terça-feira, 18 de dezembro de 2012

VISÃO PANORÂMICA DO PATRIMÔNIO

Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 18/12/2012 - A105
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Atualmente, fala-se muito sobre eficiência gerencial, sendo que as empresas cada vez se desdobram na incansável busca de níveis mais elevados de qualidade dos seus processos operacionais. A maioria dos gestores concentra sua atenção na suposta lucratividade e na liquidez, deixando de lado o aspecto patrimonial do negócio. Essa visão patrimonial é primorosamente fornecida pela contabilidade. Ao contrário do que muitos pensam, controle patrimonial não está relacionado somente ao Ativo Imobilizado, visto que patrimônio é tudo aquilo mensurável monetariamente, tais quais edificações, estoque, valores a receber de clientes, créditos tributários, saldo positivo de bancos, aplicações financeiras etc. Outro fato curioso que ocorre nos gabinetes de diretoria é a forma desconexa de análise dos eventos econômicos e financeiros. Ou seja, verifica-se de um lado o relatório de venda e do outro lado o relatório de contas a pagar. Outros tipos de relatórios até podem ser verificados, mas frequentemente fica no ar aquela sensação da falta de algo muito importante; da falta “daquela” informação estratégica. Fica aquele clima de que alguma coisa está oculta.


Ao corpo de uma pessoa não pode faltar nenhum pedaço, por menor que seja. A amputação do dedo mínimo é um inequívoco sinal de deformidade. Assim é a estrutura dos demonstrativos contábeis. A extirpação de um determinado valor do Balanço Patrimonial ou da Demonstração de Resultados evidencia de imediato uma deformidade aritmética. Para se modificar a estrutura dos demonstrativos contábeis é preciso interferir no conjunto de registros e rearranjar a forma de como estão dispostos. Tal procedimento exige habilidade profissional para que o encadeamento das conexões contábeis seja preservado, mas sempre lembrando que tais registros são reflexos fidedignos de fatos suportados por evidências documentais. Alguns chamam a isto de engenharia contábil. Não deixa de ser, visto que uma estrutura contábil é a construção formada de elementos que se harmonizam e se conectam fortemente uns aos outros. Portanto, nenhuma fraude contábil é perfeita o suficiente que possa passar despercebida pela análise de uma equipe de peritos contábeis de altíssimo nível técnico. E isso se deve ao inquebrantável método das partidas dobradas, que é a base da ciência contábil.

A contabilidade é, portanto, um instrumento poderoso de controle e de amarração num só bloco de todos os fatos patrimoniais que ocorrem numa empresa. O Balanço Patrimonial mostra, de um lado, os bens e direitos. E do outro lado, as dívidas para com terceiros que financiam as operações da empresa, além do resultado do confronto desses dois grandes conjuntos de informações, que é representado pelo patrimônio líquido. Por isso mesmo é que o alvo da ação contábil é o patrimônio e suas mutações num determinado período de tempo. Ou seja, além da receita e além dos custos, o que importa é verificar se o patrimônio está se expandindo ou definhando. Assim, a atenção do sócio deve ser voltada primeiramente para a preservação do seu patrimônio e como o mesmo está sendo administrado. É importante também que o sócio tenha acesso ao detalhamento da capacidade do patrimônio de continuar gerando benefícios financeiros no futuro. E, além disso, saiba ainda do limite previsto de exaustão e tenha conhecimento dos programas de manutenção da capacidade produtiva. O sócio que recebe informações do administrador, muitas vezes somente de receitas, corre sério risco de ver seu patrimônio desaparecer da noite para o dia. Da mesma forma, a falta de controle e de acompanhamento dos fenômenos patrimoniais bloqueia a visão do administrador quanto a dilapidação dos bens da empresa que fortuitamente possa está acontecendo debaixo das suas barbas.

Portanto, faz-se mister dispor de um sistema de contabilidade gerencial bem estruturado e voltado para o controle e análise dos fatos patrimoniais, de forma que o administrador consiga sentir na ponta do dedo o pulsar da organização. Para concretizar tal projeto o contador deve estar livre das correntes da Receita Federal. Ou seja, é preciso desenvolver uma contabilidade que produza informações úteis para o administrador e para as demais partes interessadas, de forma que as firulas e conflitos técnicos conceituais sejam desprezados. O foco deve estar concentrado na utilidade da informação, nem que para isso seja necessário construir uma contabilidade paralela. E dependendo do porte da empresa e dos riscos decorrentes da fragilidade do controle interno, é extremamente vantajosa a implantação de um setor voltado exclusivamente para a contabilidade gerencial. Esse formato organizacional é comum em ambientes altamente pressionados por disputas societárias ou quando há elevado grau de dispersão geográfica das unidades de negócios. Nesse formato, uma equipe de profissionais trabalha unicamente no aspecto técnico da contabilidade, sendo que outra equipe se dedica aos assuntos tributários. Para alguns, manter duas equipes voltadas aparentemente para a mesma função pode parecer um desperdício de dinheiro, mas pior mesmo é arcar com imensos prejuízos pela pura falta de controle. Aqui mesmo na nossa região uma grande empresa só percebeu que iria morrer quando já estava caindo no abismo. Uma contabilidade gerencial precisa e competente detectaria o mais leve sinal de enfermidade e permitiria assim uma rápida e localizada neutralização. Talvez alguém tenha achado absurda a ideia de gastar dinheiro com uma estrutura de contabilidade gerencial de alto nível.


terça-feira, 11 de dezembro de 2012

O SUJO E O MAL LAVADO

Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 11/12/2012 - A104
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A Lei n° 4.729/1965 tipifica o crime de sonegação fiscal, assim como estabelece penalidade de prisão para os seus infratores. O mesmo tipo de punição é previsto às pessoas enquadradas na Lei n° 8.137/1995, que define os crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo. A mesma legislação que fixa é a mesma que abranda e até inviabiliza o seu efetivo cumprimento. A análise de tantos dispositivos legais relacionados a esse assunto leva o sonegador contumaz a deduzir que vale a pena continuar sonegando, visto que a possibilidade de passar dez anos numa prisão simplesmente não existe de forma nenhuma. Então, sonegar e sonegar muito; estufar o colchão de dinheiro à custa dos impostos sonegados é um excelente investimento. Se por um golpe do destino ou em caso de remotíssima possibilidade o infrator for alvo de um processo implacável da Justiça, a consequência final, depois de vinte anos de trâmite processual nas infindáveis varas e depois de infinitos recursos que a lei ampara, será a distribuição de míseras cestas básicas aos miseráveis esquecidos nos esgotos da vida. Então, pra quê se preocupar? Pelo milagre de Deus temos legisladores maravilhosos, de coração condescendente, que de forma alguma toleram a ideia de mandar um sonegador para a prisão. Ou seja, toda a maçaroca de legislações conflitantes acaba dizendo de forma cristalina que no nosso país o crime compensa, sim. E a lei está aí, sempre pronta para abrigar o sonegador sob suas aconchegantes asas.

Vez por outra entra em cartaz a ópera bufa “operação isso” ou então “operação aquilo”, sempre cercada de estardalhaço espalhafatoso pelos vários canais midiáticos. Essa estratégia é sempre utilizada toda vez que o povo começa a se saturar da bandidagem entranhada até o osso da nação. Sendo assim, o alvoroço inicial vai aos poucos sendo substituído por uma gradual e densa nuvem de amnésia que por fim bloqueia totalmente a luz da verdade. O Arnaldo Jabor disse dias atrás que a corrupção brasileira não é um fenômeno localizado aqui e ali (trilhões de localizações). A corrupção é um sistema. É como se houvesse um país por cima do outro. É como se o sangue das veias do Brasil já tivesse sido integralmente substituído pela corrupção. É como se a alma do povo brasileiro já tivesse sido integralmente consumida pela corrupção.

Em ambas as faces da mesma moeda figuram o sonegador e o corrupto. O primeiro sonega sob o pretexto de que o dinheiro entregue ao Fisco escorre direto para o esgoto da corrupção. Já o segundo acusa o sonegador de ser responsável pela falta de investimento nos setores-chave da economia. Entre esses dois protagonistas figuram os apagados coadjuvantes que se empenham na promoção de campanhas contra a sonegação fiscal. Na realidade, pode se observar uma aura de constrangimento nessas campanhas, visto ser difícil incutir na cabeça de alguém o belíssimo ideal de responsabilidade social quando todos sabem que o dinheiro dos impostos só serve mesmo para sustentar um sistema corrupto extremamente capilarizado. E o pior de tudo é que por mais que nos esforcemos, não conseguimos capturar um mínimo sinal de ação efetiva de combate à corrupção. Assim, toda proposta pretensamente séria de combate à corrupção chega aos nossos ouvidos tão contaminada de demagogia, que a orelha fica repleta de brotoejas. Pode até soar injusto e leviano, mas é muito, muito difícil olhar para um político sem ver nele um corrupto. É difícil, mesmo!!

Diante dessa tragédia social, fica difícil para um juiz condenar exemplarmente o sonegador, visto o magistrado ter plena consciência que de uma forma ou de outra o dinheiro não iria mesmo ser revertido em benefícios para a sociedade. Ou seja, o dinheiro retido no bolso do sonegador iria para o bolso do corrupto se o crime de sonegação não tivesse acontecido. Agora, imagine o tremendo pesar no peito de quem nunca sonegou ao assistir todos os dias na televisão uma infindável rodada de espetáculos escandalosos de corrupção que sempre, sempre terminam em pizza. Ou seja, aquele terno italiano do depoente da CPI foi comprado com o dinheiro que poderia ter sido utilizado para presentear o filho com um curso de inglês no exterior. Aquela mansão do político pilantra foi comprada com o dinheiro que faliu a empresa pagadora dos mais de 80 diferentes tipos de tributos. A plástica da supermodelo esposa do investigado fulano de tal foi paga com o dinheiro que faltou no posto de saúde. Imagine está mergulhado na pobreza por ter sido um cidadão exemplar enquanto o sonegador e o corrupto ostentam riqueza e depravação. Assim, a conclusão gritantemente óbvia é que a redução da sonegação só será possível com a redução da corrupção. A mesma investida implacável no combate à sonegação fiscal via SPED deveria ser acompanhada de igual empenho na efetivação de normas eficazes de combate à corrupção. As duas coisas são ambas as faces da mesma moeda.


terça-feira, 4 de dezembro de 2012

NIVELAMENTO CONTRIBUTIVO TRIBUTÁRIO

Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 04/12/2012 - A103
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Sabemos todos nós que a substituição tributária do ICMS é uma das maiores perversidades da nossa estapafúrdia e insana legislação tributária. Mas existe algo bem mais terrível, que é o ambiente convulsivo e caótico dos controles fiscais que acaba penalizando os pequenos e beneficiando os grandes contribuintes. É como se as normatizações fiscais fossem um ardiloso labirinto cujo mapa só é acessível aos advogados superstar e aos políticos que constroem essas arapucas tributárias. Os pequenos, coitados!! Esses se enrolam de um jeito que terminam perdendo os cabelos e o patrimônio; consequência do desequilíbrio contributivo tributário entre os competidores. Os tributos representam a maior parcela do custo das empresas. Tanto, que o governo gostaria de abolir o uso da Demonstração do Valor Adicionado (DVA), justamente porque esse demonstrativo escancara o peso esmagador dos tributos que sufoca a nossa economia e compromete seriamente o nível de competitividade das empresas brasileiras frente ao comércio internacional. Seria de grande utilidade a adoção generalizada da DVA, visto que ela mostra claramente quem abocanha cada pedaço da riqueza produzida num determinado período.

No momento, o grande dilema shakespeariano é ser ou não ser 100% nota fiscal. Será que dá para capar 80%? Não. É muito arriscado porque o Fisco tem todas as notas de compra. E o fornecedor? Esse, não trabalha mais com meia nota. Então estamos ferrados!! Será que dá para capar 50%? Ainda não, porque a SEFAZ analisa eletronicamente a relação compra, venda, recolhimento de tributos.  E 20%? Humm!!. É, se fizer direitinho... Mas fulano faz isso, sicrano faz aquilo, beltrano tem uma máquina diferente no canto da loja etc. Todo esse pessoal pode até está pintando e bordando, mas a bomba está armada e basta o Fisco apertar o botão para a coisa explodir. Mas e o tal que possui 500 lojas e só paga o que quer? Bem, esse é um caso especial, uma exceção, visto que o dono possui todo um aparato estratégico envolvendo conexões políticas que garante a sustentabilidade das operações. Pois é. Esse é o retrato do Brasil. Competir nesse mercado de extremos é um desafio para empreendedores de fibra e de sangue frio. Quem decide se organizar e pagar tudo direitinho logo descobre o grande papel de idiota que está fazendo, principalmente quando vê o dinheirão escorrendo pelo ralo enquanto o saldo negativo do banco se aproxima da estratosfera. Problema maior não é tanto pagar. O problema mesmo é ver seu cliente saindo da loja para comprar no vizinho que não agregou os tributos ao custo da mercadoria, sendo que o governo não faz absolutamente nada de prático para estabelecer um sistema tributário justo e compreensível aos seres humanos normais.

Apesar de tantas maluquices normativas envolvendo as regras de cálculo da substituição tributária de ICMS, uma modificação na legislação que garantisse o mínimo de isonomia na sua aplicabilidade seria muito bem vinda. Mas teria que ser algo sério; algo que impedisse a continuidade dos esquemas de contribuintes entranhados no sistema nervoso da SEFAZ. Dolorosamente, somos obrigados a admitir que seriedade é uma palavra indeglutível para as entidades fazendárias. Se toda a profusão de modalidades de cobrança de ICMS fosse substituída pela antecipação definitiva do tributo incidente sobre as compras, possivelmente conseguiríamos com isso equilibrar o custo tributário entre os competidores de um mesmo mercado. E também o empresário sofreria um menor impacto do custo tributário nas suas operações. Na realidade, o efeito seria mais psicológico do que financeiro. Nessa modalidade de cobrança antecipada aqui proposta, o tributo já faria parte do preço da aquisição da mercadoria. O mecanismo mais adequado e menos perturbador é o tributo já vir destacado na nota fiscal, como acontece com a substituição tributária convênio/protocolo. Causa muito menos perturbação pagar logo tudo de uma vez do que pagar a mercadoria para o fornecedor e depois pagar o ICMS Antecipação Definitiva para a SEFAZ. Para facilitar o controle eletrônico da arrecadação, as entidades fazendárias bem que poderiam substituir as atuais fórmulas mirabolantes de cálculo por algo simples e direto.

O ato de assinar um cheque de centenas de milhares de reais para entregar ao Fisco provoca uma convulsão nos órgãos internos; o coração pulsa mais forte, a respiração fica ofegante, a sala começa a girar etc. Convenhamos, a nossa cultura não admite a prática de pagamento de imposto; isso está no nosso DNA. E tem mais. A ideia de separar parte da receita para entregar ao fisco não entra na cabeça de ninguém. Ou seja, os que pagam, pagam contrariados; mergulham o sapo enverrugado no balde de vaselina inglesa antes de engolir o batráquio. Sendo assim, pergunta-se então por que o legislador se empenha tanto na criação de regras prolixas e impraticáveis em vez de fazer algo racional e adequado ao perfil do nosso empresariado? A mando de quem esses legisladores fazem isso?