terça-feira, 30 de agosto de 2016

NOVOS IMPOSTOS PARA NOVOS CORRUPTOS


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 30 / 8 / 2016 - A265

A presidente Dilma cercada de ratos estampou as páginas do New York Times. A charge evidencia o fato de que sua conduta é a menos delituosa de todos, visto que a maioria dos senadores está envolvida em processos judiciais, e os demais são suspeitos de deslizes morais e legais. A fala destemperada da senadora Gleisi Hoffmann escancarou a grave crise moral do nosso sistema político ao desqualificar seus colegas congressistas.

O Brasil inteiro está em compasso de espera, por conta do tumultuado julgamento que irá consolidar o atual presidente Temer no comando do país. Os agentes econômicos aguardam uma definição do cenário político para reativar projetos de investimentos e de geração de empregos. Para tanto, faz-se necessário o afastamento do PT e a subsequente correção de tantos desmandos administrativos perpetrados pela gestão lulopetista. O problema está no modus operandi, no caminho escamoteado que os adversários estão trilhando para chegar ao objetivo final de derrubar uma presidente escolhida pela maioria da população. O PMDB sabe que esse é o único jeito de estar na presidência da república. Paralelamente, grandes esforços são empreendidos na tentativa de inviabilizar o retorno do Lula em 2018. Na percepção de expressiva parcela da população carente, Lula foi o único político que ajudou os pobres. Sendo assim, nenhuma outra figura pública reúne predicados suficientes para causar o arrebatamento das massas. Daí, a raiva que muitos têm do PT. Motivo: ninguém mais consegue chegar ao coração do pobre.

O jornal El País afirmou que o julgamento é uma farsa, uma vez que a condenação já foi decidida previamente. Isso significa que o ritual do impeachment é puro teatro pra inglês ver – uma maneira de justificar para o mundo que o poder não foi tomado na mão grande. Novamente, a conduta dos senadores foi questionada. Na verdade, toda a imprensa internacional continua batendo na mesma tecla. Isto é, como pode um monte de gente atolada até o pescoço em acusações de crimes gravíssimos, condenar alguém por um erro infinitamente menor? Nesse sentido, a senadora Gleisi Hoffmann está coberta de razão.

O processo de acomodação da nova estrutura de governo vai resultar num aumento das práticas corruptas. É fato notório que o novo governo está promovendo uma faxina geral nos cargos de diversos escalões da gestão federal. Ou seja, um batalhão de gente está saindo e outro grande contingente de ávidos servidores está chegando com uma sede monumental de dinheiro e de poder. Como aconteceu nos primeiros tempos da era petista, toda a massa de nomeados carrega uma ansiedade virulenta de fazer e acontecer. O resultado desse destempero é um aumento convulsivo nas práticas delituosas. Por isso é que o ministro Henrique Meirelles vem reiterando seus alertas para o aumento dos impostos, justamente para cobrir os desvios já previstos pelo novo governo.

Engana-se a pessoa que inocentemente acredita na redução do nível de roubalheira no país. Todo o estardalhaço da Operação Lava Jato não é capaz de inibir a vontade louca de roubar. Basta dá uma olhada no conteúdo das campanhas políticas veiculadas na televisão. Impressiona o fato de ninguém apresentar uma proposta nova; todo mundo repete o batido e surrado discurso dos políticos de outrora. A diferença está na quantidade de eleitores que consegue enxergar o lado demagógico do palavreado fatigante dos candidatos. A corrupção não diminui porque o ato de roubar ainda é um excelente negócio – mesmo com a pressão da Polícia Federal. As penas ainda são pontuais e muito suaves. O próprio sistema jurídico permite que o ladrão se defenda com o dinheiro roubado. Esse mesmo sistema não quer saber da origem do patrimônio dos investigados e, de certa forma, o mega ultra super bandido é tratado como celebridade e ainda é alvo de respeito e admiração daqueles que invejam a conta bancária do criminoso. Por mais esquisito que possa parecer, é assim que a coisa funciona no Brasil.

Por conta de tantas deformações morais e legais que consome o país, é de fundamental importância lutar pela aprovação do projeto do Ministério Público DEZ MEDIDAS CONTRA A CORRUPÇÃO. Por enquanto, único instrumento capaz de frear a sanha delituosa de políticos e de outros agentes criminosos. O congresso e outras forças sobrenaturais estão fazendo uma pressão enorme para derrubar esse projeto do MP. Muita gente grande vem combatendo ferozmente cada uma dessas medidas moralizadoras da gestão pública. Claro, óbvio, a intenção dos bandidos é preservar a estrutura corruptiva enraizada no coração da república brasileira. As forças são poderosas, mas a vontade popular sempre prevalece. Falta a nós, justamente a manifestação dessa dita vontade. 





terça-feira, 23 de agosto de 2016

SONEGADORES PRESOS EM GOIÁS


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 23 / 8 / 2016 - A264

A Secretaria de Fazenda do Estado de Goiás deflagrou no último dia 16 a Operação Arrebatamento, que teve como objetivo principal recuperar aos cofres públicos uma cifra superior a 129 milhões de reais. Cerca de 100 policiais civis, 60 militares e 40 auditores saíram a campo para cumprir 19 Mandados de Busca e Apreensão em supermercados, postos de gasolina, lojas de conveniência etc. A ação coordenada por diversos entes públicos envolveu o cumprimento de quatro mandados de prisão temporária e buscas nas residências dos investigados. Houve também conduções coercitivas que levaram o contador do grupo empresarial investigado para a delegacia. Os auditores fiscais descobriram um volume de 70 milhões de reais em vendas através de cartões de crédito/débito por empresas suspensas na SEFAZ, mas que utilizavam um esquema de blindagem patrimonial composto por pessoas interpostas e documentos falsificados. Todo esse rebuliço aconteceu nas cidades de Luiziânia, Vaparaíso, Cidade Ocidental e Formosa, todas vizinhas do Distrito Federal. O sucesso dessa investigação em muito se deve ao trabalho de inteligência fiscal do órgão fazendário que vem se valendo dos cruzamentos de dados extraídos do sistema público de escrituração digital (SPED).

É importante ressaltar que, nesse caso, o grupo empresarial se valeu de artimanhas jurídicas para acobertar operações ilegais ou escapar de punições mais graves. Mas todo esse aparato foi desbaratado pela Delegacia Estadual de Repressão a Crimes Contra a Ordem Tributária, Secretaria de Estado da Fazenda e Batalhão Fazendário da Polícia Militar, com apoio de um grupo especializado da Polícia Civil (FT-3). O trabalho de investigação foi minucioso porque o esquema montado pelos sonegadores era de uma aparente legalidade. O esforço das autoridades para garantir o sucesso do empreendimento investigativo tinha também uma intenção educativa. Ou seja, a ideia era passar um aviso claro aos contribuintes goianos de que tenham mais cuidado na sua gestão tributária.

É fato conhecido de todos que a Receita Federal vem investindo pesado em avançadas tecnologias de controle fiscal, visando o aumento da arrecadação. Ainda mais nesses tempos bicudos em que vive as administrações públicas. Os moderníssimos instrumentos de cerco fiscal, desenvolvidos e permanentemente aprimorados pelo governo, estão levando o Fisco a mergulhar fundo nas operações das empresas. Dessa forma, os erros e as inconsistências de informações tributárias ficam cada vez mais ostensivas, diante dos olhares esbugalhados do SPED. O pior de tudo é que não adianta arquitetar um sistema coerente de dados manipulados, uma vez que a delação vem das partes relacionadas, como fornecedores, bancos, clientes etc. Inclusive, é bom lembrar que prováveis mecanismos garimpadores do SPED não são de conhecimento público. Isso significa que meio mundo de gente pode está se enrolando numa teia sem saber.

O relatório “Plano Anual da Fiscalização 2016” publicado pela Receita Federal aponta uma série de fragilidades administrativas das empresas. Um bom exemplo dessa vulnerabilidade está no fato de que 93% dos processos de fiscalização resultam em autuação e que 99% dos lançamentos realizados pelos auditores são mantidos pelas instâncias judiciais. Outro número preocupante mostra que 28% das ações fiscais resultam em Representação Fiscal para Fins Penais, que podem levar diretores a responder criminalmente por atos praticados nos escalões gerenciais.

Tantos desafios e tantos perigos só estão ficando mais próximos da realidade empresarial porque o SPED não pára de evoluir. E não adianta fechar os olhos para esse novo e perturbador ambiente de tecnologias fiscais avançadas. O lado perverso dessa realidade que nos assombra se revela num sistema normativo conflituoso e cheio de obscuridades. Se o governo quer partir para a guerra contra o empresariado, é natural que haja justiça nas regras do jogo. Portanto, o momento é de exigir racionalidade do poder público. Por exemplo, cada tributo deveria ter um código unificado, onde tudo quanto é regra ficasse restrita a um único dispositivo normativo. O nosso Regulamento do ICMS segue nessa linha, mas nem todas as regras do imposto estão nele. Por outro lado, a legislação do PIS Cofins é uma loucura sem tamanho, pela dispersão de normas perdidas num mundaréu de atos legais e infra legais. Resumindo, se a coisa é séria, então vamos todos trabalhar seriamente.  





terça-feira, 16 de agosto de 2016

MATEMÁTICA PERVERSA DOS TRIBUTOS INDIRETOS


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 16 / 8 / 2016 - A263

No cupom fiscal do varejista Dollar Tree Stores constam dez itens de produtos, sendo quatro deles marcados com a legenda “N” e o restante assinalado com “T”. No final, um resumo aponta as seguintes informações: Subtotal $9,69; Food Tax $0,00; Sales Tax $0,37; Total $10,06. Essa empresa está localizada na Rua Touchstone, 5468, Orlando, Florida, EUA. Nesse Estado americano os alimentos são taxados a zero por cento enquanto as outras mercadorias sofrem o encargo fiscal de 6,65%. O consumidor pôde conferir a exatidão da cobrança tributária ao aplicar o dito percentual sobre a soma de itens “T” ($5,69). Nos Estados Unidos o sistema de tributação sobre consumo é 200 mil vezes mais simples do que no Brasil. Por lá, o preço vem antes e o imposto vem depois. Sobre o valor da mercadoria é aplicado um percentual que resulta no tributo adicionado à operação. Dessa forma, o consumidor da Florida sente a alfinetada toda vez que tira dinheiro do bolso para comprar algo que não seja alimento.

Enquanto por lá, o imposto é separado do produto, por aqui a coisa é amalgamada de tal sorte que não se consegue fazer nenhuma distinção nem mensurar o tamanho da punhalada recebida no bolso. Aqueles dados percentuais que vemos nos cupons fiscais são estimativas imprecisas. Vamos então ao modus operandi. Nos EUA: Produto mais imposto é igual ao total da nota fiscal. No Brasil: “Carga tributária embutida de XX% – Fonte IBPT”. A primeira diferença entre os dois modelos está no percentual fixo adotado por cada estado americano, enquanto que no Brasil a variedade informativa é infinita. Outro fato curioso reside no modo sorrateiro de transmitir a informação fiscal ao consumidor. Por exemplo, dizer que 50% do produto são impostos é o mesmo que admitir uma taxação de 100%. Essa é a grande diferenciação entre os dois modelos. Analisemos a carga de 45% embutida no refrigerante. Agora, vamos separar o imposto do produto, considerando o preço de R$2,00. Assim, R$0,90 é imposto e R$1,10 é produto. Tomando-se por base de cálculo o valor de R$1,10 chega-se à carga tributária de 82%. Essa é a grande sacada. Se o nosso modelo fosse igual ao americano, o percentual informativo relatado na nota fiscal seria praticamente dobrado. O governo faz algo semelhante na matemática dos tais “impostos por dentro”, onde o tributo é base dele mesmo e de outros mais – troço tão surreal que dá um nó na cabeça de qualquer gringo que aporta em terras tupiniquins. Mas nós sabemos que o objetivo dessa pantomima é mascarar a verdadeira carga suportada pelo consumidor.

Seguindo essa linha de raciocínio, vamos enxergando a voracidade ensandecida do Fisco brasileiro. Nas contas do IBPT, 79% do perfume importado é puro imposto. Na verdade, a essência aromática é taxada a 376% quando se separa produto dos tributos. Por conta dessa matemática perversa, outras taxações nos deixam absolutamente estarrecidos, tais quais: gasolina 133%; videogame 257%; margarina 56%; chope 165%; refrigerador 89%; medicamentos 57% etc.

A tributação sobre consumo é escorchante, justamente para compensar o afrouxamento da taxação de renda e patrimônio. Em outras palavras, os pobres são massacrados para compensar o privilégio dos ricos. Dentre os países membros da OCDE, somente Brasil e Estônia não taxam dividendos. Recentemente, o mundo inteiro soube que quase metade dos rendimentos informados pela candidata Hillary Clinton foi convertida em impostos. E ela ainda quer aumentar o imposto dos ricos americanos. Nos EUA o peso da carga tributária sobre patrimônio é três vezes maior do que no Brasil. Essa discrepância fica mais acentuada se compararmos a França (60%) com o estado do Amazonas (2%). Então, se o nosso governo não se atreve a mexer no patrimônio nem na renda, só resta espremer o já esquálido consumidor. Para piorar esse quadro dantesco, o governo promove uma verdadeira depravação com o dinheiro arrecadado. Nossa gestão pública é uma das mais perdulárias do mundo, onde todos os esforços são empreendidos na concessão de regalias infinitas aos figurões da república. Não bastasse tanta incompetência, o erário é também solapado pelo metastático câncer da corrupção. Resumindo: Esculhambação total.

É bom refletirmos sobre o entendimento do Professor Hugo de Brito Machado, que atesta o seguinte: “Tributo com efeito de confisco é aquele que, por ser excessivamente oneroso, é sentido como penalidade”. O artigo 3 do CTN deixa isso bem claro, mas no mundo real essa determinação não surte nenhum efeito prático. Trocando em miúdos, o Estado não deveria se utilizar do poder de polícia para destruir a fonte dos seus recursos financeiros. Seguindo essa linha de raciocínio, alguns estudiosos garantem que o percentual de 50% é a fronteira do confisco. Sendo assim, a assustadora taxação do videogame denuncia um claro atentado ao artigo 150, IV, da nossa Constituição Federal, que determina que os entes tributantes não podem “utilizar tributo com efeito de confisco”. Apesar de contundente, o dispositivo constitucional é vago e subjetivo (como de costume). Uma real intenção de clareza e de seriedade resultaria na fixação de um teto percentual de tributação. Mas o legislador não fez isso, abrindo um largo caminho para taxações infinitas.  

 ...




terça-feira, 9 de agosto de 2016

UMA CLASSE TOTALMENTE DESMORALIZADA


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 9 / 8 / 2016 - A262

O Presidente Obama esbanja carisma e eloquência por onde passa. Os alemães, por exemplo, são apaixonados pela imagem do Grande Líder Americano. Nos EUA, até os mais ferrenhos adversários evitam qualquer juízo precipitado sobre o chefe da nação – algo parecido com o respeito que os brasileiros dispensam ao Magistrado Sérgio Moro. Se a cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos tivesse ocorrido na terra do Tio Sam, é provável que o povo se levantaria orgulhoso para aplaudir mais um dos notáveis discursos do Estadista Barack Obama.

Pois é. Sexta-feira passada, na belíssima festa abrilhantada pelos talentosos artistas parintinenses, o protocolo foi quebrado logo de cara, pela supressão do nome do presidente interino Michel Temer no momento em que foram apresentadas as autoridades máximas do evento – algo que surpreendeu os jornalistas da Rede Globo. Mais a frente, quando não deu pra fugir da responsabilidade, as pouquíssimas e apressadas palavras do acanhado Temer foram fragorosamente abafadas pelo som ruidoso de muitas vaias que estremeceram o estádio do Maracanã. Detalhe: Ele falou sem ser anunciado e num tempo recorde de 10 segundos (mico total). Esse flagrante escancarou para o mundo a péssima e deplorável imagem que os nossos políticos levaram décadas para construir depois de muita roubalheira e de muita desfaçatez. Até o ditador turco Tayyip Erdogan não sofre tamanha rejeição do seu povo.

Em vários flashes de imagem mostrados ao logo da transmissão foi possível perceber a alegria e animação de autoridades e personalidades presentes na tribuna de honra. Já, as nossas autoridades políticas demonstravam alta tensão e muito constrangimento, como se quisessem fugir dali o mais rápido possível. Talvez o motivo de tanto pudor estivesse no sentimento paranoico de que a forte luz dos holofotes poderia derreter a grossa camada de verniz que acoberta suas caras-de-pau.

Pergunta-se então como é que os políticos podem levar suas vidas se escondendo do povo. Nas entrevistas e reportagens diárias nota-se o colossal esforço da politicada em geral para segurar a onda e não parecer tão descaradamente hipócrita na televisão. Possivelmente, essa trupe consome muitas horas de treinamento frente ao espelho em aulas de arte dramática. Pena que o talento e a grandeza não são facilmente alcançáveis. Daí, que vez por outra somos espectadores de verdadeiras óperas bufas que estão permanentemente em cartaz, principalmente nas comissões disso ou daquilo que pipocam no Congresso Nacional. Por outro lado, um ínfimo fragmento de políticos expressa dignidade naquilo que diz ou que faz. Não é certo se isso decorre duma índole verdadeiramente nobre ou dum caráter propositadamente maquiavélico. Temos poucos exemplares dessa fauna aqui na nossa região. Mas, como disse Nicoló Machiavelli, saber dissimular é o saber dos reis. Enquanto isso, o povo abestalhado está abrindo os olhos e por tal motivo os velhos discursos caducaram. Ganhar tudo no grito demagógico já não está tão fácil como antes. É preciso então se reinventar e estudar os mecanismos psicológicos das massas para descobrir novos caminhos que reconquistem corações e mentes. Talvez a honestidade seja uma opção a se considerar. O problema é que a honestidade pode invalidar todos os motivos que leva alguém a enveredar pelo universo da política. O candidato pode dizer: Por que eu deveria lutar tanto se não ganharei nada com isso? A nossa cultura é assim. Somos assim. É a inexorável “Lei do Gerson”.

Lamentavelmente, tragicamente, a classe política brasileira está completamente desmoralizada. A desilusão corre o país de norte a sul deixando as pessoas sem rumo e sem esperança. O bombardeio inclemente da Operação Lava-Jato derruba todo dia vários tijolos da nossa edificação, das nossas crenças, da nossa própria identidade. É muito perigoso imaginar um povo desacreditado das instituições e dos seus dirigentes. Principalmente, quando a desconstrução do sistema político é seguida pela desmoralização da Justiça e da Segurança Pública. O terror perpetrado por facínoras dos diversos quadrantes nada mais é do que um termômetro da nossa degradação política. Os criminosos que incendeiam ônibus ou que cometem latrocínios aos borbotões nada mais fazem do que reivindicar isonomia frente aos bandidos de grosso calibre instalados no poder público. Que Deus tenha piedade das nossas almas. Hallelujah, hallelujah, halleluuuuujah!!





 ...





terça-feira, 2 de agosto de 2016

A CONFUSÃO DOS TRIBUTOS INDIRETOS


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 2 / 8 / 2016 - A261

Configura-se crime contra a ordem tributária, deixar de recolher no prazo legal os valores de tributos descontados de terceiros (Lei 8137/1990 art. 2º, II). Nessa situação é enquadrada a contribuição previdenciária e o imposto de renda descontados dos empregados pelas empresas. Poder-se-ia também incluir nesse rol de ações delituosas o IPI, bem como a Substituição Tributária do ICMS cobrado do adquirente de mercadorias. Em qualquer dessas hipóteses fica caracterizado o ato de apropriação indébita. Enquanto isso, os tributos indiretos possuem distinções bem particulares e por tal motivo merecem uma análise cuidadosa. Por exemplo, o imposto declarado e não pago deixa de sujeitar o contribuinte às penalidades do dispositivo legal supramencionado. Crime haveria se for comprovada alguma intenção de fraude com propósito de enganar as autoridades fazendárias. O simples inadimplemento não pode resultar numa ordem de encarceramento, mesmo porque o Brasil é signatário da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, que dispõe no seu artigo 7º, item 7, que “ninguém deve ser detido por dívidas” (vide Decreto 678/1992).

Isto posto, vamos imaginar duas situações hipotéticas de inadimplência tributária. O comerciante João acrescenta ao custo de aquisição uma margem pequena o suficiente para justificar um modesto percentual de lucratividade. Portanto, não é possível afirmar que esse comerciante se apropriou de um imposto não cobrado do consumidor. Por outro lado, o comerciante Pedro formalizou e documentou um procedimento interno que evidencia com exatidão a quantidade de impostos indiretos embutidos nos preços dos produtos que comercializa. Ou seja, de posse desse material informativo uma ação fiscalizatória conseguiria identificar os valores “retidos” do cliente e não repassados ao erário no prazo legal. Pois é!! Curiosamente, a legislação não distingue as duas condutas. Tanto um quanto o outro estão no mesmo nível de irregularidade. E o motivo está na caracterização do fato gerador do tributo, que é a saída da mercadoria do estabelecimento empresarial, e também na relação jurídica fixada entre o governo (sujeito ativo) e o empresário (contribuinte de direito). Acontece que o consumidor é Contribuinte de Fato por suportar o custo financeiro de tantos rebuliços normativos. Mesmo assim, metade do valor do refrigerante não repassado ao erário deixa de ser uma apropriação indébita por causa da interseção de responsabilidades e de uma coisa denominada “não cumulatividade”. Não nos enganemos. Toda confusão tem um propósito.

Se ICMS, Pis e Cofins tivessem o mesmo tratamento do IPI ou se o nosso sistema de impostos sobre consumo fosse igual ao dos EUA, é certo que o nível de sonegação seria infinitamente menor pelo grande risco de penalidade criminal. Uma eventual mudança de sistema poderia desencadear graves possibilidades de guerra civil no país. Imagine então o consumidor chegando ao caixa duma loja para pagar um videogame de R$ 500 e descobrir que tem mais R$ 1.500 de imposto!! O nosso modelo tributário esconde essa informação taxativa do consumidor, que é fraudulentamente informado do preço de R$ 2.000. Imagine aquela pessoa que passou um ano economizando e depois é informado de que quase todo o seu suado dinheirinho vai ser usado para bancar o luxo e as extravagâncias de deputados e de outros agentes públicos!! É certo de que a população sairia às ruas quebrando tudo e ateando fogo nas casas dos políticos. Lamentavelmente, o consumidor brasileiro é acintosamente enganado sempre que compra alguma coisa, uma vez que o comerciante não separa na etiqueta do preço o que é imposto e o que é produto. A falha, nesse caso, é de um sistema legal torto e malicioso.

A confusão tem seus percalços. Uma das maiores dificuldades é identificar com precisão a quantidade de tributos indiretos embutidos nos preços das mercadorias. No supracitado caso do comerciante João, mesmo que dobrasse o preço de aquisição do produto, ele poderia afirmar que não adicionou Pis/Cofins/ICMS e que toda a margem acrescentada é custo administrativo e percentual de lucratividade. A legislação, de certo modo, desconsidera a existência do Contribuinte de Fato, suscitando a tese de que, na prática, Pis/Cofins/ICMS são tributos diretos, assim como imposto de renda ou IPTU.

Por conta de tantos e imutáveis imbróglios, continuaremos tropeçando nas próprias pernas, pagando mico frente ao mundo, atravancando negócios e assistindo de camarote ao festival de presepadas dos nossos legisladores. Enfim, somos um bando de caipiras simulando gestos da nobreza. Somos incapazes de entender e consequentemente somos incapazes de questionar. Pior, somos covardes por não lutar pela racionalidade do sistema tributário. 


 ...