terça-feira, 29 de janeiro de 2013

CAOS TRIBUTÁRIO

Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 29/01/2013 - A108
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O brilhante artigo “Autuações fantasiosas anunciam carnaval tributário” do eminente Tributarista Raul Haidar, publicado no último dia 14 na Revista Consultor Jurídico, traça um panorama sombrio do nosso movediço sistema tributário. O texto se desenvolve a partir da notícia de repercussão internacional acerca de dois autos de infração aplicados pela Receita Federal em dezembro passado à Mineradora MMX que soma R$ 3,8 bilhões, cerca de 90% do valor da empresa. Em fato relevante enviado à Comissão de Valores Mobiliários, a empresa afirmou que considera “totalmente improcedentes as autuações recebidas” e entende que no fim do processo elas serão rejeitadas. A MMX apresentará impugnação administrativa, implicando suspensão da exigibilidade do crédito, bem como utilizará os meios legais disponíveis em defesa dos seus direitos, conforme o comunicado (post do Valor Econômico). Continuando o raciocínio do sr. Haidar, é provável que esses autos surreais sejam declarados improcedentes já na fase administrativa. Ou seja, é comum atividades fazendárias desse tipo produzirem muito barulho, mas no final, deixarem de produzir a arrecadação que no início se imaginava.

O sr. Haidar afirma que vem há muito tempo engajado na luta por uma verdadeira Justiça Tributária, situação que depende de três objetivos fundamentais: 1)redução da carga tributária; 2) simplificação da burocracia; e 3)segurança jurídica. Nada disso parece que vai ser obtido a curto prazo. O terceiro objetivo passa primeiramente pela necessidade de obtermos uma legislação orientada pelos fundamentos constitucionais em vigor. Sem um instrumental legislativo eficiente, ficamos sujeitos a nos enredar num cipoal de normas confusas, conflitantes, cuja interpretação fica a depender de subjetivismos que não garantem direitos, mas abrem espaços para diversos crimes, sendo o mais óbvio a corrupção.

A Lei 12.767, relacionada a assuntos de energia elétrica, simplesmente ignorou a Lei Complementar 95/98, alterando outra lei com o propósito de tornar legal o protesto de dívidas antigas. Em síntese: o governo passa por cima do ordenamento jurídico na maior cara de pau quando quer impor suas vontades ao povo e isso nos leva a concluir que legislar no Brasil se tornou uma atividade sem qualquer controle. Talvez imaginem os legisladores desse país que podem introduzir no nosso sistema algumas medidas que ignoram o sistema jurídico que eles mesmos aprovaram. Esquecem-se que existe um Judiciário capaz de declarar sem valor a norma que não vale nada.

Continuando a exposição do sr. Haidar, mesmo que a Mineradora MMX consiga derrubar os autos aplicados pela Receita Federal, a simples notícia já causou imensos prejuízos aos negócios da companhia. Há um caso emblemático de uma importadora de veículos que sofreu uma autuação de R$ 300 milhões por suposto faturamento nas importações. Servidores públicos chegaram a publicar na mídia a notícia de que os donos seriam presos, sendo que no final o auto foi declarado improcedente, tendo a Receita Federal reconhecido que não havia irregularidade nenhuma; os servidores fizeram o auto errado, mentiram para o público e ignoraram qualquer regra ética. A atuação desastrosa e criminosa dos fiscais resultou no fechamento da empresa e a consequente demissão de cerca de mil empregados. Quanto aos fiscais, estes foram até promovidos.

O processo administrativo é um ótimo negócio para o fisco, pois, quando o contribuinte consegue resultado positivo nessa instância, não há custas nem honorários que devam ser pagos ao contribuinte. Este é vítima do erro do fisco e tem que pagar por isso. Assim, verifica-se que o fisco pode errar à vontade, pode até destruir uma empresa via auto de fiscalização improcedente sem que nenhuma penalidade possa ser a ele imputada. Quanto ao contribuinte, se errar uma vírgula no preenchimento de um formulário sente o peso do desmoronamento burocrático e destrutivo do fisco sobre os seus ombros. E detalhe: nada, mas absolutamente nada é perdoado; todo mínimo deslize é cruelmente punido sem dó nem piedade.

O texto desse iluminado cidadão – sr. Haidar – pode ser traduzido num clamor a extravasar as dores das inclementes e intermitentes chicotadas que o contribuinte sofre diariamente. É preciso urgentemente fazer algo para barrar o avanço da tirania fiscal que não para de escarnecer e trucidar a vida das pessoas, seus negócios, seu patrimônio etc. As empresas estão chegando num limite extremo. Qualquer hora dessas acontece uma tragédia institucional nesse país. Ninguém vai mais aguentar o estrangulamento, os desmandos, a corrupção e a insegurança jurídica patrocinada pelas instituições legalmente estabelecidas. É preciso fazer alguma coisa, é preciso ação antes que toda a sociedade seja exterminada.



quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

O GOLPE DO MACHADO

Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 23/01/2013 - A107
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Dormir pensando nas atividades do dia seguinte; acordar cedo para logo em seguida desenvolver todo um ritual de preparação até está pronto para encarar o trânsito e chegar ao local de trabalho no horário adequado. Respirar fundo, encontrar entusiasmo para mais um dia de rotina, rotina, desgaste, estresse, conquistas, tristezas, alegrias, rotina, rotina, cansaço, trânsito até o retorno ao lar. O ritmo condicionante e automatizado imposto ao cidadão pelas circunstâncias e pelo nosso modelo econômico e social sufoca seus centros nervosos e criativos tornando-os criaturas autômatas e extremamente dependentes do sistema que as alimenta e ao mesmo tempo as consome. Esse tipo de coisa até lembra aqueles animais de zoológico que desaprendem a viver livres na natureza. O ambiente de trabalho envolve de tal forma o empregado que ele dificilmente consegue trabalhar sem que fortes vínculos afetivos e psicológicos sejam criados com as pessoas que interage ou com o local onde desenvolve suas atividades diárias. Não se consegue, por exemplo, voltar para casa sem trazer a empresa junto consigo (como se ela fosse um encosto); dificilmente se consegue esquecer total e absolutamente os acontecimentos do dia que passou. 

No ambiente de trabalho vive-se toda uma história envolvendo peripécias, paixões, discordâncias, confrontos, amizades, tensões etc. Aquele seu local de trabalho, aquele seu posto, aquela sua mesa, aquele seu cantinho; aquele é o seu território, é a extensão da sua casa. Ali estão suas coisas arrumadas do seu jeito, suas anotações, o porta-retratos etc. Ali, em cada coisa está impregnado um pouco de você. E as empresas querem isso mesmo, quer essa dependência, essa entrega absoluta; elas querem a quintessência do empregado. Não querem somente o envolvimento, querem o tal comprometimento. Na realidade, todo um vasto rol de ideologias administrativas fomenta o apego quase religioso aos dogmas inquebrantáveis propalados pela sagrada e inexpugnável cúpula. 

Quantos acontecimentos se desenvolvem nesse ecossistema, quantas expectativas são criadas, quantas ilusões são perdidas, quantas pessoas são prejudicadas, quantas injustiças são cometidas!! Como afirmou o famoso Cardeal de Richelieu, saber dissimular é o saber dos reis. Então, para defender o reinado e o Bem comum, muitas vezes é preciso convencer de modo ardiloso, é preciso conquistar mentes e corações para a causa maior. Nem que depois muitos bravos soldados sejam preteridos e deixados ao relento; mesmo que tenham dado o próprio sangue no front, ainda assim podem ser bruscamente desterrados e banidos.

A separação é sempre algo doloroso, visto que isso se traduz no rompimento de uma série de vínculos emocionais, afetivos e psicológicos. Por mais que o empregado tente não se abalar, dificilmente ele consegue manter sua estrutura psicológica intacta diante de uma demissão sumária. O ato de demitir possui uma carga destruidora como se fosse uma sequência de explosivos a implodir uma edificação. No final fica um monte de escombros em meio a uma poeira sufocante e perturbadora. Num determinado momento, várias coisas são suas: seu posto, sua autoridade, seu comando, seu poder de mando, sua mesa, seu computador, o respeito ao seu cargo, o tapinha nas costas, os sorrisos, as reverências. No outro momento tudo é bruscamente implodido. Você volta dias depois para acertar as contas e olha a sua mesa como visse sua ex-namorada beijando outro homem. Você observa os sorrisos amarelos, a frieza do ambiente, os olhares atravessados, o desprezo de uns e o constrangimento de outros. Toda aquela doação, todos os anos de entrega total e absoluta, toda devoção à causa, todo o comprometimento, tudo é bruscamente quebrado e anulado pelos números constantes no documento de rescisão de contrato de trabalho. Você volta para casa no meio da tarde; chega a noite e lembra de tantas atividades para fazer no dia seguinte que não mais serão feitas. O dia amanhece e aquele impulso de preparar o espírito para mais um dia de trabalho cria uma confusão e uma tristeza profunda. 

Aos sobreviventes que presenciam tais cenas fica a reflexão sobre sua própria condição de objeto descartável. “Será eu amanhã em tal lastimável situação?; Será que estou me doando demais?; Será que minhas expectativas não estão exacerbadas?; Será que vale a pena entregar o meu espírito junto com a minha dedicação?”. Assim, cada lágrima ensina-nos uma verdade e muitas vezes as verdades vão endurecendo nossa conduta e arrefecendo nosso entusiasmo para que lá na frente estejamos menos fragilizados quando recebermos o golpe do machado. Métodos cruéis e desumanos ainda são muito comuns em tantas empresas despreparadas para administrar seus empregados. O respeito à dignidade das pessoas deveria pautar todas as ações das empresas. O tão sagrado conceito de comprometimento deveria ser uma via de mão dupla. 

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

BI, a evolução do ERP

Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 17/01/2013 - A106
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Administrar inteligentemente uma organização, de forma a explorar suas potencialidades e ao mesmo tempo interpretar as sutilezas comportamentais das diversas instâncias operacionais do negócio é o ideário perseguido por muitos administradores. É o que Alfred Sloan chamou de administrar com a força dos fatos. É o que esse brilhante executivo da General Motors fez na primeira metade do século 20, cujos concorrentes levaram décadas para compreender o
inovador raciocínio desse, que é considerado o primeiro homem-organização. Sloan, que administrou a GM no período de 1923 a 1956, tornando-a uma das primeiras organizações empresariais realmente complexas, compreendeu que uma empresa não poderia desenvolver uma estratégia impetuosa ou tomar iniciativas corretas sem se basear em fatos e “insights” de pessoas da organização. E todo esse magnífico trabalho foi feito artesanalmente numa época desprovida da parafernália tecnológica atualmente disponível no mercado. O que se observa nos dias de hoje é um vasto leque de instrumentos gerenciais subutilizados, como se sobrasse ingredientes, mas faltasse a “mão certa” para fazer o bolo.

O histórico das nossas práticas gerenciais é pontuado por um variado rol de tentativas e erros. Desde aquelas salas recheadas de datilógrafos até o início do uso do computador, muitas propostas milagrosas de gestão eficiente se apresentaram em livros, palestras, vídeos etc. A alvorada da informática foi caracterizada pela centralização do processamento da informação nos famosos “mainframes” (a grande máquina). Mas tarde surgiu o computador pessoal e suas infinitas aplicações, que no final das contas fez mesmo foi dispersar e misturar os controles operacionais em pastas eletrônicas perdidas em meio ao parque tecnológico de máquinas computadorizadas. Só depois de muito sofrimento é que a redenção chegou na forma dos ultra complexos e desafiadores sistemas ERP (enterprise resource planning). Até o momento, alguns sistemas ERP são na realidade um arranjo de blocos de aplicativos conectados uns aos outros por meio de remendos mal costurados. Ou seja, não se configuram como um único sistema dotado de várias funções, visto dependerem da interferência humana para que um módulo possa se comunicar com o outro. Outra característica marcante é a infinidade de parametrizações necessárias para fazer o sistema entrar em produção, o que exige um altíssimo investimento em treinamento de mão-de-obra. É como se o carro saísse de fábrica faltando pneus, bancos, pintura etc. Uma interface realmente inteligente e amigável ainda é uma das grandes carências dos sistemas ERP.

Mesmo depois de muita perseverança, competência e profissionalismo aplicados à implantação e utilização de um sistema ERP, chega-se a uma constatação gloriosa de que os processos operacionais estão sendo fielmente representados dentro do ERP e consequentemente produzindo informações íntegras e fidedignas. Só que, surpreendentemente, descobre-se que a tão sonhada meta de administrar com a força dos fatos não foi atingida. O novo desafio é saber gerenciar a informação produzida, é saber extrair do gigantesco armazém de dados somente “aquela” informação estratégica e preciosa que fará com que a empresa fique um passo à frente do concorrente, como fez o gigante varejista Walmart. Nesse momento entra em campo o BI (business intelligence).

O BI é um analisador eletrônico de dados, capaz de produzir “aquela” dita informação estratégica a partir da garimpagem (data mining) do armazém de dados (data warehouse). Essa tecnologia ainda é incipiente e restrita a uns pouquíssimos fornecedores, tanto que robustos e notórios produtores de sistemas ERP utilizam, por exemplo, BI da americana IBM ou da dinamarquesa Targit. Com o BI não se analisam números e sim, situações; não se comparam relatórios e sim, verifica-se o cumprimento de metas. Isso é de extrema importância para um diretor que comanda cem empresas, por exemplo. Quando a extensão do objeto de análise é muito vasta, há de se utilizar mecanismos que permitam identificar disfunções e fazer um monitoramento inteligente do comportamento do negócio num espaço de tempo relativamente curto. O BI permite estabelecer uma série de indicadores a serem observados ou metas a serem cumpridas, e pode ser programado para mostrar somente os números deficitários, sendo que tais informações são transmitidas de modo automático diretamente para o celular do administrador. Assim, somente informações relevantes e cruciais sobre o desempenho do negócio são monitoradas “pari passu”. É possível ainda programar o sistema para elaborar complexos e sofisticados relatórios, eliminando-se assim aquela tão comum correria antes das reuniões importantes. O BI torna o diretor da empresa independente de gerentes ou secretárias, visto que seus relatórios de desempenho gerencial são produzidos tanto de forma automática ou num clicar do mouse.