terça-feira, 24 de outubro de 2023

O PREÇO DA ESTUPIDEZ NORMATIVA

Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio  dia   24 / 10 / 2023 - A487
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O relatório do IBPT publicado no último dia 30 de setembro aponta a cifra de R$ 228 bilhões gastos anualmente com o tal “custo de conformidade”. Ou seja, dinheiro torrado na preparação dos tributos (com pessoal, equipamentos, consultorias etc.). Trata-se de um pesado custo administrativo que corrói as finanças de quem tenta acompanhar o frenético e transloucado ritmo de publicações fiscais. O estudo do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação mostra que desde a promulgação da nossa Constituição até o dia 30 de setembro de 2023, foram editadas 492.521 normas tributárias; uma média de 55 por dia útil. Desse total, apenas 34.266 estavam em vigor. Isso significa que 93% do volume burocrático foram revogados. Os dados assustam, mas nesse período foram editados 5.531.011 artigos, 12.887.255 parágrafos, 41.206.301 incisos e 5.420.391 alíneas. Tais números se referem às regras normatizadas pelos dispositivos legais. O pior é que, além de sermos obrigados a ler tudo isso, devemos ainda observar o turbilhão de decisões judiciais que pega esse calhamaço e depois bate no liquidificador, transformando tudo num caldo venenoso. E agora vem a pergunta: Isso é normal? Ou existe algo demoníaco atuando nos bastidores do poder público? 

Uma nuvem de suspeita paira na cabeça do legislador tributário, já que não é possível enxergar seriedade no processo normativo. Tudo indica que existe no Brasil uma parceria maliciosa entre o legislador, a indústria do contencioso e o clube da corrupção. Basta observar o exponencial crescimento dos litígios tributários que caminham no mesmo ritmo do incremento de textos normativos cheios de violações constitucionais. Parece que um erro proposital é feito para depois ser corrigido nos tribunais. E no final das contas, os ganhos são partilhados. Nesse jogo, o corrupto faz o meio de campo ao aplicar multas sobre operações que sabe serem impossíveis de cumprir. Isso empurra o contribuinte para o abismo do contencioso, que já soma 75% do PIB. Muitos especialistas afirmam que mais da metade desse volume é crédito podre que nunca vai ingressar no erário. Isso mostra que o jogo diabólico funciona perfeitamente, já que meio mundo de gente não pagou e nunca vai pagar. E esse dinheiro sonegado está nos bolsos dos espertalhões que operam o jogo orquestrado pelo legislador e por vários atores públicos e privados. Podemos dizer que abrigamos a mais organizada e astuta máfia do mundo. Em matéria de roubalheira, somos especialistas, uma vez que o Tesouro dos EUA classificou a Operação Lava Jato como “o maior caso de suborno estrangeiro da história”. Somos também campeões do acobertamento, já que o STF vem aniquilando a Lava Jato e perseguindo seus autores, glorificando assim a corrupção e a impunidade. E é nesse ambiente sombrio que estamos vivendo e tentando levar uma vida normal. 

Com tantos desarranjos explodindo igual fogos de réveillon, resta o espanto frente à inércia congelante no corpo das vítimas de tudo isso. Grande parcela do empresariado paga o preço amargo do asfixiante Custo Brasil, mas os grandes jogadores empurram a conta para o consumidor. Nesse movimento agitado das placas tectônicas, muitos tentam escapar dos terremotos via aproximação do poder público. Tipo assim: Em vez de lutar contra o sistema corrupto, junte-se a ele. E os demais que se lasquem. 

Pois é. Mesmo assim, e até para quem lucra com o sistema doentio, a burocracia exacerbada inferniza o cotidiano de muita gente. Por exemplo, várias empresas amazonenses foram chacoalhadas com um problema de ajustamento de unidade de produto, onde tiveram que gastar verdadeiras fortunas na polêmica envolvendo UN, UND, UNI, UNID, PC, CX, GF etc. E detalhe: há o risco de autuações onerosas por causa disso. Agora, imagine explicar essa bizarrice para uma empresa estadunidense!! Eles vão achar que somos totalmente malucos. E somos mesmo. Somos malucos por engolir tais bizarrices sem articular um movimento para investigar o que existe por trás de tanta complicação normativa.  

Mas o fisco conhece os pecados das empresas, que não aceitam a implantação de uma reforma tributária com foco na progressividade. O fisco sabe da esperteza que existe no topo do empresariado brasileiro. Ele sabe que essa turminha não quer pagar imposto de renda de jeito nenhum. E sendo assim, o jeito é continuar incrementando a regressividade e também criando regras insanas para mascarar a realidade atroz dos impostos que tornam o consumo inacessível aos pobres. Portanto, um viva à bagaceira!! E viva à corrupção!! E viva à esperteza!! E viva ao jeitinho brasileiro!! Curta e siga @doutorimposto. Outros 486 artigos estão disponíveis no site www.next.cnt.br como também está disponível o calendário de treinamentos ICMS.



































 

terça-feira, 17 de outubro de 2023

Atenção redobrada com o ICMS-ST


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio  dia   17 / 10 / 2023
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Numa entrevista concedida ao programa Roda Viva o economista Bernard Appy disse que o ICMS é o tributo mais complexo do mundo, ao passo que o ex-ministro da Fazenda, Maílson da Nóbrega, afirmou que a Substituição Tributária é a modalidade mais complexa do ICMS. Desse modo, somos atormentados pela complexidade da complexidade quando trabalhamos com a infinidade de produtos gravados com ICMS-ST. Esse fato nos obriga a tratar do assunto com a seriedade devida. Infelizmente, a grande massa de contribuintes ignora os efeitos nocivos do desconhecimento normativo quando compra e quando vende produtos dessa modalidade tributária. O erro mais comum está no despreparo para a tarefa de reanálise, uma vez que não somente código NCM e respectiva descrição esgotam os critérios de enquadramento, cabendo também, observar características do produto e atividade da empresa. Por exemplo, a lona plástica da posição 3920 de uso na construção está sujeita ao pagamento de ICMS-ST, mas a lona plástica da mesma posição 3920 específica para estufa não deve pagar ICMS-ST. Outro exemplo importante está na cobrança indevida de produtos enquadrados nos segmentos econômicos de autopeças e de materiais de construção, quando o adquirente atua no ramo comercial de refrigeração.

Outro detalhe fundamental está no bom uso da disposição contida no parágrafo sétimo da cláusula sétima do Convênio 142/2018, cujo poder é capaz de derrubar muitas cobranças indevidas (mas é preciso saber esgrimir). Eu, Reginaldo, consegui derrubar uma taxação de tubos de cobre; de 23,07% para 11% com base numa palavra contida na descrição do item 56 da Resolução 40/2015. Meses atrás, a Sefaz passou a rejeitar reanálises dos tubos de cobre. Há um caso ainda mais emblemático, onde consegui baixar de 69,51% para 11%. O produto em questão era um insumo utilizado no preparo de açaí frozen (NCM 21069029), onde a Sefaz enquadrou no item 24 do Anexo IIA do RICMSAM, cuja MVA era de 328%. O sucesso dessa reanálise se baseou no fato de que “preparado para fabricação de sorvete” é um produto pronto para uso, enquanto que o insumo em questão seria misturado com outros ingredientes. Curiosamente, a lei 6108/2022 acabou com essa MVA de 328%.

Tempos atrás, me deparei com uma situação curiosa. A empresa de produtos médico hospitalares comprou seringas que vieram com NCM inexistente na Resolução 37/2015, e que, por esse motivo, fui acionado para derrubar a cobrança de ICMS-ST. Quando bati o olho na NF eu desconfiei da classificação fiscal; abri a TIPI e mostrei para o funcionário da empresa que o NCM estava errado e que, portanto, a Sefaz acertou na cobrança por se orientar pela descrição do produto e não pelo NCM. Sugeri então que contactasse o fornecedor para regularização fiscal do NCM. 

Ao longo de muitos anos eu me deparei com situações mirabolantes envolvendo Substituição Tributária. Esse assunto é mais crítico nas empresas de autopeças, já que sofrem intensa retenção por parte dos seus fornecedores. Em visita a uma dessas empresas, me apresentaram uma nota fiscal de compra, em que identifiquei a falta do desconto ICMS. Consequentemente, houve prejuízo por causa da tributação majorada. E mesmo sem abatimento, havia apontamento do CST 30 e ainda anotação do Convênio 65/88 no campo “dados adicionais” da NF. Sendo assim, o fornecedor não pagou o ICMS próprio e nem o repassou ao destinatário. 

Muitos detalhes devem ser objeto de atenção redobrada, mas vou alertar o leitor para uma prática bastante comum e extremamente nociva ao adquirente amazonense. Trata-se da retenção de ICMS-ST sobre produtos que devem ser cobrados diretamente pela Sefaz amazonense. O grande risco está no ajustamento da MVA. Em julho retrasado, eu fiz esse alerta num treinamento “in company” ministrado numa empresa de materiais de construção. No dia seguinte me mostraram a NF 120381 (material elétrico) com retenção de ICMS-ST. Na conferência, descobri que o fornecedor paulista Demape utilizou nossa Resolução 40/2015 e, para piorar, ajustou a MVA, de 53,13% para 73,67%. Como resultado da lambança, o fornecedor cobrou R$ 30.120,63 quando o valor correto era de 22.133,24. Possivelmente, esse adquirente amargou prejuízos astronômicos ao logo de anos por não implementar uma gestão fiscal eficiente. Curta e siga @doutorimposto. Outros 486 artigos estão disponíveis no site www.next.cnt.br como também está disponível o calendário de treinamentos ICMS.

























terça-feira, 3 de outubro de 2023

O ESTRANGEIRO


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio  dia   3 / 10 / 2023 - A486
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Cerca de 20 anos atrás, imperava no Brasil a prática de subfaturamento, também conhecida por nota calçada, meia nota etc. A sonegação fiscal ocorria numa escala absurdamente grandiosa, dificultando assim o trabalho dos órgãos fiscalizadores. O advento da nota fiscal eletrônica provocou um choque violento no ambiente empresarial, levando a profundas modificações na gestão fiscal e na cultura corporativa como um todo. A partir dessa nova realidade, o fisco passou a enxergar as notas de entrada, e, por consequência, as saídas precisavam guardar coerência. Mas antes disso, o governo já tinha cercado as movimentações de cartão (débito/crédito). Desse modo, o empresário cauteloso estabeleceu procedimentos baseados nas compras e nas maquininhas de cartão. Daí que, por muito tempo, houve espaço para pequenas engenhosidades, já que ficou difícil comprar com meia nota. As manobras ficaram difíceis com a chegada do pix, uma vez que os recebimentos passaram a ser quase que totalmente rastreáveis. O cerco se fechou de vez a partir da regra de alinhamento das saídas com as entradas (códigos de produtos); isso permitiu o controle efetivo do estoque pela Sefaz amazonense. No final das contas, toda essa saga fiscalizatória consagrou a vitória acachapante do agente fazendário. 

Apesar do caótico ambiente normativo, o empresário vinha trabalhando arduamente para se ajustar às exigências legais impostas pelo projeto SPED. Ou seja, comprar sempre com nota cheia e declarar todas as vendas pix ou cartão, já que, aparentemente, o fisco controla tudo. Mas esse ajustamento considera uma normatização vigorando na completude do território nacional e com toda empresa sujeita à mesma legislação. 

Pois bem. 

Um fenômeno exótico veio bagunçar toda uma estrutura construída ao longo de duas décadas. 

O estrangeiro foi chegando, chegando, se estabelecendo, se expandido até se consolidar como o mais importante abastecedor de inúmeros produtos. Esse estrangeiro construiu grandes centrais de abastecimento e também se proliferou nos espaços varejistas, atingindo uma capilaridade espantosa. 

Uma análise superficial pode indicar benefícios ao consumidor, geração de riqueza e integração ao mercado global. Até aqui, tudo bem. O mercado deve ser aberto a competidores mais eficientes e o consumidor deve ser o maior beneficiado pela concorrência saudável. O problema é outro. E, talvez, esse problema causado pelo estrangeiro só é considerado problema porque mexe com um problemão interno muito grave. Possuímos o mais complexo e mais perverso sistema fisco tributário do planeta. E o estrangeiro simplesmente deu um chute na bunda do nosso agente fazendário que repercutiu no traseiro do empresário brasileiro. 

Como dito anteriormente, a pressão do SPED levou à prática da nota cheia pelo temor fiscalizatório. Sendo assim, e com fornecedores emitindo nota certinha, o mercado adquiriu certo equilíbrio nas condições de concorrência. Mas o estrangeiro não é brasileiro. E pra piorar, esse estrangeiro tem as costas quentes. Ele sabe que se for alvo da mesma pressão sofrida pelos brasileiros, o gigante manufatureiro pode reagir negativamente e assim criar uma tensão diplomática perigosa. Por isso, os produtos entram no Brasil com preço declarado infinitamente menor que o real. Na outra ponta, o varejista estrangeiro não tem mínima preocupação de emitir nota ou de cumprir norma fiscal nenhuma. E também, as grandes centrais abastecedoras promovem ações rocambolescas nas formalidades legais de distribuição. 

O estrangeiro utiliza pacotes de empresas do Simples para vender até o estouro do limite. Os valores declarados correspondem a 10% do real. Também, são lançados nas notas fiscais, códigos aleatórios de NCM, CST, CFOP etc. As formalidades tributárias são bagunçadas. Lembro duma situação estranha, em que o fornecedor do Simples cobrou IPI do adquirente (uma coisa sem pé nem cabeça). Pra piorar, esse estrangeiro manda o comprador efetuar pagamentos para o fornecedor do fornecedor ou para pessoas estranhas etc. (zorra total).

Agora vamos ao Projeto SPED. 

Como fazer o registro fiscal das notas de entrada? Como escapar do rastreamento financeiro das movimentações “por fora”? Como alinhar os códigos de entrada com as saídas? Como escapar duma ação fiscalizatória se nada bate com nada? 

Os contadores costumam alertar para os perigos imediatos e futuros de tantos rebuliços, e sempre sugerem cortar relações com o estrangeiro. Mas o comerciante sempre diz que fugir do estrangeiro é a mesma coisa que fechar as portas, uma vez que não conseguem produtos bons de venda com outra fonte. Tanta confusão fez muita gente pensar que o estrangeiro está certíssimo e por isso mesmo, as práticas rocambolescas foram copiadas por quem antes andava certinho num ambiente tortuoso. E nesse vendaval todo, Sefaz e Receita Federal fazem vista grossa para o estrangeiro, ao mesmo tempo que pressionam e quebram o comerciante brasileiro com o peso das suas imposições acachapantes. 

Não faz muito tempo, determinada empresa comercial era sinônimo de gestão avançada. O dono investiu muito dinheiro em sistemas informatizados, além de controles precisos e diários para cumprimento exato da legislação tributária. A coisa ia muito bem até o estrangeiro chegar e esculhambar tudo. A pressão foi tão grande que hoje, esse empresário adota as mesmas práticas do estrangeiro, com muitas empresas do Simples em nome de terceiros etc., etc., etc. Esse empresário disse pra mim que essa foi a única forma de sobreviver, já que o agente fazendário só ataca os brasileiros. Curta e siga @doutorimposto. Outros 485 artigos estão disponíveis no site www.next.cnt.br como também está disponível o calendário de treinamentos ICMS.




























terça-feira, 15 de agosto de 2023

DEVOLUÇÃO DOS INCENTIVOS FISCAIS


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio  dia   15 / 8 / 2023 - A485
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Há um número emblemático bem conhecido do comerciante manauara, que é o famoso 16,25. Trata-se do percentual de abatimento solicitado ao fornecedor localizado no sul do país. Muita gente não sabe que tal benefício é resultado das desonerações de ICMS, Pis e Cofins, previstas no Convênio 65/88 e na Lei 10996/2004. Há também um grande desconhecimento das particularidades normativas presentes nesses dispositivos legais. Por exemplo, é importante verificar se o produto é nacional ou estrangeiro e se é mercadoria ou ativo fixo ou material de consumo etc. Outra questão polêmica está na operacionalização dessas desonerações, já que o parágrafo segundo da cláusula primeira do convenio 65 cita abatimento e o artigo segundo da lei 10996 menciona alíquota zero. Em termos práticos, isso significa que o fornecedor deve retirar Pis/Cofins da formação de preço, o que reduz substancialmente o valor do produto e até mesmo o próprio ICMS, que permanece na dita formação de preço para que posteriormente seja abatido.

O grande desafio está em convencer o fornecedor a modificar o sistema de emissão de nota fiscal. Desse modo, a maioria não mexe na formação de preço e operacionaliza as desonerações como desconto. Ocorre, que o procedimento correto torna o produto bem mais barato. Mas, curiosamente, já tive aluno empresário em sala de aula que falou em alto e bom tom que prefere o “modo errado”. Ou seja, esse aluno quer enxergar o desconto de 16,25 ou 21,25 ou 13,25 ou 10,65 ou 15,65 ou 7,65 por cento. Noutras palavras, se o fornecedor aplicar o “método correto”, é possível enxergar somente os descontos de 4, 7 ou 12 por cento. O comprador, então, deve comparar o preço de tabela com o destacado na nota fiscal para averiguar a retirada de Pis/Cofins. E isso exige boa dose de perícia técnica. Inclusive, na nossa aula, fazemos simulações matemáticas, considerando diversas práticas de quem vende para a ZFM. Também, analisamos as legislações pertinentes nos seus detalhes mais significativos.

Esse assunto é muito sério e deveria ser compreendido na sua integridade pelas pessoas que trabalham no setor de compras. Mas, lamentavelmente, pouquíssimos têm conhecimento e assim deixam de usufruir os benefícios presentes na legislação. E ainda tem outro assunto que os compradores precisam dominar, que é a substituição tributária do ICMS. Ocorre que, estranhamente, as empresas rejeitam qualquer ideia de capacitação profissional, preferindo assim as confusões e os prejuízos tributários.

Na medida em que os tributos são retirados do preço, o produto deve ser consumido na área incentivada, que é diferente para o ICMS, para Pis/Cofins e para o IPI. Desse modo, o desvio e a consequente inobservância do propósito legal geram a obrigação de devolver o tributo ao ente fazendário competente. Por exemplo, um gigante varejista regional, todo mês, faz diversas devoluções tributárias para a Receita Federal e para a Sefaz de quase todo o Brasil. Mas isso só é possível pela utilização de tecnologia avançada (R3) e altíssima gestão fiscal, onde o sistema informatizado grava em cada produto que entra no estoque, as informações rateadas sobre desonerações de ICMS, Pis, Cofins e IPI; e também, crédito ICMS da operação própria ou pagos via substituição tributária etc. Então, e como são feitas vendas para quase todo o país e para o interior do Amazonas, o sistema emite listagem de tudo que deve ser devolvido. Essa prática, apesar de obrigatória, é incomum; principalmente, devolução de ICMS, que é raríssima.

A imensa complexidade operacional para identificar tais devoluções leva quase todo mundo a não devolver nada. Inclusive, esse assunto já suscitou muitas discussões nos entes governamentais, onde até se desenhou mecanismos de identificação e punição aos infratores. Ocorre que, se o fisco tratar isso a ferro e fogo, a economia do Amazonas vai travar completamente, uma vez que Manaus é a fonte de abastecimento do estado inteiro. E se toda empresa que não devolver os incentivos for multada, as vendas para fora de Manaus seriam arriscadas demais, levando a uma crise de abastecimento.

Na verdade, essa situação rocambolesca mostra bem a incompetência dos funcionários públicos que vivem criando normatizações avacalhadas e impraticáveis. Somos governados pelos piores burocratas do mundo e por caraminholas normativas totalmente desconectadas da realidade social. Os burocratas fiscais se reúnem em salas refrigeradas para desfiar invencionices contaminadas de interesses espúrios que resultaram no nosso bizarro contencioso fiscal. O legislador do ar condicionado nunca dirigiu um caminhão, nunca plantou, nunca colheu, nunca construiu, nunca fabricou, nunca vendeu, nunca nada. Então, é essa figura estéril que regulamenta a vida daqueles que verdadeiramente fazem acontecer. Como resultado, vivemos num país esculhambado dos pés à cabeça. Curta e siga @doutorimposto. Outros 484 artigos estão disponíveis no site www.next.cnt.br como também está disponível o calendário de treinamentos ICMS.
































terça-feira, 1 de agosto de 2023

Shopee escancara o nosso avacalhado sistema tributário


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio  dia   1 / 8 / 2023 - A484
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O fato de pagarmos a mais perversa tributação do consumo nos faz imaginar que temos um governo tirânico e opressor. Na verdade, os nossos agentes públicos são covardes, incompetentes e atabalhoados; mas também são malandros e embusteiros. A grande arte que o político deve esgrimir com maestria está na dissimulação e na cara de pau. Por outro lado, o povão é um dos mais tapados do mundo. Assim, temos a cobra cega contra o sapo aleijado. Se o brasileiro tivesse um pouquinho de discernimento e de bom senso, os políticos estariam desempregados. Os funcionários públicos fantasmas ou de salários astronômicos ou incompetentes ou apadrinhados devem agradecer a Deus todos os dias pela passividade dum povo engolidor de sapo que ainda se mata de trabalhar pra sustentar vagabundo e corrupto.

Com a corrupção pulsando freneticamente no setor público, fica claro que tudo é negociado e tudo está à venda; principalmente o legislador (a prova está no contencioso de R$5 trilhões). Por consequência, o nosso sistema tributário é um festival de esperteza, onde os mais fortes jogam o peso nas costas dos pequenos. E para comprovar a epidemia de negociatas, basta ir atrás das isenções fiscais e então descobrir que muitos beneficiários são oligarcas entranhados no poder político. O grande desafio está na abertura da caixa preta que permanece lacrada no mais profundo dos oceanos. Muitos vão dizer que vivemos numa democracia protegida por instituições de controle. O problema é que tais instituições são públicas. Precisamos entender uma coisa: O setor público é um corpo só. Desse modo, a mão não vai ferir a perna do mesmo corpo. Como certa vez me disse um conselheiro do tribunal de contas, “o poder se protege”.

Voltando à questão da malandragem, pagamos a mais perversa tributação do consumo por conta dum mecanismo chamado de “imposto por dentro”, que obriga o comerciante a embutir os tributos no produto de forma que não seja reconhecido pelo consumidor. A Sefaz, por exemplo, pode mandar prender o comerciante que pagar ICMS sobre o preço do produto sem antes esconder esse mesmo ICMS dentro do produto. Tal procedimento configura crime contra a ordem tributária por violação do parágrafo 1 do artigo 13 do RICMS/AM. Além de inventar esse mecanismo diabólico para enganar o consumidor, o funcionário público promove uma campanha difamatória que culpa a ganância do comerciante pela alta dos preços. Desse modo, os impostos em nada pesam no bolso do consumidor. Inclusive, a primeira dama fez uma declaração nesse sentido. E outras autoridades também vivem dizendo que imposto e preço não têm nada a ver um com o outro. É assim que se descobre o nível de vagabundagem daqueles que estão no setor público vivendo às nossas custas.

Nos últimos tempos, dois eventos curiosos tomaram conta do noticiário. Um deles tem a ver com a polêmica classificação de energia elétrica, combustível e telefone na mesma categoria de joias e armas de fogo. Na verdade, essa discussão é bem antiga, mas a pressão do Bolsonaro obrigou o agente fazendário a rever o assunto. Isso mostrou que o agente público fica medroso quando acuado. Mas então, entra em cena a velha malandragem que criou um clima de insegurança financeira, levando os governadores a jogar o ICMS lá pra cima. E agora, com o ICMS majorado, os malandros querem a volta da antiga carga confiscatória da energia, telefone e combustível. A prova de que os deputados amazonenses são operados por controle remoto está na Lei 6108/2022, em que ninguém viu os buracos no item 42 do Anexo XX e no item 49 do Anexo XI. Ou seja, a montoeira de funcionários da Sefaz mais os trocentos assessores dos deputados não enxergaram esses dois produtos sem MVA. E mesmo assim, e sem base legal, a Sefaz passou uns cinco meses taxando esses produtos ilegalmente. Na verdade, nem a Sefaz, nem os deputados nem funcionário público nenhum liga pra legalidade. Vivemos num ambiente de total avacalhação porque o povo é avacalhado.

Outro evento curioso tem como pano de fundo a reclamação dos clientes da Shopee, AliExpress, Shein etc., com a taxação dos produtos comprados pela internet. Ou seja, produtos baratinhos e livres do Custo Brasil revoltou o comerciante brasileiro que exigiu equidade fiscal. Começou então o chafurdo dos nossos governantes, que uma hora faz dum jeito, depois muda de ideia; e vai lá e vem cá; puxa, encolhe e por fim, inicia agora em agosto mais um sistema taxativo. O motivo de tanto rebuliço normativo está na busca por um modelo que possa aparentar uma coisa, mas ser outra totalmente diferente. Obviamente, que exercício de contorcionismo é uma especialidade dos agentes fazendários. E para acalmar o comerciante reclamão, o governo inventou várias taxações. E para acalmar o consumidor revoltado, o governo faz vista grossa sobre as manobras dos estrangeiros que declaram valores infinitamente menores que reduzem drasticamente as taxações. Pra se ter ideia, um equipamento de informática que custa R$500 é declarado por US$13 (youtu.be/UecrN29XG1c)

Essa confusão toda da Shopee nos faz perguntar por que não acontece a mesma revolta com os produtos fabricados no Brasil, em que pesam os impostos, a burocracia, a incompetência governamental, a roubalheira, a corrução, a bandidagem etc. Essa confusão da Shopee nos faz questionar se de fato os futuros IBS, CBS e IS serão mesmo cobrados “por fora”. Eu aposto que essa possibilidade apavora o fisco, como também tira o sono dos ricaços que não pagam imposto de renda. Porque, no momento em que o consumidor ver o tamanho da facada, ele vai incendiar o país. E só depois duma revolução violenta é que o governo será obrigado a implantar um sistema progressivo de tributação. Curta e siga @doutorimposto. Outros 483 artigos estão disponíveis no site www.next.cnt.br como também está disponível o calendário de treinamentos ICMS.













































terça-feira, 11 de julho de 2023

A REFORMA TRIBUTÁRIA E SUAS INDAGAÇÕES


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio  dia   11 / 7 / 2023 - A483
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Nas produções da Netflix, Trapped (islandesa) e Schlafende Hunde (alemã), é possível observar a vida modesta do cidadão mediano, com casas simples, mobília barata, carros feiosos etc. Curiosamente, a série Schlafende Hunde mostra uma Alemanha com jeitão de terceiro mundo. Não é perceptível nessas produções europeias o exagero consumista dos filmes americanos, com lares aconchegantes e carrões confortáveis. Na vida real, os donos desses luxos americanos são pessoas comuns que exercem funções operacionais nos seus locais de trabalho. Ou seja, pra viver bem nos EUA, não é preciso ser diretor, empresário ou celebridade pública. Tanto é, que a faxineira americana roda num carro superior ao do engenheiro brasileiro. Então, qual a razão desse fenômeno social? É possível que a resposta esteja na tributação do consumo. 


O modelo IVA adotado na Europa é bem mais complexo e oneroso que o IVV americano. Com isso, o consumo nos EUA é intenso pela facilidade de acesso. Pesa também nessa balança a simplicidade burocrática americana que acaba enxugando os custos empresariais e ao mesmo tempo facilitando o controle governamental. Por outro lado, o IVA europeu impacta tripla e negativamente por encarecer tanto o produto quanto o custo empresarial e ainda o custo do controle governamental. 


Todo o gigantesco esforço da nossa reforma tributária foi concentrado exatamente num modelo IVA mais complexo que o vigente na Europa. Isso significa que os efeitos negativos serão potencializados no Brasil por manter restrições ainda maiores aos bens de consumo. Devido a tantos remendos na proposta aprovada na Câmara Federal, os tais IBS e CBS vão ficar parecidos com ICMS, Pis, Cofins e IPI. Na verdade, vamos trocar seis por meia dúzia se persistir o hábito de alterações compulsivas nas regras do jogo. E para piorar, a simplicidade atual do ISS vai acabar quando se tornar “não cumulativo”. Por exemplo, o contencioso enlouquecido envolvendo Pis/Cofins, assim como seu indecifrável gerenciamento é decorrente da mudança para a “não cumulatividade”. Isto é, na época que era cumulativo, Pis/Cofins tinha a simplicidade operacional do ISS. Por isso, as empresas de serviços estão prestes a abrir as portas do inferno burocrático. A confusão em torno dos “créditos” vai potencializar o nosso monumental e doentio contencioso, repercutindo na explosão dos preços dos serviços, quebradeira generalizada e perdas de emprego. Os políticos aprovaram uma coisa sem noção nenhuma dos desdobramentos no cotidiano das empresas e do cidadão comum. E aqueles que pagarão o pato têm muitas dúvidas, tais quais:


De cara, todo mundo quer saber da alíquota. E quanto à normatização, cada estado e cada município terá plena autonomia para interferir na legislação do IBS? Se isso for confirmado, nós continuaremos atolados na confusão normativa e nas tensões fiscais, já que cada ente vai fazer o diabo com propostas de modificações ensandecidas, de modo parecido com o modelo atual. Uma reforma verdadeira deveria impedir a comichão inquietante de mexer todo dia nas regras legais. 


Sendo tributos “por fora”, IBS e CBS serão destacados na nota fiscal do mesmo modo que o IPI? Nas etiquetas de preço e nas notas fiscais, produto e imposto serão informados separadamente? Após o processo de transição, vão continuar os regimes de substituição tributária, antecipação por difal, diferimento, redução de base, pautas fiscais etc.? Os estados vão ter autonomia para propor a criação e majoração de alíquotas, além de novas modalidades de IBS e também novos enquadramentos? Em suma, governadores e prefeitos vão poder chafurdar a legislação, ou haverá algum freio para a comichão modificativa? 


Como ficarão os destaques tributários no período da transição de sete anos? Ou seja, na nota fiscal haverá IPI, ICMS, PIS, COFINS, CBS e IBS, além de retenção de substituição tributária? Nesse intervalo, IBS e CBS serão mais dois tributos a se juntarem com os atualmente em vigor? Será mais carga de controle e mais custo burocrático para empresas e órgãos fazendários? E os contadores, vão trabalhar em dobro? Será que vão criar módulos novos no SPED? Uma coisa é certa: O primeiro ano da transição vai testar a capacidade de resistência do contribuinte brasileiro e muita gente vai amaldiçoar o legislador. 


Um detalhe perturbador: O legislador só traça linhas gerais da reforma tributária, enquanto a operacionalização é feita por técnicos fazendários não eleitos pelo povo, os quais, costumeiramente, distorcem a intenção do propósito inicial. Isso é materializado por meio de normas infralegais não discutidas no Poder Legislativo. As agências fazendárias são histórica e comprovadamente estabanadas no momento de implantação de novas regras tributárias. Basta lembrar do eSocial, que provocou um rebuliço nos ambientes contábeis e empresariais.


Uma provável armadilha nos espera durante a transição. Nesse período, haverá dois sistemas tributários atuando em paralelo. Na proposta reformativa, os velhos tributos irão diminuindo na mesma proporção que os novos serão aumentados. O que preocupa muita gente é o seguinte: Os estados, sentindo o gostinho de mais imposto, poderão incrementar a despesa pública e assim irão brigar no STF para aumentar os novos tributos sem diminuir os antigos. E o desfecho desse tipo de movimento, todo mundo já conhece. O mundo judiciário sempre decide em prol do fisco quando o equilíbrio das contas públicas é ameaçado. 


Um fato lamentável do nosso sistema está na poderosa indústria do contencioso que se agigantou nas últimas décadas, alimentada pela lama da burocracia. Os capitães dessa indústria movimentam bilhões de reais e assim podem manobrar autoridades para garantir o status quo. Com esse povo das sombras atuando sem cessar, fica evidente que o texto legal está contaminado por vícios de forma. Na verdade, quanto mais nos aprofundamos nessa história toda de reforma tributária, mais descobrimos que não há intenções altruístas e heroicas pulsando do coração do legislador. E o motivo reside nas desconfianças de que o grande propósito é a taxação estratosférica dos serviços. Em jogo também, pesam as vaidades e os dividendos políticos daqueles que se apresentam como pais da criança. Por sua vez, a população tapada vai acabar engolindo o discurso embusteiro de que tudo melhorou. 


A simplificação do nosso modelo hiper burocrático tem o poder de enxugar as estruturas de controle, tanto das empresas quanto das agências fazendárias. Se a reforma é tudo que estão dizendo, então, o que acontecerá com o monte de gente entulhada nos órgãos de controle governamental? Outra coisa: A confusão burocrática é fonte jorrante de propinas para corruptos de diversos quadrantes, uma vez que a indecifrável e subjetiva legislação abre caminhos para achaques e pressões de agentes públicos. Pelo jeito, a indústria da corrupção será profundamente impactada pela simplificação do novo modelo tributário. Sendo assim, será que esses corruptos participaram ativamente da construção da reforma aprovada na Câmara? 


O instituto do cashback previsto na reforma tributária evidencia a forte intenção das autoridades brasileiras para cristalizar nosso modelo tributário regressivo. Causa estranheza, a pressa na reforma do modelo regressivo e total morosidade nos impostos sobre renda e patrimônio. Isso é sinal de que os ricos continuarão não pagando imposto da mesma forma que faz os pobres. Estudos da professora Maria Helena Zockun (USP), mostram que os altíssimos rendimentos brasileiros pagam apenas 7% (IR), enquanto a classe média paga 27,5%. Ou seja, um trabalhador que ganha R$ 5.000 paga 27,5% de imposto de renda e mais 14% de previdência. Já, o ganho financeiro de R$ 5 milhões paga somente 15%. Muitos acenos indicam que esse modelo vai permanecer. Não há mínimo sinal no horizonte de que teremos uma progressividade semelhante à dos países de primeiro mundo. Logo, a tática do governo para aliviar a pressão sobre os males da regressividade está justamente no tal cashback. Ou seja, os beneficiários do Bolsa Família vão receber uns trocados e assim o Brasil deixará de ser injusto com os pobres. Isso significa que todo cidadão fora do Bolsa Família será considerado rico. Além do mais, o governo vai meter os pés pelas mãos no momento de operacionalizar esse dito cashback. Teremos notícias diárias de escândalos cabeludos sobre o assunto. 


O que causa revolta é o fato de que todo o sofrimento oriundo das ações governamentais sempre fica restrito ao trabalhador do setor privado. O agente provocador das desgraças sabe que seu alto salário e seus privilégios estarão garantidos, não importando a chuva de pragas que cai sobre o povão espoliado. E como o pato é sempre pago pelo setor privado, os políticos exageram no pacote de maldades. 


E pra finalizar, a intensa discussão da reforma tributária suscitou também a urgência da reforma administrativa, uma vez que as duas são siamesas xifópagas. Isso significa que não adiantará consertar um lado se o outro permanecer deformado. Inclusive, e como é notório, a perversidade do sistema tributário é consequência direta dos desmandos administrativos vigentes no poder público. A mulher que corrigiu os cabelos feios, percebeu que tinha que cuidar também das unhas, da pele, da postura, do sorriso etc. Portanto, se o perfil dos governantes continuar o mesmo, é certo que todo o bom propósito da reforma tributária será destruído em pouco tempo. Curta e siga @doutorimposto. Outros 482 artigos estão disponíveis no site www.next.cnt.br como também está disponível o calendário de treinamentos ICMS.