terça-feira, 21 de julho de 2015

UMA PEQUENA REVOLUÇÃO

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Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 21/07/2015 - A219

A figura do deus salvador é um arquétipo assentado nas camadas mais profundas da nossa alma. Somos doutrinados de forma a entregar nosso destino nas mãos de um tutor divinizado, ao qual devemos submissão absoluta. Talvez por esse motivo estejamos sempre em busca de um herói de carne e osso. É nessa fenda psicológica que os políticos entram e fazem a festa. Depositamos nossa confiança naquelas figuras públicas mais convincentes e os deixamos à vontade para cumprir sua nobre missão de trabalhar em prol do bem comum. Certa vez um sábio disse que o mal não mora no mundo; vive exclusivamente no homem. E é justamente essa natureza perversa entranhada até os ossos do ser humano que joga por terra o sublime ideário de mentes puras e abnegadas, prontas para servir ao povo. Seres iluminados habitam o fantástico e fictício universo dos poetas e dos filósofos sonhadores. Na vida real, o ser humano deve ser tratado como realmente é. Ou seja, inclinado a toda sorte de tentações. Essa condição realística nos obriga a sempre confiar desconfiando. Por tais motivos, de forma alguma, nunca, em nenhum momento, devemos entregar nosso destino nas mãos de quem quer que seja.

Se os políticos roubam é porque o povo avaliza tal conduta criminosa. Se a população não tolerasse a corrupção os agentes públicos se manteriam na linha (causa e consequência). Todo esse dilúvio de roubalheira desbaratado pela Operação Lava Jato é consequência do distanciamento entre o público e o privado; entre os funcionários públicos e o restante da sociedade. Isto é, o povo entregou as rédeas do país nas mãos do poder público sem constituir nenhuma espécie de controle efetivo ou acompanhamento das suas ações, deixando-o totalmente livre para voar. Aí, deu no que deu (a ocasião faz o ladrão).

Na quarta-feira da semana passada aconteceu um fato extraordinário. A população da cidade paranaense de Santo Antônio da Platina fechou o comércio mais cedo e todo mundo se dirigiu à Câmara Municipal para acompanhar a votação do aumento de salário do prefeito e dos vereadores. No dia anterior, a empresária Adriana de Oliveira, havia feito uma visita ao parlamento municipal para protestar contra o tal aumento que seria colocado em votação, onde, inclusive, travou uma acalorada discussão com o Vereador José Mineiro. A tal briga foi filmada e divulgada na internet, que rapidamente se espalhou por toda a cidade. A iniciativa da empresária levou a população a se mobilizar contra mais uma das barbaridades praticadas pelo poder público. No dia da votação, com o plenário lotado até o talo de eleitores indignados, os vereadores acharam por bem reduzir em vez de aumentar as remunerações. Podemos dizer que isso é uma pequena revolução. O povo tomou uma atitude e foi pra cima com tudo. O povo tomou as rédeas da situação, não deixando que a politicada torrasse o dinheiro dos impostos com dispêndios exagerados.

Um fato ainda mais emblemático aconteceu no dia 18 de janeiro de 1995 na cidade maranhense de Imperatriz, onde o povo cansado dos abusos da administração municipal tomou de assalto a sede da prefeitura e ficou lá por uma semana até o governo estadual nomear um interventor. Esse maravilhoso evento é conhecido como “Revolução de Janeiro” ou “Revolta Cidadã”, onde a população não se apequenou diante dos abusos do poder público, mostrando assim quem de fato mandava na cidade.

Esses dois eventos mostram muito claramente que o poder emana do povo e, portanto, o povo é quem deve ditar as regras e ao mesmo tempo fazer uma marcação cerrada em cada passo de cada um dos funcionários públicos para que estes saibam exatamente quem é o patrão. O povo pode e deve demitir o prefeito, o vereador, o deputado etc. O povo pode e deve enquadrar a secretária do prefeito, o fiscal da prefeitura, o médico do posto de saúde, o delegado, o juiz etc. Parece um tanto estranho colocar as coisas dessa forma, mas nos Estados Unidos esse conceito funciona muito bem e tem até um nome: Accountability. O funcionário público americano é extremamente cauteloso na sua conduta porque sabe das consequências do mau comportamento. Todo funcionário público americano tem plena consciência de que seu patrão é o cidadão pagador de impostos. Nós, brasileiros, ainda tratamos o prefeito e o governador como se fossem divindades inacessíveis. E são. Um cidadão comum, por exemplo, nunca, jamais, conseguirá falar com o governador. Nunca, mesmo. Ele será barrado. E se insistir será espancado pela polícia antes de ser jogado no camburão. Quem sabe, daqui a uns duzentos anos nós alcançaremos o nível de consciência cidadã dos americanos. 


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