quarta-feira, 26 de agosto de 2015

PARADOXO DA CARGA TRIBUTÁRIA

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Doutor Imposto
Publicado no Jornal Maskate dia 27/08/2015 - A009

Nossa carga tributária beira os 40% do PIB; trabalhamos exclusivamente para o Governo até o dia 31 de maio. Somente depois dessa data é que passamos a usufruir do suor do nosso rosto. Com isso, ninguém aguenta mais tanta pressão tributária. E mesmo assim o Governo não para um minuto de mexer aqui e ali, numa coisa e noutra, capando benefícios fiscais e majorando alíquotas. Por último, des-desonerou (ou reonerou) o INSS da folha de salários. As prestadoras de serviços estão assustadas com a movimentação em torno da unificação do PIS/COFINS – há risco provável de duplicação da carga tributária, que já é sufocante. Isso, fora a ultra hiper super mega complexidade de gerenciamento dessa obrigação acessória. No passado, PIS/COFINS foi um gatinho manso até se transformar no tigre alucinado de hoje. O Governo gaúcho quer aumentar a alíquota interna de ICMS. Outros estados querem sobretaxar o já pesadíssimo ICMS da energia elétrica. E por aí, vai...

Paradoxalmente, o Brasil possui uma das menores taxações de imposto de renda em comparação aos países desenvolvidos.  As pessoas físicas brasileiras pagam no máximo 27,5%, enquanto que a Suécia taxa a 58,2%; Alemanha, 51,2%; EUA, 46,1%; México, 40%; Argentina, 35%. A razão de termos baixa tributação de imposto de renda e alta carga tributária está nos pesados impostos sobre consumo, contrariando a prática adotada nos países europeus, como também nos EUA e Canadá. A tributação sobre consumo é a mais injusta e particularmente perversa com a população pobre, que paga tanto quanto um milionário. É o tal sistema regressivo de tributação. Não fosse isso, o pobre poderia levar para casa o dobro de coisas, uma vez que metade do preço dos produtos consumidos é puro imposto.

Curiosamente, toda ação majoratória do Governo tem como alvo os tributos sobre consumo, também chamados de tributos indiretos. Ou seja, toda artilharia confiscatória é direcionada para a massa populacional estabelecida na base da pirâmide social. Todo o monstruoso projeto da nota fiscal eletrônica e do SPED é voltado para os tributos indiretos, que estão sempre aumentando. Já, imposto sobre renda e sobre patrimônio é algo imexível. O Governo brasileiro não se atreve a cutucar os ricos, isentando, por exemplo, os dividendos. Dentre os países membros da OCDE, somente a Estônia concede essa isenção aos acionistas e sócios de empresas. O Governo francês, por exemplo, chega a ficar com 60% de um processo de herança, enquanto que aqui a taxação é baixíssima. Para completar o pacote de excentricidades, no Brasil a pessoa jurídica paga mais imposto de renda do que a pessoa física, contrariando novamente a prática corrente no resto do mundo desenvolvido.


Para comprovar o temor do Governo de mexer com o bolso dos ricos, a Receita Federal pretende taxar a repatriação de dinheiro enviado ilegalmente para o exterior com o percentual de 17%. Tal medida é um acintoso deboche ao trabalho honesto dos empregados taxados a 27,5%. Grande parte desse dinheiro é oriunda do tráfico, da corrupção e de diversas outras atividades criminosas. Taxar a uma alíquota tão baixa seria uma espécie de lavagem de dinheiro sujo. 


terça-feira, 25 de agosto de 2015

A QUEM INTERESSA UM SISTEMA CONFUSO?

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Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 25/08/2015 - A223

Nos países desenvolvidos o imposto e o seu respectivo fato gerador são elementos claramente distintos. Se as coisas são óbvias, o contribuinte consegue cumprir com suas obrigações tributárias de modo a dormir sossegado. Se as coisas são óbvias, o Fisco consegue cobrar o valor devido sem temer contestações judiciais. Aqui no Brasil nada é obvio; tudo é difuso, sobreposto, misturado, escamoteado, subentendido, implícito, ininteligível etc., etc. Pra começo de conversa, qual o motivo exato da existência de mais de 60 tributos? Por que tanta tributação sobre a mesma base (IPI, ICMS, PIS, COFINS, INSS, CIDE, IR, CSLL)? Por que um tributo é base do outro, e do outro; tudo ao mesmo tempo? A quem interessa tanta maluquice? E por que ninguém mexe nesse angu de caroço? Quem ganha com isso?

O fato é que os tribunais estão abarrotados até o teto de processos complicadíssimos. Se a coisa toda é super hiper ultra mega complexa, as causas judiciais costumam envolver montanhas de dinheiro que molham a mão de um, de outro e de mais outro. Não à toa, descobriu-se que o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais é um covil de abutres carniceiros, cujo único objetivo é roubar e roubar muito dinheiro. É a patifaria em grande escala. Alguém então poderia perguntar: Como algo tão grandioso e ostensivo se mantém nas sombras da discrição? A resposta é muito simples: BUROCRACIA EXACERBADA. Tudo que é confuso tem o propósito de acobertar algo criminoso. Qualquer redação legislativa cheia de 200 voltas e 300 curvas esconde um propósito malicioso, principalmente quando a luz do sol não consegue iluminar a intenção do legislador.

O Brasil tem essa fissura pelo complicado. Talvez por isso o emblemático e icônico Odorico Paraguaçu esteja fortemente grudado no nosso imaginário coletivo, como se fosse um arquétipo. Ele falava e falava e não dizia nada. E o povo ficava embriagado com aquilo tudo. O Odorico é a personificação da esperteza em estado de glória; o sonho de qualquer político a querer fazer e desfazer infinitas vezes sem que o povo idiota deixe de idolatrá-lo. Tem gente que é tarada por textos recheados de jargões, temperados com floreios e salpicados de rococós. Seria um sinal de erudição. Pois é..!! Toda essa entulheira literária é despejada no poço sem fundo da nossa burocracia tributária.

Essa dita burocracia desenfreada está matando as empresas. Por exemplo, muita gente deixou de vender mercadorias ST para fora do Amazonas porque a burocracia é infernal e o prejuízo é gigantesco, devido à duplicação da carga tributária. Outro exemplo doloroso da virulência burocrática está numa próspera e competentíssima empresa de móveis planejados que está fechando as portas por causa da instabilidade normativa que rege a atividade. Ou seja, o custo administrativo é maior do que o custo da produção. Sem contar, os altos riscos patrocinados pela falta de clareza normativa. É realmente lamentável que a coisa toda só tende a piorar. E ninguém se mexe para combater os assassinos de negócios e de empregos. O Fisco está livre, pesado e solto, como um rinoceronte enfurecido.

Antigamente, a confusão normativa não assustava tanto porque o empresário tocava sua vida alheio aos desvarios do legislador. O problema é que agora, o Fisco corre atrás do Contribuinte com um motosserra barulhento. Ou seja, não tem como haver diálogo e não há escapatória porque a legislação é totalmente abilolada. E o culpado de tudo isso é o próprio Contribuinte que deixou a coisa toda chegar nesse ponto. Em vez de lutar pela legalidade, o Contribuinte preferiu agir nas sombras para escapar dos avanços insidiosos da legislação tributária, achando assim que seria mais esperto do que o Governo. O problema é que o Governo ganhou a parada e deu uma volta no Contribuinte, que agora está acuado sem saber o que fazer. O Governo aprendeu a usar a lei para atacar, mas as empresas não desenvolveram uma cultura litigiosa capaz de contestar cada ação exorbitante do agente fazendário. Por exemplo, o artigo 316 §1º do Código Penal (DL 2848/40) pune com prisão de oito anos por excesso de exação, aquele funcionário público que exigir tributo que sabe ou deveria saber indevido. A mesma punição se aplica quando, mesmo devido, o agente público se vale de meio vexatório ou gravoso para fazer a cobrança. Esse tipo de coisa acontece todo dia e ninguém é preso. Isto é, a lei existe, mas não é usada.

Mas ainda há tempo. E o caminho é o da legalidade. O jeitinho não funciona mais como antes. O Contribuinte pode e deve encampar um movimento em prol da racionalização das normas tributárias.

O nosso sistema tributário é injusto e paradoxal. Enquanto a carga tributária beira os 40% do PIB, temos uma das mais baixas taxações de imposto de renda, considerando os países membros da OCDE. E como não poderia deixar de ser, por aqui a pessoa jurídica paga mais do que a pessoa física, contrariando a prática mundial. As pessoas físicas brasileiras pagam no máximo 27,5%, enquanto que a Suécia taxa a 58,2%; Alemanha, 51,2%; EUA, 46,1%; México, 40%; Argentina, 35%. A razão de termos baixa tributação de imposto de renda e alta carga tributária está nos pesados impostos sobre consumo, contrariando, novamente, a prática dos países desenvolvidos. Nesse momento, acompanhamos a sanha arrecadatória do Governo para aumentar os impostos. Interessante, é que o alvo é sempre o consumo e NUNCA o imposto de renda dos mais ricos. O alvo é sempre a massa populacional que está na base da pirâmide.

Mais uma jabuticaba interessante: Na contramão das práticas tributárias da OCDE, o Brasil resolveu isentar os dividendos, renunciando assim a uma bolada anual de R$ 50 bilhões. Os ricos são sempre, sempre protegidos e isentados. A gota d´água de tanto descaramento está na intenção do Governo de aplicar uma taxa de 17% sobre a tal repatriação de dinheiro enviado ilegalmente para o exterior por corruptos, traficantes e criminosos em geral. Está claro que isso é um acintoso deboche aos trabalhadores honestos taxados a 28%. Como declarou o Tributarista Ives Gandra, todo o dinheiro desonesto deveria ser confiscado integralmente e não beneficiado com incentivos fiscais. Pois é.!! Os bandidos se protegem, uns aos outros.



terça-feira, 18 de agosto de 2015

SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA DE FRETE

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Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 18/08/2015 - A222

Já faz alguns meses, tomamos conhecimento de uma nova prática tributária por parte da SEFAZ, que é a cobrança do ICMS Substituição Tributária de Frete. Muita gente estranhou essa medida sem saber que autorização para tal já existe há um bom tempo. Eis a redação do artigo 111 do nosso RICMS (Dec. 20.686/1999): “A base de cálculo, para fins de substituição tributária em operações e prestações subsequentes, internas e interestaduais, será obtida pelo somatório das parcelas seguintes: II - o montante dos valores de seguro, de frete e de outros encargos cobrados ou transferíveis aos adquirentes ou tomadores de serviço...”. A mesma redação está incluída na Lei Complementar 87/1996: “Art. 8º A base de cálculo, para fins de substituição tributária, será: II - em relação às operações ou prestações subsequentes, obtida pelo somatório das parcelas seguintes: b) o montante dos valores de seguro, de frete e de outros encargos cobrados ou transferíveis aos adquirentes ou tomadores de serviço...”. Protocolos e Convênios ICMS vinculados a esse tipo de cobrança repetem a mesma ladainha. 

Possivelmente, a SEFAZ não efetuava essa cobrança em virtude da excepcional complexidade do cálculo tributário, e que, depois da consolidação do conhecimento de transporte eletrônico, essa taxação tornou-se exequível. E as razões são as seguintes: Um conhecimento de transporte pode acompanhar várias notas fiscais, sendo que em tais documentos de venda é possível constar uma quantidade variada de itens de produtos, com regras diversificadas de Substituição Tributária, além de outras mercadorias sujeitas ao regime normal de apuração. Para complicar mais um pouquinho, o mesmo índice de valor agregado pode variar em função de o produto ser de origem nacional ou estrangeira. A explicação dessa variação está na fórmula de cálculo MVA ajustada = [(1+MVA-ST original) x (1-ALQ inter) / (1-ALQ intra)] -1. Problema maior é que o valor do frete é negociado depois da nota fiscal, impossibilitando assim a sua incorporação ao cálculo da substituição tributária destacada nessa nota de venda. Por tal motivo é que a SEFAZ/AM está cobrando aqui o que o não foi computado em outra unidade da federação. Poucos fornecedores conseguem a informação antecipada do frete; isso acontece quando existe uma estreita relação com transportadoras parceiras do negócio.

Como se vê, as normas da substituição tributária do ICMS desafiam a sanidade mental de qualquer indivíduo.

Considerando-se tantas variáveis matemáticas, fica evidente a importância de se identificar a proporcionalidade do frete vinculada a cada item de produto substituição tributária das notas fiscais acompanhadas do conhecimento de transporte. Importante também é conferir o enquadramento de cada NCM nas regras constantes em Protocolos ou Convênios pactuados no Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ). Se, por exemplo, uma nota fiscal possui dois itens, de igual valor cada um, sendo o primeiro normal e o segundo substituição tributária, somente metade do valor do frete estará sujeito à cobrança da substituição tributária do ICMS. Lembrando que a regra aplicada ao frete é a mesma do produto. É como se o frete fosse uma mercadoria. Agora, imagine dez notas fiscais, cada uma com oito páginas de NCM enquadrados em múltiplas regras de taxação de substituição tributária, misturados com taxação normal, sendo todas as notas acompanhadas de um único conhecimento de transporte. Aí, o bicho pega!!

Pois é!! O legislador estabelecido em algum planeta fora do sistema solar é responsável por essas pérolas normativas. No Brasil, nada é fácil; quanto menor é a estrutura de recursos técnicos disponíveis, maior é o enrosco legislativo que somos obrigados a engolir. Por isso é que ninguém cumpre 100% do texto legal. E o fato mais curioso é que o Fisco não acena nenhuma intenção de racionalizar o sistema tributário. Por tal motivo é que, enquanto na Inglaterra se gasta uma hora para cumprir uma obrigação tributária, nós gastamos inacreditáveis 26 horas para fazer a mesma coisa. Obviamente, se nada muda é porque gente grande está lucrando no caos.

Várias empresas foram notificadas pela SEFAZ com taxações escalafobéticas de substituição tributária de frete. É possível que algum fenômeno sobrenatural tenha ocorrido. As empresas que identificarem cobranças indevidas devem solicitar a revisão do cálculo, apontando na solicitação a metodologia baseada nos dispositivos legais supracitados.



quinta-feira, 13 de agosto de 2015

DIVIDENDOS NA MIRA DA TRIBUTAÇÃO

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Doutor Imposto
Publicado no Jornal Maskate dia 13/08/2015 - A008

Uma discussão interessante está agitando o cenário político e empresarial brasileiro. Trata-se da proposta encabeçada pela Confederação Nacional de Municípios que objetiva retomar a prática de tributação dos dividendos distribuídos a sócios e acionistas de entidades empresariais. O presidente da CNM, sr. Paulo Ziulkoski, argumenta que essa mudança resultaria num ingresso de R$ 40 bilhões ao erário, dispensando-se assim grande parte das engenharias orçamentárias previstas no tal Ajuste Fiscal do governo. Os municípios ficariam com quase metade desse bolo tributário.

Essa supracitada prática tributária vigorou no Brasil até o ano de 1995, quando foi extinta pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso, através do artigo 10 da Lei 9.249. A justificativa baseava-se no fato de que o lucro já era tributado na pessoa jurídica. Outro argumento aventado era de que, com mais dinheiro no bolso, o empresário seria estimulado a investir no negócio e assim gerar mais empregos. Essas teses foram corroídas pelo tempo.

Segundo matéria publicada no semanário Carta Capital, dentre os países integrantes da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), somente Brasil e Estônia praticam esse tipo de isenção tributária. Nos Estados Unidos, por exemplo, o beneficiário de dividendos é taxado à alíquota de 30%. Quanto à teoria de que o imposto já foi tributado na pessoa jurídica, é bom lembrar-se do Princípio da Entidade, lá, do curso de Ciências Contábeis. Isto é, sócio e sociedade são entes distintos com rendimentos e patrimônios separados. Outro aspecto relevante dessa questão é o de que o lucro é uma agregação de valor ao patrimônio da empresa – mérito conquistado pelo seu corpo laboral. Se todo lucro for sempre integralmente extirpado ela definharia em pouco tempo.

Portanto, lucro da empresa é o lucro da empesa. Dividendo é uma transferência de patrimônio para o acionista na forma de rendimento que deveria ser tributado. Segundo a Carta Capital, no ano de 2013 um grupo de 71.440 brasileiros ganhou quase R$ 200 bilhões totalmente isentos de imposto de renda. Caso essa bolada fosse taxada com a alíquota aplicada aos salários de muitos trabalhadores (27,5%) o Brasil arrecadaria R$ 50 bilhões anualmente.

Defender-se da nossa extorsiva carga tributária é direito de qualquer cidadão. O problema é que esse direito é negado ao empregado, uma vez que ele absorve passivamente tudo quanto é regra tributária a promover vários descontos no seu contracheque. Já, o patrão pode estabelecer para si próprio um pró-labore baixíssimo, absolutamente em desacordo com suas funções administrativas, com o objetivo de fugir do imposto de renda e da previdência social.

Por conta de tantas distorções do nosso sistema tributário é que quase metade da arrecadação vem dos tributos embutidos em tudo quanto é bem de consumo, penalizando, assim, os mais pobres, que, no final das contas, acabam pagando muito caro para compensar o imposto dispensado dos ricos. Isso é Brasil.


terça-feira, 11 de agosto de 2015

CONTROLE FISCAL ABSOLUTO

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Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 04/08/2015 - A221

Um estudo do Banco Mundial identificou o tempo gasto na preparação, recolhimento e arquivamento de alguns tributos. Dentre 185 países estudados o Brasil ficou na penúltima pior situação burocrática, com uma média de 2.600 horas por ano. No comparativo com outros países a discrepância é brutal, uma vez que o índice da Rússia é de 177 horas anuais; Índia, 243; África do Sul, 200. No Reino Unido são 110 horas anuais consumidas pela burocracia tributária. E a nossa máquina normativa não dá descanso para o contribuinte de impostos. A cada dia somos surpreendidos com mais e mais obrigações acessórias, sendo uma mais complexa do que a outra. O problema é que tanta complexidade alimenta o monstro da subjetividade, abrindo gigantescas margens para interpretações diversas. Tantos desajustes só pioram a nossa já instável e quebradiça segurança jurídica. Tudo no Brasil é travado. Essa é a função do nosso funcionário público: travar tudo e não deixar que nada aconteça. Por exemplo, o investidor americano Stephen Ross está construindo um bairro inteiro em Manhattan ao custo de US$ 25 bilhões, ao mesmo tempo em que administra outro empreendimento imobiliário na cidade de São Paulo de valor dez vezes menor. Lá, nos EUA, a coisa flui normalmente enquanto que o projeto daqui está metido em duzentas mil confusões por conta de brigas de organismos estatais enrolados em regras conflitantes e sobreposições de competências. Entram nessa conta, vaidades, picuinhas e corrupção.

A bola da vez é a Escrituração Contábil Fiscal, fruto da Lei 12.973/2014. Essa nova obrigação acessória é uma mistura de DIPJ com LALUR com ECD. A Declaração de Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (DIPJ) tradicional foi extinta no final de 2014. O Livro de Apuração do Lucro Real (LALUR), onde são feitos os ajustes das dedutibilidades de imposto de renda, perdeu sua independência escritural. E a Escrituração Contábil Digital (ECD), agora, é um módulo agregado a outras fontes de informações relevantes, tais quais SISCOSERV e um bloco de informações econômicas e financeiras. Toda essa engenhosidade tecnológica tem por finalidade reunir as partes num todo. É bom atentar para os outros membros da família SPED. É bom lembrar que são uma família de fofoqueiros, visto que todos conversam entre si de modo a formar um entendimento unificado do objeto investigado.

Resumo da ópera: do lado de lá, as coisas caminham a passos largos rumo a uma convergência total de informações. O objetivo é apanhar o contribuinte no contrapé. Por isso é que, do lado de cá, torna-se indispensável adotar uma estratégia neutralizadora de tantas ações insidiosas do Fisco. O governo trabalha intensamente e à revelia do descaso da classe empresarial que não presta atenção devida aos movimentos do agente fazendário.

À medida que as engrenagens fiscalizatórias vão se alinhando, ficam evidentes os sinais da eficiência do sistema SPED. As autuações fiscais da Receita Federal cresceram 64% em um ano (de 2012 para 2013). Outros indicativos elucidativos têm a ver com a evolução das autuações: ano de 2010, R$ 90 bi; 2011, R$ 109 bi; 2012, R$ 116 bi; 2013, R$ 190 bilhões. Portanto, observa-se uma acentuada curvatura ascendente no quadro das autuações fiscais. Em 2013, o resultado da fiscalização com base nas informações do SPED culminou em cerca de 570 mandados judiciais de apreensão e busca de documentos, e mais de 140 prisões por crime federal. Foram presos, contadores, empresários, empregados de funções subalternas, advogados e até auditores fiscais da Receita Federal. Tudo isso é fruto dessa dita convergência de esforços fiscais combinado com as conexões tecnológicas dos módulos do SPED.

A Lei n° 4.729/1965 tipifica o crime de sonegação fiscal, assim como estabelece penalidade de prisão para os seus infratores. O mesmo tipo de punição é previsto às pessoas enquadradas na Lei n° 8.137/1995, que define os crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo. Agora, imagine o dia em que a tão aguardada Central de Balanços entrar em operação. Nesse dia, o empresário vai deixar as escamoteações de lado e enfrentar a exorbitância tributária com os instrumentos da legalidade.

Mais um alerta importante: O artigo 1177 da responsabilidade civil (Lei 10.406/2002) diz claramente que quem estiver na cadeia de informação e que por acaso o Fisco julgar de má fé; todos estarão sujeitos a um processo judicial. Por exemplo, no caso de uma fiscalização diligenciada pela Receita Federal, o procedimento padrão é parar o processo de fiscalização, comunicar o fato ao Ministério Público e posteriormente acionar a Polícia Federal, que ficará encarregada da apreensão de livros e documentos.



terça-feira, 4 de agosto de 2015

O GAROTO DO PROSTÍBULO

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Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 04/08/2015 

A pátria da corrupção vem há um bom tempo se desnudando frente ao mundo; mostrando suas mazelas, suas idiossincrasias, suas feiuras. Melhor dizendo, ela sempre esteve despida. A massa populacional mais adensada é que não enxergava ou então tinha sérias dificuldades de compreender o que estava diante dos olhos.

Aquele garotinho criado no prostíbulo encara tudo a sua volta com naturalidade absoluta; ele passa o dia brincando aqui e ali ou se distrai com uma coisa ou outra etc. No horário agitado de expediente ele dorme no quartinho dos fundos. Dessa forma, a vida vai passando, passando... Somente depois de bem crescido é que as circunstâncias se apresentam ao menino com uma nova coloração, com um novo significado. É como se de repente a cortina caísse revelando o cenário degradante em que vivia. Na realidade, o ambiente é o mesmo; o que mudou foi o olhar, a percepção, o juízo da coisa.

Nós, brasileiros, estamos no meio da travessia onde parte da cortina já despencou. Ou seja, começamos a enxergar características asquerosas naquilo que antes tratávamos com naturalidade. E até o objeto de observação já está incomodado com o nosso olhar de censor. Como bem disse Cazuza na canção “O tempo não para”, “transformaram o país inteiro num puteiro porque assim se ganha muito dinheiro”. E por mais que os promotores da balbúrdia continuem tentando nos engabelar, seus velhos e eloquentes discursos agora soam como ridículos cacoetes. Portanto, cresce num ritmo acelerado o nojo e a repulsa do povo aos grandes ícones da nossa classe política. É interessante observar certas criaturas abomináveis desfiando toscas peças de oratória na televisão, ao mesmo tempo em que manifestam um pesado semblante demagógico. É como se o orador tivesse uma protuberante verruga cabeluda bem na ponta do nariz. Nossa incipiente maturidade política já nos permite olhar as coisas dessa forma. Resta-nos então rezar para que muitas outras pessoas saiam da escuridão. O cidadão decente e atento aos jatos de lama que jorram do noticiário vive com o estômago revirado em face da podridão alastrada de norte a sul do país.

O esforço do governo de todas as esferas é sempre insistir na tese da normalidade. A mensagem subliminar transmitida pelas autoridades é de que todas as desgraças resultantes da corrupção e da incompetência dos gestores públicos são fatos absolutamente normais. A violência desenfreada é normal. O caos na saúde é um fenômeno natural. O roubo no setor público acontece desde sempre. Nenhuma obra pública é viável sem propina. Os contratos SEMPRE são reajustados. Os prazos NUNCA são cumpridos. E tudo isso é normal. A população precisa entender que o gestor público tem lá, o seu jeitão de ser, e isso NUNCA vai mudar.

Dias atrás, a nossa presidentA afirmou que a culpada da crise é a Operação Lava Jato. Ou seja, é preciso deixar o ladrão fazer o trabalho dele (roubar). Essa coisa de honestidade não funciona no Brasil. As ações da Polícia Federal estão destruindo os empregos porque tudo quanto é obra pública tá metida em alguma falcatrua. Se toda empresa corrupta for proibida de fazer negócios com o governo, logo, logo será preciso importar prestadores de serviço do exterior porque os daqui estão todos leprosos. O pior é que qualquer um que se aproxime do governo corre sério risco de grave infecção.

Pois é. Somos o garotinho crescido, já adulto, enojado com a casa onde fomos criados. O pior é que não temos pra onde ir; somos obrigados a conviver com tantas mazelas e feiuras à nossa volta. Isso é uma opção. Podemos também lutar para modificar esse ambiente apodrecido, mesmo que o grau avançado de degradação não aponte nenhuma esperança de que um dia possamos viver num país civilizado. Talvez a tarefa possa não ser tão árdua. Os nossos políticos linha dura já demonstraram uma frouxidão vexatória quando são extremamente pressionados. Basta lembrar a radical mudança de tom do governador Geraldo Alckmin no momento em que a população foi pra cima em junho de 2013 com uma energia nunca imaginada.

Podemos mudar. Podemos botar toda a corja pra correr. Também, podemos exigir o efetivo funcionamento de várias instituições que só fazem de conta que trabalham.

A Fiat bem que poderia trazer de volta aquele comercial maravilhoso de junho de 2013 (Véem Práa Rúua..!!).