terça-feira, 29 de setembro de 2015

RELAÇÕES HONESTAS (fisco/contribuinte)

essa, é a minha cara de descontentamento com a SEFAZ

Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 29/09/2015 - A227

A semana passada foi recheada de eventos alusivos ao Dia do Contador. Na terça-feira uma instituição de ensino superior convidou a SEFAZ para proferir uma palestra sobre a Nota Fiscal Amazonense, que, apesar de elucidativa e desmistificadora, provocou um ostensivo clima de rejeição e desconfiança em boa parte da plateia. É possível que a razão desse comportamento seja um reflexo da agressiva campanha contra o excesso de taxações que circula na internet. Vários mitos e interpretações equivocadas vêm perturbando essa iniciativa da SEFAZ AM. Não é pra menos. O povo está escaldado das recorrentes armadilhas tributárias. É imposto provisório que fica permanente; é nova taxação com alíquota baixa que logo em seguida mais do que dobra; é normatização que diz uma coisa e na prática é outra; é majoração e rebuliço pra tudo quanto é lado. Tanta estripulia fez o Fisco que hoje está totalmente queimado no quesito confiabilidade. Daí, o motivo de tanta rejeição ao engenhoso projeto Nota Fiscal Amazonense.

A SEFAZ tenta, de todas as formas, convencer a população de que não compartilha informações com a Receita Federal. Ou seja, o consumidor que incluir seu CPF na nota fiscal poderá ficar tranquilo de que a SEFAZ não irá dedurar ninguém para o Leão do Imposto de Renda. O problema é que as relações entre contribuinte e agente arrecadador não são nada honestas.

Existe um descompasso violento entre a honestidade requerida do contribuinte e a honestidade praticada pelo agente arrecadador. E também entre as prerrogativas e poderes dessas duas partes. Se o Contribuinte não paga ele é instantaneamente punido com o bloqueio das suas operações. Isto é, a SEFAZ corta o oxigênio do Contribuinte, que imediatamente é obrigado a dar seus pulos para não morrer sufocado. E muitas vezes, esse Contribuinte é obrigado a pagar o que não deve (muitas e muitas e muitas e muitas vezes). As cobranças indevidas do fisco estadual são uma prática recorrente e sistematizada. Por exemplo, um grande atacadista foi notificado nos três primeiros meses de 2013 a pagar 21 milhões de reais sobre compras de mercadorias. Desse montante, somente R$5 mi era devido. Não fosse o batalhão de funcionários conferindo meio mundo de notas fiscais, a empresa seria sangrada em 16 milhões de reais, sendo a parte mais pavorosa dessa história, a dificuldade gigantesca que a SEFAZ costuma colocar para efetivar o ressarcimento. Ou seja, ela faz de tudo para não devolver aquilo que não lhe pertence.

A agilidade da cobrança é espantosa, mas, para ressarcir é um Deus-nos-acuda. Os processos de ressarcimento de impostos pagos indevidamente costumam se arrastar por anos a fio. Por exemplo, uma empresa que possui uma única e exclusiva atividade (isenta de ICMS) foi obrigada a pagar mais de 400 mil reais de ICMS, sob ameaça de fechar as portas. Diante da pressão os valores foram pagos. Posteriormente, o Contribuinte deu entrada num pedido de ressarcimento que já tramitou por vários e vários setores, sendo que depois de três anos a SEFAZ resolveu recomeçar a análise do zero. Isso, num processo que de tanto documento solicitado, já chegou a mais de 300 páginas. E como está de volta à estaca zero, será preciso esperar mais três anos.

Outro processo (bem simples), resultado da cobrança duplicada de ICMS sobre aquisição de dois caminhões, teve o trâmite ágil e eficiente, sendo publicado no Diário Oficial Eletrônico, o parecer do julgador favorável ao Contribuinte. Tal foi a surpresa do Contribuinte ao saber que o processo voltou a ser analisado, sem nenhum horizonte de solução.

Pois é. Como é que um órgão que age dessa forma pode exigir honestidade e cooperação dos empresários e dos consumidores? Como é que a SEFAZ quer que a população acredite na Nota Fiscal Amazonense? Por que a SEFAZ pisoteia tanto o Contribuinte? Que estranho prazer tem esse pessoal de espezinhar aquele que se mata de trabalhar para recolher ICMS? Quando, um dia, encontraremos respeito nos processos de ressarcimento?

Por conta de tantas malvadezas e perversidades é que a plateia de alunos de contabilidade não reagiu bem à palestra sobre a Nota Fiscal Amazonense, apesar de ter sido muito bem apresentada. Tal constatação é um claro sinal de que precisamos urgentemente cultivar relações honestas com o Fisco. Tirania de lá e esperteza de cá só produz desconfiança e demagogia, além de contaminar o ambiente de negócios, fomentar a corrupção e destruir o país. O produto dessa alquimia corrosiva está quebrando as pernas do Brasil. O pior de tudo é que, em vez de reagir, preferimos ficar no trono de um apartamento com a boca escancarada cheia de dentes esperando a morte chegar.



terça-feira, 22 de setembro de 2015

ARMADILHAS DO bloco K

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Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 22/09/2015 - A226

Uma consulta encaminhada a SEFAZ AM sobre a obrigatoriedade de escrituração do Bloco K teve como resposta a sugestão de leitura do Título II do Decreto 7.212/2010. A partir de 2016 as empresas utilizarão o Bloco K para prestar informações relacionadas à produção, bem como movimentação do estoque de insumos e de produtos. O parágrafo 7º do Ajuste Sinief 02/2009 diz que a obrigatoriedade será para estabelecimentos industriais ou a eles equiparados pela legislação federal e para estabelecimentos atacadistas, podendo, a CRITÉRIO DO FISCO, ser exigida de estabelecimento de contribuintes de outros setores. Os questionamentos contidos na dita consulta são os seguintes: Quem são os estabelecimentos equiparados à indústria? Qual o conceito de atacadista? Existem alguns outros setores para o qual será exigido o Bloco K pelo Fisco Amazonense? A SEFAZ não disse quais serão os outros setores alcançados pela exigência do Bloco K, criando espaço para incertezas e temeridades.

Vamos então à leitura do Título II do Decreto 7.212/2010, que vai do artigo 9º ao artigo 14º. Nesses seis artigos são mencionados 21 dispositivos legais. A Lei 4.502/1964 é mencionada 7 vezes. O Decreto-Lei 34/1966 (5 vezes); A Lei 9.532/1997 (1 vez); Decreto-Lei 1.593/1977 (1 vez); Lei 9.493/1997 (1 vez); Medida Provisória 2.158-35/2001 (3 vezes); Lei 11.281/2006 (4 vezes); Lei 9.779/1999 (2 vezes); Lei 10.833/2003 (6 vezes); Lei 11.727/2008 (5 vezes); Lei 10.637/2002 (1 vez); Lei 11.452/2007 (1 vez); Lei 11.933/2009 (4 vezes); Lei 12.402/2011 (2 vezes); Decreto 7.990/2013 (2 vezes); Lei 7.798/1989 (4 vezes); Lei 6.404/1976 (1 vez); Lei 10.406/2002 (1 vez); Lei 11.941/2009 (1 vez); Decreto-Lei 1.950/1982 (1 vez); Lei 5.764/1971 (1 vez).

Outra observação relevante. Só a Lei 10.406/2002 possui 97.923 palavras. A Lei 6.404/1976 (54.491 palavras); Lei 4.502/1964 (20.724 palavras); Lei 11.941/2009 (19.042 palavras); Decreto-Lei 34/1966 (7.188 palavras); Lei 9.532/1997 (15.066 palavras); Decreto-Lei 1.593/1977 (7.776 palavras); Lei 9.493/1997 (1.871 palavras); Medida Provisória 2.158-35/2001 (14.691 palavras); Lei 11.281/2006 (1.444 palavras); Lei 9.779/1999 (2.877 palavras); Lei 10.833/2003 (36.275 palavras); Lei 11.727/2008 (11.434 palavras); Lei 10.637/2002 (16.016 palavras); Lei 11.452/2007 (2.015 palavras); Lei 11.933/2009 (1.675 palavras); Lei 12.402/2011 (1.603 palavras); Decreto 7.990/2013 (2.282 palavras); Lei 7.798/1989 (2.046 palavras); Decreto-Lei 1.950/1982 (1.553 palavras); Lei 5.764/1971 (9.985 palavras). TOTAL: 327.977 palavras. Somente depois de tirar um tempinho para uma leitura árida e enigmática será mais ou menos possível identificar os estabelecimentos equiparados à indústria. Lembrando que cada um desses 21 dispositivos legais possui diversas conexões com outras legislações, num entremeado de regras que se expandem ao infinito. Essa é uma proeza do nosso sistema tributário. Alguém que se atrever a memorizar todos os desdobramentos das conexões de um dispositivo legal vai passar a vida inteira navegando no tempestuoso oceano de regras, sendo que provavelmente vai acabar os dias num hospício. Talvez seja essa a intenção do legislador.

Já perdemos um tempo gigantesco com somente um detalhezinho das regras do Bloco K. Agora, imagine se formos destrinchar toda a regulamentação normativa dessa nova obrigatoriedade. Certamente, seriam necessários milhares de especialistas trabalhando anos a fio para esgotar todas as infinitas conexões legais de modo a esclarecer toda e qualquer pergunta sobre o assunto. E ainda não seria suficiente, porque existe regra que não está escrita. É aquela dita cuja que trata do “A CRITÉRIO DO FISCO”. Ainda temos as interpretações, os juízos, os entendimentos etc. Resumindo, é IMPOSSÍVEL encontrar objetividade na legislação tributária brasileira. Isso acontece para que as coisas fiquem reféns do momento e do humor do Fiscal (e também da propina). Esse tipo de comportamento preserva resquícios do Absolutismo de outrora. É impressionante como toda regra tributária é cheia de vácuos e condicionantes, e margens de manobra. Lembra até os leiautes dos gabinetes das nossas autoridades, os quais são cheios de compartimentos secretos e saídas de emergência.

Por isso é que um estudo feito pelo Banco Mundial com 185 países demonstrou que no Brasil se consome anualmente 2.600 horas para administrar um tributo sobre renda, acrescentado de um sobre consumo e de mais outro trabalhista (no Reino Unido são consumidas 110 horas). Ou seja, nós, brasileiros, perdemos um tempo colossal com uma burocracia absolutamente desnecessária. Uma burocracia que hoje sabemos servir para esconder intenções criminosas. A operação que desmantelou a máfia do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Zelotes), mais a Operação Lava-Jato, estão expondo as entranhas apodrecidas da administração pública brasileira. Hoje, está mais do que evidente o papel da burocracia exacerbada na camuflagem de operações criminosas. Portanto, fica a dúvida sobre o que se esconde por trás de toda essa confusão burocrática envolvendo o Bloco K. O que será que as administrações fazendárias pretendem com uma burocracia tão enigmática? Por que 327.977 palavras só para definir equiparação à indústria? Por que não conferir racionalidade às regras dessa nova obrigação acessória? Por que a lei não é clara?



REBELIÃO CONTRA OS IMPOSTOS

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Doutor Imposto
Publicado no Jornal Maskate dia 17/09/2015 - A012

Em muitas culturas antigas o imposto era considerado uma penalidade de guerra. Isto é, pagava imposto aquele que caía diante do oponente mais forte. Os povos derrotados eram saqueados e escravizados pela fraqueza de homens não suficientemente competentes para ganhar a guerra. Resumindo, quanto mais fraca é a pessoa, mais imposto ela paga. E quanto mais rico, mais recursos são disponibilizados para escapar da tributação. O rico compra deputados, vereadores, governadores etc. As leis tributárias são, na realidade, escrita pelos ricos e depois avalizadas pelo legislativo. É tudo um grande teatro. Prova cabal da concretude desse sistema está no foco da nossa tributação, que é sempre o consumo, que é sempre o sistema regressivo de tributação. Nossa tributação sobre consumo é uma das maiores do mundo, enquanto a nossa tributação sobre os grandes rendimentos é uma das mais baixas do planeta. Resumindo, quem carrega o país nas costas é justamente o povão que ganha salário mínimo. Lá, no topo da pirâmide, chove isenções e benefícios fiscais de todo tipo. Prova disso, é a isenção sobre dividendos.

Acontece que a sanha arrecadatória começou a encontrar forte resistência junto ao cidadão cansado dos abusos do governo. E quando o saco estoura, as consequências podem ser devastadoras. Pois é. A paciência do brasileiro está por um fio.

É bom lembrar que a Revolução Francesa foi deflagrada porque o povo não suportava mais o peso excessivo dos impostos. O rei Luiz XIV costumava dizer o seguinte: “Quero que o clero reze, que o nobre morra pela pátria e que o povo pague”. Tanta presepada fez o governante que perdeu a cabeça. Literalmente. Na realidade, várias pessoas foram guilhotinadas. Nessa mesma época os Estados Unidos da América se tornaram independentes da Inglaterra após uma guerra motivada, principalmente, pela escorchante pressão tributária. O cidadão americano não aguentou tanto imposto, chegando assim às vias de fato. Lá, nos EUA, a tributação sobre consumo é baixíssima se comparada ao Brasil, além de inigualavelmente desburocratizada. E lá, nos EUA, quanto mais rica é a pessoa, mais imposto ela paga – ao contrário do que acontece no Brasil.

Nossos governantes são muito mal acostumados. Eles ainda carregam o ranço confiscatório do século XVIII, quando a polícia da época fazia um arrastão nas casas das famílias para confiscar riquezas toda vez que as metas de contribuição tributária não fossem atingidas. Era a famosa Derrama. Nosso governo atual continua com a mesma orientação. Nesse momento o ministro Joaquim Levy quer invadir as nossas casas e roubar o nosso já todo mordido dinheirinho de tantos impostos que já pagamos. A reação do povo, finalmente, começa a acontecer. Parece que aquela passividade bovina dos nossos compatriotas começou a evaporar. O Facebook está entupido de reações agressivas contra os abusos tributários. As entidades empresariais, finalmente, começam a ter um pouquiiiiinho de coragem para peitar o governo. O Congresso já sentiu a agitação acalorada de uma população cansada da incompetência, da corrupção, da impunidade etc.


O MAIS HEDIONDO DOS CRIMES

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Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 15/09/2015 - A225

A imagem da criança síria encontrada na praia sem vida comoveu o mundo pela pesada carga de simbolismo que encerra. Aquela fotografia sintetiza as dores de várias nações devastadas por guerras e conflitos diversos, que agora buscam desesperadamente uma tábua de salvação. Várias outras desventuras ocorrem a todo o momento sem nos darmos conta das tragédias humanas que nos cercam. Elas acontecem longe das câmeras e distante do interesse da mídia e do mundo – na maioria das vezes, disfarçadas de eventos naturais que no final das contas são convertidos em dados estatísticos sem muita importância. Milhares (ou milhões) de crianças brasileiras passam fome por falta da merenda escolar desviada pelo executivo municipal. Essas vidas perdidas são jogadas na vala da exclusão social. Milhares (ou milhões) de doentes largados em macas improvisadas pelos corredores de hospitais morrem por falta de atendimento médico. Milhares (ou milhões) de pessoas perecem por falta de exames clínicos que demoram muito para acontecer. Milhares (ou milhões) de homens, mulheres e crianças são trucidados pela violência que sitiou o país inteiro frente a uma força policial impotente e um sistema judicial inoperante. E a raiz de todos esses males é uma só: a CORRUPÇÃO.

Milhões morrem, milhões sofrem, milhões têm suas vidas destruídas. Mas, e se tantas desgraças acontecessem de outra forma?

O prefeito Fulanilson resolveu envenenar o sistema de distribuição de água, matando grande parte da população e deixando muitas pessoas gravemente debilitadas. As televisões do mundo inteiro acompanham esse trágico acontecimento. A Cruz Vermelha Internacional se prontificou a enviar equipes médicas para cuidar dos sobreviventes. O país inteiro se mobiliza através de ajuda humanitária e campanhas de arrecadação de alimentos, de remédios etc. Um enorme contingente de policiais se organizou numa implacável caçada ao criminoso que cometeu tamanha atrocidade. O meliante já está preso e sem direito a qualquer tipo de regalia ou redução de pena. A expectativa é de cumprimento integral da sentença, que sairá em tempo recorde. O fato mais curioso dessa história escabrosa é que milhares de outros prefeitos causam um estrago até maior sem sofrer um centésimo do castigo do senhor Fulanilson. Pelo contrário, ninguém está preso e quase todos foram reeleitos pela mesma população que teve parentes mortos nos corredores dos hospitais ou filhos desnutridos e analfabetos por desvio de verbas da Educação.

O empreiteiro Beltranildo, em conjunto com o deputado Sicranóvisky, despejaram uma chuva de gasolina sobre a favela próxima ao condomínio de luxo em que moravam. E depois atearam fogo. O resultado foi um estrondoso incêndio de proporções bíblicas. Era gente correndo pra todo lado, tentando salvar a própria vida e a da família. O espetáculo dantesco foi acompanhado ao vivo por telespectadores chocados com o absurdo da coisa. Diante do quadro apocalíptico e chocante a população se mobilizou para exigir punição exemplar aos responsáveis por esse crime hediondo, não tolerando qualquer tipo de manobra jurídica para livrá-los da cadeia. Essa mesma enfurecida população não lembra que outros empreiteiros, em conjunto com tantos outros deputados, promovem estragos terrivelmente maiores em outras regiões do país, com muitas mortes e destruição de empregos e de famílias vítimas dos efeitos da corrupção.

A corrupção destrói o emprego dos adultos, aniquila a inocência das crianças, destroça o futuro dos jovens, arruína a esperança dos mais velhos e mata os que já estão doentes. A corrupção é o mais hediondo dos crimes. Mesmo assim, perdura no Brasil toda uma estrutura jurídica especialmente dedicada a proteger o corrupto com penas tão leves quanto à de alguém que atropelou o cachorro do vizinho. Um Top Super Corrupto Bandido Platinum que prejudica diretamente a economia do país inteiro, que destrói os empregos de toda a nação é tratado de Vossa Excelência. Esse mega criminoso cumpre prisão domiciliar, usufruindo assim do luxo obtido com as ações criminosas da corrupção. Seu patrimônio é intocado e sua imagem, menos ainda. Mas um pai de família induzido ao tráfico de drogas para comprar comida é esquecido por décadas na prisão devido a falhas do sistema prisional. E tudo sob a anuência de juízes, promotores, políticos e demais autoridades. Tudo isso é bem a cara do Brasil.

É bom não esquecer que a politicada é um espelho que reflete o caráter da população. Somos eles e eles “somos nozes”. É inútil combater o mau político sem antes fazermos uma reflexão sobre a nossa própria natureza e sobre nossas crenças e valores. O Brasil é ainda um cego procurando a luz.



REAL ou PRESUMIDO?

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Doutor Imposto
Publicado no Jornal Maskate dia 10/09/2015 - A011

Essa dúvida costuma pairar sobre a cabeça de empresários entusiasmados com a possibilidade de pagar menos imposto. É o que se pode chamar de canto da sereia. Isto é, belo e traiçoeiro. Pra começo de conversa, o optante pelo regime de tributação do Lucro Real passa a suportar uma carga de PIS COFINS na ordem de 9,25%, sem direito a crédito sobre as mercadorias oriundas de outros estados da federação. Isso acontece porque esses tributos chegam aqui com alíquota zero. No regime do Lucro Presumido não existe crédito, mas a carga é bem menor (3,6%). Outro detalhe importantíssimo é que a escrituração contábil precisa estar rigorosamente atualizada – coisa não muito comum nas empresas pequenas e médias. Caso isso não seja possível, a empresa do Lucro Real acaba por fim pagando imposto de renda nas mesmas regras do Lucro Presumido, deixando o ajuste dos dois regimes para depois do fim do exercício fiscal. Nesse caso, portanto, aquele propósito inicial de economizar imposto cai por terra. Cai e se espatifa, perdendo totalmente o sentido da equivocada opção.

Outro aspecto de suma importância a se considerar está relacionado com a complexidade das obrigações acessórias e com o rigoroso e minucioso detalhamento das regras de escrituração contábil, o qual exige uma conexão muito estreita das atividades operacionais com os controles contábeis. Essa complexidade se agravou com o advento da Lei 12.973/2014 e da IN 1.515/2014. Tais dispositivos legais burocratizaram por demais a estrutura de escrituração contábil e ainda por cima impuseram uma série de amargas penalidades por qualquer pisada de bola, por menor que seja. A Lei 12.973 já começa listando uma série de multas que pode chegar a cinco milhões de reais. A IN 1515 traz uma infinidade de conexões com outras disposições legais, tentando conciliar os interesses da Receita Federal com as normas contábeis, as quais deixaram de ser reféns do Fisco. Desde que a Lei 11.638/2007 instituiu o conceito da subjetividade responsável no sistema contábil brasileiro, a Receita Federal vem tentando encontrar meios de harmonizar as regras societárias com as regras fiscais, sem sucesso absoluto.

Aqueles empresários inebriados com o canto da sereia fazem a opção pelo Lucro Real sem implantar um rigoroso sistema contábil e sem cumprir com a complexidade burocrática das normatizações técnicas que assustam até mesmo as firmas de auditorias internacionais. Um fato nem sempre alertado aos empresários está relacionado ao pesado custo administrativo de tantos controles exigidos pelo regime do Lucro Real. Dentre 185 países estudados pelo Banco Mundial o Brasil é o pior de todos quando o assunto é burocracia exacerbada. Pra se ter uma ideia do manicômio tributário em que estamos metido, por aqui são gastas 2.600 horas anuais para se fazer uma coisa que no Reino Unido se consome somente 110 horas. Vivemos uma espécie de paroxismo do êxtase extremado do frenesi burocrático. Outro aspecto a ser considerado é que o Lucro Real transforma a empresa num alvo preferencial do Fisco.


sábado, 5 de setembro de 2015

PRA QUE PAGAMOS TANTO IMPOSTO?

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Doutor Imposto
Publicado no Jornal Maskate dia 03/09/2015 - A010

A tradicional fabricante de aviões teco-teco resolveu apostar todas as fichas num audacioso projeto para construir o cargueiro aéreo apelidado de Zap-Cururu. Por meses a fio os melhores engenheiros se debruçaram sobre pilhas e pilhas de esquemas técnicos, protótipos e desenhos mecânicos. A coisa toda até que deslanchou bem, mas lá pelo meio do caminho começaram a pipocar sugestões estrambóticas de modificações variadas que resultaram numa espécie de Frankenstein Voador. Isto é, a estrutura (cheia de adaptações e puxadinhos) pesou fortemente, tanto no orçamento quanto na violação de regras básicas da engenharia aeroespacial. Conclusão: depois de pronto o cargueiro só conseguiu voar totalmente vazio; qualquer carga embarcada impedia seu deslocamento por causa do peso excessivo da aeronave (um gravíssimo erro de projeto).

Sabemos que os impostos têm como objetivo principal financiar a saúde, a educação, a segurança etc. Pagamos toneladas de taxas para termos estradas, energia, justiça etc., etc. Ou seja, para que o dinheiro saído do nosso bolso se transforme em todos esses serviços, faz-se necessária a existência de vários órgãos públicos, cada um com suas respectivas responsabilidades e incumbências. O gigantesco contingente de funcionários públicos administra nosso suado dinheirinho de modo a garantir um atendimento de excelência no posto de saúde ou então a certeza de não sermos assaltados por bandidos armados, ou ainda o conforto do transporte público padrão FIFA etc. Tanto dinheiro abocanhado do nosso bolso tem também a finalidade de proporcionar aos nossos filhos uma formação educacional comparável aos mais avançados sistemas do mundo. Tudo isso é perfeitamente viável, uma vez que nossa carga tributária se aproxima dos países europeus, os quais garantem alto padrão de serviços públicos aos seus cidadãos.

Pois é..!! Somos o avião cargueiro que não suporta carga nenhuma. O nosso super ultra inchado sistema estatal acabou tendo um fim em si mesmo. Pagamos horrores de imposto para não ter nada de volta. Praticamente metade de toda a riqueza produzida no Brasil vai para o governo, que recebe um frango assado e devolve para a população alguns ossos chupados. A máquina estatal, projetada para fornecer saúde, segurança, educação, estradas, só tem dinheiro para o próprio custeio. Isto é, a montanha de dinheiro dos impostos só dá pra pagar o universo infinito de funcionários e outras despesas, como viagens, mordomias, festas, prédios suntuosos etc.

Quando a coisa aperta um pouquinho o governo se apressa em criar mais imposto em vez de procurar olhar para o próprio umbigo (para o descalabro de gastos descontrolados). Por exemplo, a nossa sede do governo federal tem dez vezes mais funcionários do que a Casa Branca. E olha que os EUA são várias vezes mais ricos do que nós. O primeiro ministro inglês vai de metrô para o trabalho. O prefeito de Londres usa uma bicicleta como meio de transporte. Conclusão, somos o Cocô do Cavado do Bandido quando o assunto é gestão responsável dos impostos arrecadados. 


terça-feira, 1 de setembro de 2015

ROUBOLÂNDIA

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Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 01/09/2015 - A224

A história da ensolarada Roubolândia sempre foi marcada por convulsões sociais e políticas. Grande parte dos seus primeiros habitantes era formada por desterrados de outras plagas, devido a comportamentos reprovados pelos próprios pares. Seus primeiros governantes tinham como missão explorar o máximo de recursos naturais e posteriormente enviá-los para fora do país. A cultura da exploração se perpetuou na elite e no poder. O objetivo de todos era sempre ganhar alguma coisa ou tirar vantagem de alguma situação ou de alguém. Era todo mundo querendo enganar todo mundo.

Com o passar do tempo, as coisas se sofisticaram sob a influência europeia dos ternos e das ideias progressivas que concorreram para a formação de uma burguesia refinada. Aquela roubalheira tosca e amadora precisava ser reavaliada e modernizada. Era preciso travestir a pilhagem de políticas públicas. Ou seja, criar toda uma estrutura de Estado voltada unicamente para a fraude e para a corrupção. O caminho escolhido foi o do enrosco burocrático extremado. A coisa tinha que ser confusa e indecifrável, de modo a encobrir gigantescas operações criminosas envolvendo o público com o privado.

Definido então o modelo de cleptocracia acondicionado numa reluzente embalagem democrática, a coisa seguiu o seu rumo através de décadas a fio, com rebuliços aqui e ali, mas nada que ameaçasse a rotina dos grandes gatunos. O roubo tinha que acontecer de modo a não matar o país, limitado que era o ingresso de sócios ao clube dos pilantras de colarinho branco.

Para manter o povo num permanente estado de exploração e ao mesmo tempo garantir a perenidade dos exploradores, foi preciso incutir na cabeça desse povo o conceito da práxis corrupta. Fez-se necessário fundir a imagem do político com a figura do ladrão num forno de mil graus célsius. O produto dessa alquimia é uma coisa tida como imutável e inexorável – algo incontestável pela própria natureza de ser. Isto é, político é ladrão, sempre. Se não é ladrão, não é político; se é honesto, nunca terá espaço na política. O político ladrão que não agrada será fatalmente substituído por outro político ladrão. Simples assim.

Outros avanços sociais acontecem e os ladrões se apressam na adequação ao novo bioma. A desfaçatez, a cara de pau e o cinismo são alçados a um novo patamar de refinamento e sofisticação. Surgem os mitos, os messias salvadores, os atores de maquiavélicas habilidades teatrais. Surgem os grupos, os encadeamentos fisiologistas, as cooptações, os esquemas altamente entrelaçados e convertidos num bloco de poder absoluto e inexpugnável. A certeza da indestrutibilidade infla os egos e aguça a sede de mais poder. O passo seguinte é pensar alto, é matar um país inteiro. E lucrar com isso.

O que não contavam (os Top Super Bandidos Platinum), era com uma rara conjunção astral de Saturno com Plutão invadindo a órbita de Mercúrio que deslocou a gravidade de Júpiter bombardeando Roubolândia com uma chuva torrencial de meteoros. O fenômeno apanhou todo mundo de surpresa. Ninguém acreditava no desmonte do monstruoso bloco de tungstênio pelo bombardeio de adamantium despencando do céu por meses a fio. Somente depois de muita avaria no bloco corrupto é que as poucas pessoas honestas passaram a nutrir esperanças de ver seu país livre dos ladrões. Mesmo assim, e depois de muito tempo, o núcleo duro permanece intacto, apesar de perder grande parte da sua massa.

O presidente Roubão, antes tranquilo, agora corre da sala pra cozinha tentando escapar da imputabilidade. Seu fiel escudeiro, o Ladronildo, já pulou fora do barco. Por conseguinte, Pilantrônio tenta orquestrar um motim com seus capachos, ao mesmo tempo em que é cercado pelas tropas do Ratonaldo, pelos asseclas do Safadônio e pelo bando do Larápison e seu comparsa Rapinólio. Enquanto isso, a casa dos Hipocritonitas tenta apaziguar os ânimos com ameaças de ruptura. Em meio a tanta instabilidade, as gordas e tufadas ratazanas, acostumadas a mamar nas tetas do governo, ficam desorientas sem saber com quem negociar os esquemas de mais corrupção. Em Roubolândia, a corrupção nunca para (um minuto sequer). Nem pra respirar. O fluxo é contínuo, mesmo com muita gente caindo no precipício. Um povo nascido das entranhas da corrupção não sabe e não quer viver de outra maneira.