidenta, egressa da mesma escola do prefeito Odorico, inutilmente, tentou convencer um grupo de homens de negócios a investir altíssimas quantias de dinheiro em projetos de grande envergadura aqui no Brasil. Esse fato ocorreu na semana passada em Nova York, num evento promovido pelo banco de investimentos Goldman Sachs. Na ocasião, ficou evidente que o maior receio dos investidores está na insegurança jurídica encravada no instável ambiente de negócios brasileiro.

De acordo com os cânones preestabelecidos, entende-se que a segurança jurídica deve existir para que a justiça, finalidade maior do Direito, se concretize. Ou seja, o Direito deve garantir que as relações sociais sejam pautadas na certeza das consequências dos atos praticados.

Como foi amplamente noticiado pela imprensa, a presidente Dilma assegurou para os investidores que não há risco de insegurança jurídica no Brasil. De acordo com o Diário Catarinense, as garantias verbais não foram suficientes para convencer os investidores, os quais saíram do evento com as mesmas incertezas que carregavam ao entrar. Pois é. A lábia odoriqueira não colou. Teria sido aconselhável que algum assessor lembrasse a presidente que ela não estava na cidade de Sucupira, e que para convencer uma plateia esclarecida, talvez fosse recomendado adotar um tom mais sério ao discurso.

Como é possível alguém afirmar que não existe insegurança jurídica no Brasil, se esse é o nosso maior e mais ostensivo problema? É tão imenso que, como a grande muralha da China, pode ser avistado do espaço. E a prova mais contundente dessa ostensividade está sendo diariamente jogada na nossa cara, que é o escandaloso processo do mensalão, o qual foi destinado à eternidade pelos embargos infringentes. O que dizer então dos super salários do Senado? O que dizer do campo minado que se tornou a legislação tributária? O que dizer da estratosférica arrecadação de impostos que ninguém sabe pra onde vai o dinheiro? O que dizer da sensação de impunidade que sufoca e humilha o povo? Cadê a concretização da justiça?

Até a publicação britânica, “The Economist”, fez, na semana passada, severas críticas ao governo Dilma, além de ter afirmado que a corrupção brasileira é um câncer sem controle. Por essas e outras podemos concluir que a imagem do país lá fora é enegrecida por conta de tantos desmandos promovidos pelo poder público. Dessa forma, o governo bem que poderia aproveitar a experiência constrangedora do momento para rever suas políticas e suas ações administrativas. Não adianta tapar o sol com a peneira; é preciso ir além do discurso. O povo daqui e de fora precisa avistar algum sinal positivo de que o governo está realmente disposto a adotar uma postura minimamente séria naquilo que faz.