quarta-feira, 1 de julho de 2015

IMPÉRIO DA NEGLIGÊNCIA

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Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 30/06/2015 - A216

No dia 8 de outubro de 2013 o prefeito carioca Eduardo Paes comunicou à impressa o sumiço de seis vigas de aço, as quais foram furtadas de um terreno pertencente ao Governo do Estado do Rio de Janeiro – cada uma delas com 40 metros de comprimento e 20 toneladas de peso. Movimentar objetos tão grandiosos exige uma complexa e demorada logística. Mas, por incrível que pareça ninguém viu nada. Ninguém viu as vigas sendo içadas por enormes guindastes, ninguém viu um trambolho monstruoso sendo transportado por caminhões possantes ao longo de várias ruas e avenidas. É como se um elefante visitasse o shopping sem ser notado. E até onde se tem notícia, as vigas não foram encontradas.

Esse caso das vigas é emblemático por descortinar uma espécie de universo paralelo, onde o crime se desenvolve num ritmo alucinante e num volume incomensurável. E tudo de modo sorrateiro e imperceptível. O Estado de Direito não consegue penetrar nessa dimensão alternativa, como se ela estivesse posicionada no extremo oposto da nossa galáxia. Por tal motivo ninguém é investigado nem punido. Seria um fenômeno explicado, talvez, pelos filósofos metafísicos ou pelos cientistas dedicados ao estudo da matemática quântica, em face da patente e ostensiva incapacidade das autoridades competentes de enxergar os delitos praticados por criminosos de grosso calibre. O cérebro dos agentes da lei está programado para detectar arruaceiros e ladrões de galinha (têje preso!). O juiz Sergio Moro quebrou esse paradigma ao prender políticos e grandes empresários; algo absolutamente inaceitável para alguns especialistas do Direito.

A operação Lava Jato comprovou a existência de um Estado dentro do Estado (enclave). O Brasil possui um Estado Criminoso dentro do Estado de Direito. É como se houvesse uma célula cancerígena para cada célula sadia (dois corpos ocupando o mesmo espaço). Assustadoramente, as investigações vêm desbaratando um colossal e ultra capilarizado esquema criminoso no universo do Poder Público. Os números monetários são descomunais e a quantidade de figurões citados nas investigações surpreendeu até o cidadão mais pessimista: uma patifaria elevada à enésima potência. Para completar o pacote de descalabro, os desdobramentos das investigações vêm colocando à prova o cinismo e a cara de pau daqueles que estão sempre amenizando os odores fétidos de cada um dos toletes atirados no ventilador. É um festival de discursos demagógicos e constrangedores – até a mandioca já entrou nos anais da nossa história política contemporânea. Essa patética situação só evidencia o grau de desespero para tentar distrair a população com fatos pitorescos.

Voltando ao resultado das investigações da Lava Jato, fica no ar uma pergunta: Como é que tanto dinheiro criminoso movimentado por tanta gente safada não foi detectado pelas autoridades competentes? Meses atrás, o comediante americano John Oliver, do programa televisivo Last Week Tonight, teceu severas críticas aos fatos levantados pela operação Lava Jato. Aos olhos dos ianques a história toda é pra lá de absurda; coisa de Coréia do Norte ou Estado Islâmico. Para eles, corrupção é colocar US$ 5.000,00 num envelope e entregar a alguém. Aqui no Brasil a cifra alcança a casa dos bilhões de reais. E tem mais. Toda essa dinheirama transita de mão em mão no mais completo anonimato. Ou seja, nenhum diretor de estatal nota o desfalque, o COAF não associa tais movimentações com lavagem de dinheiro e a Receita Federal não estranha a súbita e estratosférica elevação patrimonial de algumas pessoas. Outros fatos estapafúrdios complementam esse cenário escalafobético, tais quais: Jatinhos particulares viajam pra cima e pra baixo com pesados fardos de dinheiro vivo, valores dos contratos das obras governamentais são reajustados trocentas vezes, financiamento de campanhas políticas é corrupção legalizada, negociatas acontecem à luz do dia com cuecas tufadas de dólares etc., etc.

Pois é. A bandalheira corre solta e absolutamente despreocupada, como se tivesse plena certeza da inércia das autoridades. Dessa forma, há de se questionar: Afinal de contas, pra que serve a instituição policial? Pra que serve todo o caríssimo sistema judiciário? Qual é o papel dos Tribunais de Contas? O que faz o pessoal da Controladoria Geral da União? E as agências de controle governamental? Por que ninguém tomou uma atitude quando a manada de elefantes passeava pela praça de alimentação na hora do almoço?  

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