terça-feira, 31 de julho de 2012

O Exercício da Cidadania Fiscal

Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 31/07/2012
Artigos publicados

A questão tributária tem encabeçado a lista das preocupações do empresariado brasileiro. Nunca antes alguém havia imaginado um Estado munido de uma força tão avassaladora como agora. O peso esmagador do SPED e a multiplicidade de obrigações acessórias vêm empurrando o contribuinte para o terreno movediço da insegurança jurídica – império da dúvida e da falta de objetividade das normas fiscais. Por conta desse estado de coisas, tanto o fisco quanto o contribuinte se veem obrigados a navegar no oceano da subjetividade e consequentemente suportar as consequências nefastas dessa situação dicotômica. Antigamente nenhum dos lados observava o texto da lei e dessa forma cada parte da relação tributária adotava os procedimentos que mais lhes fosse conveniente. Esse comportamento ainda perdura, dando mostras de que muita confusão ainda vem pela frente. Por esses e outros motivos é que fracassam tantas tentativas de operacionalizar complexos e sofisticados mecanismos de controle fiscal: acaba-se posteriormente descobrindo que nem o fisco, nem o contribuinte possuem estrutura e capacitação suficientes para suportar tamanha mudança de paradigma.

Um ambiente fiscal tão instável e confuso exige maior grau de lucidez e ponderação por parte do sujeito ativo da relação tributária, principalmente agora que o peso da vantagem pendeu totalmente para o seu lado. Antigamente o fisco não tinha recursos suficientes para abraçar a quase totalidade das operações fiscais da forma como está acontecendo atualmente; a eficácia das suas ações era muito limitada. O sujeito passivo da relação tributária, por sua vez, se mantinha alheio às recorrentes majorações de tributos, visto que sempre dava seu jeito de pagar somente aquilo que as condições do caixa permitiam. Agora, a situação está bem diferente, visto que o fisco possui tentáculos múltiplos e longos o suficiente para alcançar cada operação de cada contribuinte. O fisco aprendeu direitinho a atacar, mas o contribuinte não aprendeu a se defender. E a relação entre esses dois agentes azedou de vez devido ao fato de não haver dispositivos legais capazes de apaziguar os interesses de ambos os lados. A lei deveria ser o instrumento hábil para delimitar direitos e obrigações, mas quando uma empresa decide aplicar as normas legais “ipsis litteris”, ela se vê mergulhada num complexo cipoal de interpretações antagônicas que se enroscam e se sobrepõem formando uma espiral que leva ao infinito.

Como o poder está totalmente concentrado nas mãos do fisco, fica o contribuinte cada vez mais dependente da circunspeção, da lucidez e da lisura dos representantes das entidades fazendárias. Daí, a grande importância do exercício permanente da interlocução entre os agentes arrecadadores e a classe empresária, visto que acima da lei está a razão. Por isso, somente o debate racional e ponderado torna possível o equilíbrio entre a necessidade de arrecadação e a capacidade contributiva das empresas. Quando se chega a um consenso, parte-se então para a mudança da lei. É bom não esquecer que a nossa estrutura social, tal qual a conhecemos, só existe por causa dos tributos. Sem eles simplesmente não haveria civilização. Portanto, utilizar-se de meios ardilosos para pagar pouco ou nenhum imposto seria como negar o atual estágio civilizatório que nos encontramos. Inclusive, vários agentes do mercado não veem com bons olhos as políticas agressivas de planejamento tributário, por conflitarem diretamente com o ideário de responsabilidade social.

Essa tão necessária interlocução entre fisco e contribuinte acontece de formas bem diferentes entre as variadas regiões do nosso país. Tudo depende dos fenômenos históricos e econômicos que forjaram a cultura local. Em Manaus, por exemplo, prevalece a dependência das isenções, das benesses e dos favores emanados do poder público. Prevalece ainda uma acomodação às decisões governamentais, o que contribui para um empresariado local pouco questionador das ações do poder imperial dos governantes. Ou seja, o senso de cidadania fiscal é incipiente. Um bom exemplo é o endeusamento do secretário estadual da fazenda, um homem que mais parece uma entidade, visto que é inimaginável a possibilidade de um contribuinte conversar com ele por alguns minutos sobre assuntos fiscais.

Já em Porto Velho, acontece um fenômeno absolutamente oposto. O secretário da fazenda estadual é capaz de dispensar alguns minutos para atender um contribuinte comum que aparece sem agendamento de horário. Claro, sabe-se que isso jamais aconteceria em Manaus. No estado de Rondônia acontece uma intensa interlocução entre fisco e contribuinte. Os diversos representantes do setor econômico estão em permanente interlocução com a secretaria de fazenda estadual onde a partir do debate de interesses se chega a decisões que possam atender reivindicações com mínimo de impacto no erário. Quanto aos segmentos econômicos que não se organizam e nem lutam para defender seus interesses, esses não podem simplesmente reclamar de injustiças fiscais.

terça-feira, 24 de julho de 2012

A TRAGÉDIA DA EDUCAÇÃO

Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 24/07/2012
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Negócios são negócios. Essa sentença expressa o poder soberano do dinheiro onde tudo o mais se torna secundário. Muitos argumentos, teorias, posturas, idealismos são criados para suavizar um pouco a ganância desmedida entranhada na alma do capitalista. Obviamente, isso não poderia deixar de ser aplicável ao ensino privado. O problema é que o ato de educar é revestido de uma aura divina, evocando assim os mais sublimes e elevados sentimentos humanos. O resultado dessa combinação heterogênea é uma engrenagem cujos componentes se atritam e se corroem, tendo como inevitável subproduto a demagogia e o cinismo. Ou seja, fala-se uma coisa e faz-se outra completamente diferente. E na divisão das incumbências, fica a ganância com o dono da escola e a dedicação com o professor; o primeiro passa por cima de tudo quanto é preceito moral para tufar o seu bolso, enquanto que o segundo tem que dar sua alma para encantar seus alunos, não importando quantas chicotadas receba dos superiores nem se ganha pouco ou se houve descontos indevidos no seu salário. Afinal de contas, o professor tem por dever ético zelar pela formação dos seus alunos, enquanto que o dono da escola não tem dever ético nenhum.


O que é evidente e ostensivo nos ambientes educacionais privados é o viés da relação mercantil. Até o cheiro que se sente nos corredores e salas de aula é parecido com aquele identificável num shopping. É possível observar que os alunos adotam uma postura de cliente. O aluno é O CLIENTE. E o cliente sempre tem razão. Por isso, não pode faltar papel no banheiro e o ar-condicionado tem que está na temperatura exata. O desempenho do professor é pautado numa relação contratual; ele é obrigado a atender bem o seu cliente, diga-se, seu aluno. Se o docente passar uma atividade um pouco mais trabalhosa, os alunos imediatamente reclamam junto à coordenação que não têm tempo para estudar e que o professor está exigindo que estudem. Em seguida, o coordenador instantaneamente repreende o professor. Reprovar um aluno que não aparece em sala de aula é algo intolerável, passivo até de demissão sumária. Afinal de contas, o aluno não dá as caras, mas paga o salário do professor. Se compararmos o ensino superior privado com as universidades públicas é possível identificar dois universos diametralmente opostos, com princípios, posturas e atmosferas totalmente diferentes. No ensino público o aluno sabe que se não estudar será reprovado. Por isso mesmo, ele se concentra mais nos estudos do que na limpeza do banheiro ou no ar-condicionado.

A grande tragédia do ensino está no parco retorno financeiro do trabalho do professor. A remuneração somente das horas trabalhadas em sala de aula já é minguada, sendo que as atividades fora da sala de aula consomem madrugadas e finais de semana, não havendo assim pagamento por esse trabalho extra. Dessa forma, só permanece na profissão aquele que não tem outra opção de sobrevivência ou um ou outro idealista sonhador. O aluno acaba tendo como mestre uma pessoa frustrada, cansada e desiludida. Claro, sabemos que, como disse Jesus Cristo, uma árvore ruim não pode dar bons frutos.

Qualidade do ensino é uma coisa que passa muito longe das preocupações das faculdades particulares, visto que focam mesmo é na manutenção do aluno bom pagador e nos índices do MEC. Tudo o mais é ignorado. Se os negócios estiverem indo bem, pouco importa se o professor é bom ou não. Mais importante é o funcionamento do ar-condicionado e dos banheiros.

O aluno, percebendo esse estado de coisas e sendo obrigado a assistir a uma aula chata e improdutiva de um professor que não domina plenamente sua disciplina, acaba não se interessando em estudar nem sendo estimulado a frequentar a faculdade. Ele conclui que o motivo de pagar a mensalidade é a obtenção do diploma do curso superior. Ele sabe que a única coisa que restará ao final do curso será o diploma. Quanto ao aprendizado, ele buscará por conta própria os meios necessários para obtê-lo. Por isso o aluno fica extremamente revoltado quando um professor deslocado do esquema se atreve a reprová-lo.

Por conta de tantas tragédias, certos tipos de reflexões ficam proibidíssimas nas conversas entre professores. O melhor a fazer é bater o ponto direitinho e ir para a sala de aula fazer o “somebody love”. Afinal de contas, só os loucos e as crianças falam a verdade. Por isso mesmo, os primeiros são encarcerados e os segundos educados.

domingo, 22 de julho de 2012

MANTENHA-SE O BENEFÍCIO FISCAL

Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 03/07/2012
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A Lei Complementar Estadual nº 103, publicada em 13 de abril de 2012, revogou o benefício fiscal prescrito na alínea “d” do inciso I do artigo 12 da Lei Complementar 19/1997, retroagindo seus efeitos para 01 de março de 2012, caracterizando-se assim um flagrante desrespeito ao Princípio da Anterioridade. Dessa forma, a alíquota interna do ICMS aplicada sobre bens de informática passou de 7% para 17% – um aumento tributário impactante numa linha de produtos tidos como estratégico para o desenvolvimento econômico e social da nossa região, assim como também para as demais regiões do país.


Acontecimento estranhíssimo (ou suspeitíssimo) é o fato dos nossos deputados terem violado de forma grosseira e ostensiva o princípio da anterioridade, como se fossem um bando de ignorantes da escola primária parlamentar. Esse tipo de coisa levanta o seguinte questionamento: A nossa Assembleia Legislativa Estadual possui ou não possui um corpo de profissionais especializados para assessorar seus digníssimos deputados? Esse deslize é resultado de pura incompetência ou a Lei Complementar foi defumada com um tempero pérfido preparado pelo governo estadual com intuito de engordar os cofres do erário? O que de mais sombrio pode estar acontecendo nos recônditos daquela casa? É..., parece que Otto Von Bismarck estava certo quando disse: “Se o povo soubesse como são feitas as leis e as salsichas, não dormiria tranquilo”.

O reverso dessa situação rocambolesca ficou por conta da SEFAZ, que em iluminado ato de bom senso optou pela legalidade ao obedecer ao princípio da anterioridade, tornando aplicável a extinção do benefício fiscal a partir do início de 2013, contrariando assim a determinação contida na Lei Complementar 103. Na realidade, isso só aconteceu depois de muito rebuliço, reuniões e pressões para que uma aberração constitucional não arrebatasse o espírito dos nossos probos coletores de impostos. Com certeza, fizeram um esforço descomunal para resistir à tentação de fazer valer o Inciso II, do Artigo 4º, da Lei Complementar 103; algo parecido com a pessoa que resolveu de uma hora para outra parar de fumar. O pessoal da SEFAZ deve ter tido crises violentas de abstinência. Agora, talvez estejam mais calmos e resignados em esperar 2013 para cobrar mais impostos sobre bens de informática.

Na época de Jesus Cristo, os coletores de impostos nunca eram bem vindos, visto que os tributos que arrancavam dos judeus beneficiavam somente os romanos. Daí, a razão do ódio que fervia no peito dos esbulhados. Será que os romanos de hoje são os apaniguados dos “cachoeiras” e dos “mensaleiros”? Será que são os fiscais bandidos que chegam a dizer aberta e grosseiramente para o contribuinte que “são capazes de encontrar cabelos em casca de ovo”? Será que os romanos atuais são os corruptos? Ou será que é simplesmente o governo que absolutamente nada de efetivo faz para acabar com a corrupção? Será que os romanos contemporâneos são a turma que chega ao ponto de rasgar a Constituição Federal para aumentar o peso da já insustentável carga tributária?

O caráter da “essencialidade” dos bens de informática, expressão contida no próprio RICMS/AM, ainda é válido; a manutenção do benefício fiscal ainda é necessária. Muita gente dos estratos sociais menos favorecidos da sociedade possui uma percepção limitada do mundo devido à falta de educação de qualidade. Sendo assim, são presas fáceis do palavreado sofismático de políticos mal-intencionados. A maioria não sabe o que é um shopping, não sabe se expressar, não sabe cuidar da própria aparência, não tem acesso a uma alimentação de qualidade; enfim, não sabe o significado de cidadania. Mesmo assim, esse pessoal sabe que um computador com acesso à internet é extremamente importante para que os filhos tenham um destino diferente dos pais. Um computador numa casa simples de periferia pode provocar uma revolução na vida de quem o opera. A internet escancara um universo de possibilidades, atingindo em cheio a mentalidade atrofiada do cidadão. Se o benefício fiscal aqui tratado for extinto, o acesso ao mundo da informática ficará muito mais restrito àqueles de situação financeira mais abastada. É claro, sabe-se que os deputados pouco estão se importando com os ignorantes despossuídos e tapados do senso de cidadania. Esse pessoal pode ficar lá nos seus barracos sem poder comprar computador, visto que a SEFAZ precisar entupir o preço dos bens de informática com impostos.

CONTROLE X CONFIANÇA

Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 08/05/2012
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Quando uma única pessoa ocupa o topo da pirâmide de uma organização complexa sem ter com quem compartilhar responsabilidades estratégicas, acaba colocando sobre os próprios ombros um peso muito grande. A pressão se torna mais intensa quando as unidades de negócios são dispersas em municípios ou estados diferentes.

Poder e solidão são irmãos siameses; separar um do outro não é tarefa fácil. E estando assim absolutamente sozinho, o rei se vê obrigado a desenvolver um apuradíssimo grau de percepção que permita interpretar as intenções por trás de gestos, comportamentos e palavras. A obtenção dessa inteligência interpessoal possibilita o afloramento de abordagens e questionamentos precisos junto ao interlocutor, permitindo igualmente, a criação de condições sadias para a tomada de decisões acertadas. Dessa forma, o administrador consegue produzir muito sem perder o equilíbrio. Obviamente, a conquista desse dito equilíbrio está vinculada ao estabelecimento de estruturas administrativas inteligentemente dimensionadas e à distribuição de responsabilidades táticas entre pessoas competentes, comprometidas e honestas. Isso significa que o gestor que está no topo da pirâmide deve fazer a máquina organizacional trabalhar ao seu favor.

A palavra-chave que martela intermitentemente a cabeça dos capitães de navio é “controle”. Controle é tudo. Controle significa enxergar todas as dimensões do caminho que se está trilhando. Por isso, muita gente tem investido volumosas quantias de dinheiro na construção de sistemas de controle e ferramentas sofisticadas de gestão, como por exemplo, os sistemas ERP (Enterprise resource planning), o BSC (Balanced scorecard) ou o tão desejado BI (Business Intelligence). Esse arsenal de ferramentas sofisticadas já é bem utilizado por algumas organizações. Tais ferramentas conferem ao diretor o poder de puxar a informação e não mais esperar que alguém a lhe entregue. Claro, sabe-se que não é nada fácil chegar ao ponto de usufruir desses avanços tecnológicos. Não é fácil, mas não é impossível, visto que diversas outras melhorias substanciosas são perfeitamente viáveis, como por exemplo, atribuir um caráter gerencial aos procedimentos de registro da contabilidade. Outra medida de impacto seria simplesmente o diretor estudar em profundidade a ciência contábil, até mesmo para investir num sistema de contabilidade gerencial e também para trabalhar em conjunto com o contador na construção de modelos de controle contábeis que possam demonstrar com alta fidelidade as modificações que ocorrem no patrimônio da empresa. Vencendo essa etapa, as outras se tornariam mais factíveis.

 

Quem ainda está acorrentado ao carrancismo dos ineficientes modelos de controle, têm que depender demasiadamente da confiança que deposita nas pessoas que orbitam ao seu redor. Nesse caso, dificilmente o administrador consegue trabalhar sem a presença ostensiva e recalcitrante da paranoia. O administrador arrebatado por esses sentimentos causticantes vive atormentado e também atormenta todos à sua volta. Isso normalmente acontece com aqueles desprovidos da argúcia tão característica dos empreendedores bem sucedidos e aparentemente serenos. Nesses casos, a confiança se torna uma moeda de altíssimo valor e as pessoas confiáveis ganham uma atenção especial do chefe. Sabemos todos nós que confiar nas pessoas é uma tarefa extremamente árdua, senão impossível, visto que somos cercados de histórias escabrosas de quebra de confiança. Dessa forma, o que acontece é que acabamos adotando a estratégia de confiar desconfiando. Em face desse quadro desapontador, quem teve a sorte de reunir elementos suficientemente fortes que sustentam a confiabilidade de um colaborador, deve tratar essa pessoa com toda a reverência possível, principalmente se essa confiança estiver acompanhada da competência. Afinal de contas, tudo que é raro custa mais caro. 

REINO DA DINAMARCA

Reginaldo de Oliveira

Há algo de estranho na Secretaria de Fazenda do Estado do Amazonas; são reuniões e rebuliços que demonstram certa instabilidade evidenciada através do caso rocambolesco da Lei Complementar 103/2012. O afã de aumentar a arrecadação tem produzido efeitos perversos nos controles fiscais dos contribuintes. Não à toa, ocorre diariamente uma peregrinação de pessoas indignadas com abusos do órgão, que resolveu transformar num inferno a vida de quem trabalha de sol a sol. Fica evidente para o observador um pouco mais atento que a coisa fugiu do controle; o clima carregado denuncia uma crise de gestão. Gerências, auditores, técnicos, pessoal operacional, sistemas, processos e legislação estão desalinhados com algum tipo de política ou diretriz. Essas deduções até podem está equivocadas, mas essa é mensagem transmitida aos contribuintes.

É possível que a SEFAZ não esteja conseguindo digerir o volume considerável de mudanças que ocorreu nos últimos anos, com destaque especial para os sistemas eletrônicos de controle das operações fiscais. Os controles eletrônicos do SPED se apresentam como um imenso desafio, por conta da sua envergadura e complexidade. Seu funcionamento satisfatório depende de todo um programa que envolve capacitação, preparação, amadurecimento e investimentos maciços em tecnologias avançadas e capital humano, além da questão fundamental, que é a gestão de toda essa coisa. Será que a nossa Secretaria de Fazenda Estadual está conduzindo competentemente esse processo de mudança de paradigma? Pode ser que sim; pode ser que não.

O problema é que os atropelos extrapolaram as fronteiras do bairro do Aleixo e chegaram à Assembleia Legislativa onde nossos digníssimos e competentíssimos parlamentares pisaram feio na bola. A Lei Complementar nº 103, publicada dia 13 de abril de 2012, acabou com o benefício fiscal dos bens de informática, elevando a alíquota do ICMS de sete por cento para dezessete por cento. O fato mais espantoso dessa lei está no seu artigo terceiro, que retroage seus efeitos para o dia primeiro de março de 2012. Ou seja, pelo jeito os assessores dos deputados não os avisaram que existe um preceito fundamental do direito tributário que é denominado de princípio da anterioridade, também conhecido como princípio da não-surpresa tributária. Tal princípio expressa a ideia de que a lei tributária seja conhecida com antecedência.

O artigo 12 da LC 19/1997 relaciona um conjunto de alíquotas especiais em função da essencialidade de alguns produtos e serviços, incluídos nesse rol os bens de informática. A revogação do benefício estabelecida na LC 103/2012 retira o caráter da essencialidade dos bens de informática. Essa decisão suscita o seguinte questionamento: Será que essa descaracterização da essencialidade foi adequadamente estudada e debatida? Ou será que simplesmente decidiu-se riscar o texto da lei. O comércio de produtos de informática ainda é essencial, sim; é uma área estratégica para o desenvolvimento do país e por isso mesmo deve continuar ativo no supracitado artigo 12.

No começo da semana passada a alínea “d” do inciso I do artigo 12 da Lei Complementar 19/1997, constava no site da SEFAZ revogado com letras em negrito e em vermelho, apontando os efeitos para o dia primeiro de março de 2012 (benefício fiscal para bens de informática). Depois de certo rebuliço, alguém deve ter ensinado ao pessoal da SEFAZ, algo sobre o princípio da anterioridade. Assim que o pessoal da SEFAZ soube da existência do princípio da anterioridade, providenciou-se então uma retificação e dessa forma a semana fechou com uma mudança no site, que agora diz que a revogação só valerá em 2013. Finalmente, o princípio da anterioridade foi obedecido. Essa atitude sensata da SEFAZ não encerra o assunto, visto que a lei continua errada. Das duas, uma. Ou nossos parlamentares cometeram um erro primário e vergonhoso, ou cometeram um dolo intencional ao publicar uma lei inconstitucional na expectativa da coisa passar incólume pelos intestinos do contribuinte. Tal fato não ocorreu devido à cólica provocada em muita gente logo depois de engolir a notícia da publicação da Lei Complementar 103.

Agora é esperar que o bom senso instalado na SEFAZ chegue até a Assembleia Legislativa do Estado do Amazonas. Claro e obviamente, há de ser revogada essa estapafúrdia Lei Complementar 103, ou pelo menos que a lambança do seu artigo terceiro seja corrigida.