quarta-feira, 28 de novembro de 2012

ATOLADO NO DESCONTROLE

Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 28/11/2012 - A102
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O empreendedor típico é aquele que faz acontecer, não importando a quantidade de empecilhos que possa encontrar pelo caminho. Coragem e energia constituem-se assim na mola propulsora que transforma ideias em iniciativas bem sucedidas. Essas premissas funcionam bem em ambientes homogêneos de negócios. Quando mudanças drásticas nesses ditos ambientes passam a demandar requisitos até então ignorados por uma massa expressiva de empreendedores, a coisa começa a se mostrar instável e perigosa. Um elemento crítico a entrar no jogo é o aperto fiscal via projeto SPED, o qual vem provocando ondas e mais ondas de turbulência operacional e financeira. O outro elemento crítico é consequência direta da ação do SPED. Trata-se da necessária e urgente profissionalização da gestão empresarial. Agora, não basta ao empreendedor somente ser enérgico e corajoso. Ele precisa deixar de ser apenas dono e passar também a ser empresário profissional; agir e se comportar como um executivo capaz de planejar, executar e controlar diferentes aspectos da gestão do negócio. Para isso, é preciso ter competência técnica adquirida tanto em programas formais de aquisição de conhecimentos, quanto em leituras, viagens, sondagens, compartilhamento de experiências etc. Isso vale também para os seus funcionários.

O encapsulamento das atividades habituais numa rotina engessada bloqueia a percepção de alternativas e de possibilidades para novas formas de gerenciamento dos negócios. Quem não viaja, quem não lê, quem não pesquisa, quem não experimenta, quem não se instrui, acaba se transformando num refém de circunstâncias aleatórias. A percepção do novo e o rompimento da casca paradigmática podem abrir caminhos que conduzem ao campo de batalha. Ou seja, podem permitir jogar o jogo da competitividade. A maior tragédia que pode vir a acontecer é não haver condições suficientes para se entrar em campo. Ou então receber um cartão vermelho quando se está no auge da disputa. Temos dois casos emblemáticos aqui na nossa região que são bastante ilustrativos; um de sucesso, outro de fracasso. O primeiro exemplo é relativo a uma empresa comercial que investiu fortemente na capacitação tanto dos diretores proprietários quanto dos funcionários, onde membros do alto escalão foram se capacitar nas melhores instituições educacionais do mundo. O resultado de anos de insistência e perseverança é a consolidação de um modelo referencial de negócio bem sucedido. Quanto ao segundo exemplo, os proprietários optaram por entregar seu patrimônio nas mãos de pessoas supostamente bem preparadas, as quais empurraram a empresa para o abismo. O triste resultado está ostensivamente estampado nas fachadas das lojas, na forma de cores e padrões diferentes do habitual.

Dentre todo o conjunto de ações voltado para o controle interno da organização, um se destaca como a mais eficiente ferramenta de gestão empresarial. Trata-se da contabilidade gerencial. É muito interessante observar a multiplicidade de métodos e a criatividade prolífica nos ambientes corporativos. A falta de conhecimento técnico leva aos mais mirabolantes formatos de controle, cada um mais curioso que o outro. Alguns até que são surpreendentes e funcionais, mas a maioria peca pela dificuldade de atender objetivamente às demandas de informações da diretoria. A contabilidade possui recursos capazes de transformar eventos operacionais numa imagem panorâmica dos elementos patrimoniais, além de oferecer múltiplas formas de avaliação do desempenho de unidades de negócios, de atividades, de projetos, de departamentos etc. E ainda amarra todas as operações umas às outras, evitando assim que uma ou outra informação saia do alcance da sua órbita. É o famoso princípio das partidas dobradas em ação.

Apesar do superpoder da técnica contábil, impressiona o fato da sua não utilização para a produção de informações gerenciais. Em vez disso opta-se pela elaboração de relatórios que misturam competência com caixa, investimento com despesa, passado com futuro, custo com resultado, curto com longo prazo, lucro com prejuízo etc. O enredo recorrente nos ambientes desprovidos de controle interno conta com o dono a exigir do setor financeiro as informações sobre o desempenho das operações. O outro personagem é o encarregado do financeiro que se desdobra na construção de um mosaico de números que mais parece um caleidoscópio. No meio dos dois fica o contador já cansado de ver suas propostas de implantação da contabilidade gerencial ser rejeitadas devido ao fato do diretor ser desprovido de conhecimentos necessários para a leitura dos demonstrativos contábeis. A coisa começa a ficar desesperadora quando a informação gerencial de qualidade é vital num momento de crise aguda que requer decisões precisas e acertadas.

A competitividade está na ordem do dia. É possível que a turbulência inicialmente provocada pelo SPED venha apontar uma saída para a mesmice das administrações ineficientes. Talvez o SPED seja o agente promotor da profissionalização da gestão empresarial. A lei Sarbanes-Oxley também provocou furor nas empresas norte-americanas, mas depois de certo tempo se mostrou uma excelente ferramenta de gestão empresarial, principalmente na área de Tecnologia da Informação.


quarta-feira, 21 de novembro de 2012

QUEM SOBREVIVERÁ AO SPED?

Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 21/11/2012 - A101
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Mudar hábitos arraigados não é tarefa fácil. Mais difícil ainda é passar por transformações abruptas com características de catarse. Imagine a dificuldade de um boxeador que da noite para o dia se vê obrigado a seguir a carreira de bailarino. É mais ou menos isso o que está acontecendo com uma gama variada de empresários. Há pouco tempo um comerciante do centro de Belém do Pará recebeu várias ofertas vantajosas de aquisição de pontos comerciais bem situados. Os ofertantes são empresários vencidos pelo paroxismo burocrático dos controles fiscais. Esse pessoal simplesmente não conseguiu segurar a onda de mudanças radicais que vem balançando as estruturas de empreendimentos anteriormente tidos como sólidos e inabaláveis. Essa dita onda tsunâmica está deixando muita gente desorientada e sem nenhuma alternativa para salvar os negócios, visto que hábitos forjados no molde da sonegação tributária dificilmente serão modificados, não importando a pressão dos controles mirabolantes imposta pelo Fisco. Os ventos da mudança de paradigma já são perceptíveis há muito tempo. O problema é que os alertas fiscais não foram levados a sério. Agora, a brisa lá de trás já se transformou num vendaval e logo, logo, irá adquirir proporções de um furacão a devastar estruturas administrativas mal construídas.

O modelo de gestão vigente nessas empresas enfermas só considera existência dos setores financeiro e comercial. O setor administrativo é uma coisa que sempre está meio que à deriva; uma coisa que vai se ajeitando por si só. Os responsáveis por essas administrações empíricas não conseguem sequer identificar as causas da sua ineficiência, como também não conseguem compreender a natureza das ações bem sucedidas que alavancaram o desempenho do concorrente que está rodando fiscalmente a 100%. O empresário tradicionalista não costuma perder tempo com assuntos que não envolvam compra e venda. Seus funcionários são toscos e de baixíssima capacitação profissional. Sua estrutura de informática é mínima. Seu controle interno tem mais furos do que um queijo suíço. Ou seja, a sustentabilidade do negócio está diretamente ligada à prática da sonegação de tributos. A sonegação é o contrapeso da ineficiência.

A nota fiscal eletrônica, coluna mestra do projeto SPED, está perturbando as relações do comerciante com o seu fornecedor e também com o seu contador. O fornecedor já está trabalhando com nota “cheia” e assim “entregando” a operação para o Fisco; não deixando margem para ajustes na escrituração fiscal. Alguns contadores não conseguem aplicar na escrituração de todos os seus clientes a plenitude da complexidade das obrigações fiscais; eles acabam trabalhando apenas na superfície do problema, enquanto que lá nas profundezas o resultado da inobservância de tantas novas e complexas normas fiscais é um sério risco aos negócios do cliente. Não à toa, cresce ostensivamente a insatisfação e inquietação de empresários quanto à qualidade dos seus controles fiscais.

Quando uma sucuri engole um bezerro, ela fica lá, parada, convivendo com aquela deformidade até conseguir fazer a digestão completa. É mais ou menos isso o que aconteceu com o Fisco. O SPED está lá, aquela coisa monstruosa na barriga, que pelo visto ainda vai demorar muito tempo para ser digerido. A própria Receita Federal está atolada no mundaréu de normatizações e procedimentos que empurrou goela abaixo de contribuintes absolutamente despreparados. Nas secretarias de fazenda estaduais a deficiência dos processos gerenciais é mais crítica. Quanto aos contribuintes, não existe preparo suficiente, principalmente das empresas pequenas, para se aprofundar no detalhamento e na sofisticação técnica do SPED. A Secretaria de Fazenda de Rondônia não conseguiu conferir objetividade ao gerenciamento da substituição tributária interna de ICMS, de tal forma que se viu obrigada a repristinar uma norma legal por pura falta de estrutura de tecnologia e de pessoal qualificado. O fato é que cada estado segue seu próprio ritmo; uns mais rápidos, outros mais lentos. A SEFAZ/AM dispõe de um serviço que falta a algumas secretarias de fazenda Brasil afora, que é a disponibilidade aos contribuintes via internet, das notas fiscais emitidas e recebidas. Mesmo com todos esses desencontros, é bom ressaltar que o Fisco está debruçado na análise detalhada de diversas operações fiscais. Sabe-se que no estado de Pernambuco, alguns contribuintes já são alertados pela Secretaria de Fazenda via ligação telefônica de que um determinado produto do estoque está com saldo negativo.

O complicado da coisa é que não é preciso somente haver disposição de acabar com a sonegação e rodar fiscalmente a 100%. O problema é que se tudo for pago o caixa quebra e a empresa fecha as portas. O cerco fiscal via SPED está finalmente mostrando que a carga tributária é insustentável. Muitos que decidiram cumprir à risca a insanidade das regras fiscais estão quebrando. O problema não é só pagar. Problema maior é cumprir as ultra complexas normas de controle fiscal, que exigem um altíssimo custo para construir uma megaestrutura administrativa que envolve sistemas caríssimos de informática e mudanças radicais nos modelos de gestão, além de altos investimentos no quadro de profissionais especializados, sendo que tais profissionais especializados são cada vez mais difíceis de achar.

Um renomado consultor empresarial paulista disse que não existe mentalidade empresarial no Brasil. Prova disso são aqueles que mesmo querendo se adaptar aos novos tempos, não sabem como fazê-lo. Esse pessoal não possui conhecimentos sobre tributos, informática, contabilidade, gestão financeira, gestão de pessoas, planejamento etc. Tal ignorância os torna presas fáceis de consultores e de vendedores de soluções de gestão empresarial mal intencionados.



terça-feira, 6 de novembro de 2012

ORGANIZAÇÕES DO APRENDIZADO

Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 06/11/2012 - A100
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Há alguns anos, uma série de fatores vem impactando os tradicionais modelos de gestão e assim provocando reflexões sobre as práticas gerencias vigentes. Trata-se do despertar de consciências para um novo ambiente de negócios. Essa nova realidade está exigindo uma nova postura dos comandantes das mais variadas formas de organizações. Se antes o foco principal era a concorrência; agora, é o viés fiscal que está pautando as ações das empresas. A necessidade de controle fiscal está trazendo consigo a necessidade de controle pleno dos processos via sistema ERP, o qual deve ser imprescindivelmente complementado pela contabilidade gerencial. O sentimento de que as coisas estão fugindo do controle e a paranoia de constantes ameaças aos negócios tem angustiado o espírito de pessoas responsáveis pelo sustento de muitas famílias que dependem da manutenção do emprego. O mercado de agora está mais exigente, a conjuntura econômica está mais exigente, os controles governamentais estão terrivelmente mais exigentes. E a solução para lidar com esse estado de coisas é se reinventar; é quebrar paradigmas, é se organizar.

Essa dita reinvenção passa obrigatoriamente pelo amadurecimento profissional dos atores corporativos, os quais devem se comportar como protagonistas das suas incumbências; onde cada um deve estar plenamente comprometido com a sua quota de responsabilidade. Evidentemente, sabe-se que em face do modelo de gestão vigente na maioria das nossas empresas, isso é a mesma coisa que transformar água em vinho. Pode ser, mas muitos iluminados gestores já estão revolucionando seus modelos de negócios. E a fonte desse milagre está no poder das equipes de alto desempenho. Agora, mais do que nunca, se observa a imposição da competência. Ou seja, onde há casos de sucesso existe uma afiadíssima equipe de excelentes profissionais. Não há outra saída. Para manter-se estabelecido é preciso investir em qualificação profissional, principalmente nas áreas burocráticas de controle interno.

As pressões esmagadoras dos controles fiscais estão obrigando praticamente tudo quanto é funcionário a possuir sólidos conhecimentos fisco/tributário/contábeis. Por exemplo, o Comprador deve está munido de informações suficientes que lhe permita discutir com a fábrica questões relacionadas com CST, NCM, CFOP, ZFM, ALC, substituição tributária, regime monofásico, alíquota, fato gerador, tributo por dentro, tributo por fora, “bis in idem” etc. De modo semelhante, o Almoxarife precisa está igualmente preparado, visto ser ele o responsável pela alimentação de vários módulos do sistema ERP quando faz adições ao estoque. O Vendedor deve orientar seu cliente varejista que determinado produto já foi tributado via substituição tributária e que por isso mesmo está isento de imposto em todas as etapas subsequentes de comercialização dentro do Estado. O Financeiro deve está atento aos prazos de recolhimento de tributos e ao mesmo tempo obrigado a questionar o Fiscal e o Contábil sobre situações grosseiramente discrepantes que possa vir a detectar. Os riscos fiscais atuais são imensos e por mais cuidadosos que sejam os procedimentos, sempre existe a possibilidade de a empresa ser apanhada no contrapé. Daí o motivo de mais e mais pessoas se manterem atentas aos assuntos fiscais.

Tais desafios estão obrigando as organizações ao desenvolvimento de uma cultura do aprendizado sistêmico e integrado à essência do negócio. O aprimoramento constante de novas habilidades e percepções devem ser capazes de revolucionar crenças e opiniões, levando assim ao senso comum de que o aprendizado contínuo e coletivo é a única forma de manter vantagens competitivas sustentáveis. Departamentos estanques e aprisionamento do conhecimento estratégico em redutos específicos da organização já são vistos como práticas nocivas à saúde do negócio. Porquanto, não há espaço para gênios indomáveis; as empresas querem pessoas com espírito conciliador e raciocínio sistêmico. A disseminação do conhecimento pode acontecer internamente via disposição dos que sabem mais em ajudar os que sabem menos. Isso não é difícil. É preciso que alguém se disponha a dar partida na máquina do saber. É bom lembrar que o conhecimento é propriedade de todos e a sua capilarização é o axioma do momento.

Até aqueles que naturalmente detinham uma carga maior de conhecimento já se sentem pressionados pelas novas e excessivas demandas de informações atualizadas. Por exemplo, vários empresários que decidem profissionalizar seu ambiente de negócios acabam percebendo que seu Contador “meia bomba” não reúne condições suficientes para responder à enxurrada de desafios que diariamente bate à porta da empresa. Normalmente, aquele preenchedor de DARF e peregrinador da SEFAZ possui uma visão muito estreita; falta-lhe conhecimento sistêmico e orgânico dos processos empresariais. Não à toa, muitos Consultores são contratados para preencher o vazio deixado pelos Contadores. Por isso mesmo, contar com os serviços de um bom Contador é hoje prerrogativa de um grupo privilegiado de Administradores.