terça-feira, 16 de agosto de 2016

MATEMÁTICA PERVERSA DOS TRIBUTOS INDIRETOS


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 16 / 8 / 2016 - A263

No cupom fiscal do varejista Dollar Tree Stores constam dez itens de produtos, sendo quatro deles marcados com a legenda “N” e o restante assinalado com “T”. No final, um resumo aponta as seguintes informações: Subtotal $9,69; Food Tax $0,00; Sales Tax $0,37; Total $10,06. Essa empresa está localizada na Rua Touchstone, 5468, Orlando, Florida, EUA. Nesse Estado americano os alimentos são taxados a zero por cento enquanto as outras mercadorias sofrem o encargo fiscal de 6,65%. O consumidor pôde conferir a exatidão da cobrança tributária ao aplicar o dito percentual sobre a soma de itens “T” ($5,69). Nos Estados Unidos o sistema de tributação sobre consumo é 200 mil vezes mais simples do que no Brasil. Por lá, o preço vem antes e o imposto vem depois. Sobre o valor da mercadoria é aplicado um percentual que resulta no tributo adicionado à operação. Dessa forma, o consumidor da Florida sente a alfinetada toda vez que tira dinheiro do bolso para comprar algo que não seja alimento.

Enquanto por lá, o imposto é separado do produto, por aqui a coisa é amalgamada de tal sorte que não se consegue fazer nenhuma distinção nem mensurar o tamanho da punhalada recebida no bolso. Aqueles dados percentuais que vemos nos cupons fiscais são estimativas imprecisas. Vamos então ao modus operandi. Nos EUA: Produto mais imposto é igual ao total da nota fiscal. No Brasil: “Carga tributária embutida de XX% – Fonte IBPT”. A primeira diferença entre os dois modelos está no percentual fixo adotado por cada estado americano, enquanto que no Brasil a variedade informativa é infinita. Outro fato curioso reside no modo sorrateiro de transmitir a informação fiscal ao consumidor. Por exemplo, dizer que 50% do produto são impostos é o mesmo que admitir uma taxação de 100%. Essa é a grande diferenciação entre os dois modelos. Analisemos a carga de 45% embutida no refrigerante. Agora, vamos separar o imposto do produto, considerando o preço de R$2,00. Assim, R$0,90 é imposto e R$1,10 é produto. Tomando-se por base de cálculo o valor de R$1,10 chega-se à carga tributária de 82%. Essa é a grande sacada. Se o nosso modelo fosse igual ao americano, o percentual informativo relatado na nota fiscal seria praticamente dobrado. O governo faz algo semelhante na matemática dos tais “impostos por dentro”, onde o tributo é base dele mesmo e de outros mais – troço tão surreal que dá um nó na cabeça de qualquer gringo que aporta em terras tupiniquins. Mas nós sabemos que o objetivo dessa pantomima é mascarar a verdadeira carga suportada pelo consumidor.

Seguindo essa linha de raciocínio, vamos enxergando a voracidade ensandecida do Fisco brasileiro. Nas contas do IBPT, 79% do perfume importado é puro imposto. Na verdade, a essência aromática é taxada a 376% quando se separa produto dos tributos. Por conta dessa matemática perversa, outras taxações nos deixam absolutamente estarrecidos, tais quais: gasolina 133%; videogame 257%; margarina 56%; chope 165%; refrigerador 89%; medicamentos 57% etc.

A tributação sobre consumo é escorchante, justamente para compensar o afrouxamento da taxação de renda e patrimônio. Em outras palavras, os pobres são massacrados para compensar o privilégio dos ricos. Dentre os países membros da OCDE, somente Brasil e Estônia não taxam dividendos. Recentemente, o mundo inteiro soube que quase metade dos rendimentos informados pela candidata Hillary Clinton foi convertida em impostos. E ela ainda quer aumentar o imposto dos ricos americanos. Nos EUA o peso da carga tributária sobre patrimônio é três vezes maior do que no Brasil. Essa discrepância fica mais acentuada se compararmos a França (60%) com o estado do Amazonas (2%). Então, se o nosso governo não se atreve a mexer no patrimônio nem na renda, só resta espremer o já esquálido consumidor. Para piorar esse quadro dantesco, o governo promove uma verdadeira depravação com o dinheiro arrecadado. Nossa gestão pública é uma das mais perdulárias do mundo, onde todos os esforços são empreendidos na concessão de regalias infinitas aos figurões da república. Não bastasse tanta incompetência, o erário é também solapado pelo metastático câncer da corrupção. Resumindo: Esculhambação total.

É bom refletirmos sobre o entendimento do Professor Hugo de Brito Machado, que atesta o seguinte: “Tributo com efeito de confisco é aquele que, por ser excessivamente oneroso, é sentido como penalidade”. O artigo 3 do CTN deixa isso bem claro, mas no mundo real essa determinação não surte nenhum efeito prático. Trocando em miúdos, o Estado não deveria se utilizar do poder de polícia para destruir a fonte dos seus recursos financeiros. Seguindo essa linha de raciocínio, alguns estudiosos garantem que o percentual de 50% é a fronteira do confisco. Sendo assim, a assustadora taxação do videogame denuncia um claro atentado ao artigo 150, IV, da nossa Constituição Federal, que determina que os entes tributantes não podem “utilizar tributo com efeito de confisco”. Apesar de contundente, o dispositivo constitucional é vago e subjetivo (como de costume). Uma real intenção de clareza e de seriedade resultaria na fixação de um teto percentual de tributação. Mas o legislador não fez isso, abrindo um largo caminho para taxações infinitas.  

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