segunda-feira, 19 de setembro de 2016

CAPACITAR É PRECISO


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 20 / 9 / 2016

Tempos atrás, uma grande empresa comercial localizada em Belém do Pará adquiriu um moderno e sofisticado sistema de gestão empresarial (ERP) que prometia revolucionar seus processos operacionais, contábeis etc. Na prática, a operacionalização do projeto resultou numa sequência de atropelos que convulsionou as rotinas dos funcionários e levou o diretor ao hospital, após uma crise de estresse. Passada a tempestade, e, com os ânimos um pouco mais arrefecidos, foi possível fazer uma análise aprofundada da situação, a qual resultou numa pauta de reivindicações que foi posteriormente entregue ao fornecedor do sistema ERP, localizado em Minas Gerais. Depois de fortes pressões, a software house mineira enviou para Belém o seu melhor técnico para evitar cancelamento de contrato ou algo mais sério. Como resultado, esse dito técnico fez em três semanas o que seus colegas não conseguiram fazer em cinco meses. Por conseguinte, o sistema funcionou a contento. Nesse caso, o motivo de tanta confusão estava na alta qualificação do staff da empresa paraense, que não aceitava de forma alguma um nível de resposta que ficasse abaixo dos seus rígidos padrões de excelência.

Nesse segundo caso, uma empresa comercial amazonense se viu embrulhada em sérios problemas derivados da aquisição de um sistema de gestão empresarial, cujo enredo é bem diferente da sua equivalente paraense. Por aqui, a coisa se enroscou bastante. Motivo da confusão: os técnicos da software house não eram suficientemente preparados para fazer a adequada implantação do sistema e também não conseguiam determinar a causa dos inúmeros conflitos entre os módulos do ERP. Por outro lado, o staff da contratante era incapaz de identificar com precisão as necessidades de controle, nem também possuía conhecimento suficiente para discutir erros e acertos do projeto. Dessa forma, expressivas deficiências aconteceram em ambos os lados do contrato (era a cobra cega lutando contra o sapo aleijado). Por isso, o imbróglio se intensificou, os resultados se mostraram insatisfatórios e o clima de estresse dominou todos os setores.

Num terceiro caso de implantação de sistema ERP, a contratante era consciente da deficiência dos seus processos operacionais e sabia que sua equipe não resistiria a uma mudança radical. O que foi feito então? Primeiramente, o diretor comprou um sistema bem simples e limitado, mas fácil de operacionalizar. Ao mesmo tempo, investiu em estrutura, tecnologia e na qualificação do seu pessoal. Após três anos de maturação, a nova cultura de controle criou as condições necessárias para se apostar num robusto sistema ERP. A mudança foi violenta, mas todos estavam preparados para os solavancos. Tanto, que a implantação do projeto ocorreu sem traumas e de acordo com o cronograma estabelecido no início dos trabalhos. Hoje, o ambiente profissional da empresa é totalmente diferente da lojinha de dez anos atrás. E a base dessa revolução está na qualificação da equipe de profissionais responsáveis pela fluidez dos processos e pela segurança das informações.

A qualificação profissional dos funcionários é determinante para o sucesso ou o fracasso de uma organização. Uma equipe capacitada e detentora de sólidos conhecimentos técnicos é a melhor proteção que uma empresa pode dispor para enfrentar os desafios diários, e também se defender de agentes externos maliciosos ou potencialmente virulentos. Esse paradigma é ainda mais urgente agora, em face dos sofisticados e invasivos controles eletrônicos impingidos ao contribuinte pelo Fisco. A gradual e constante automatização dos processos fiscalizatórios, combinado com a expansão da substituição tributária, vem secando a anteriormente torrencial fonte propinolítica. Por isso, os auditores fiscais estão padecendo de sérias crises de abstinência e ficando mais agressivos nas suas investidas aos contribuintes menos esclarecidos dos seus direitos e obrigações. Não são poucos os casos de achaques que resultam em prejuízos financeiros ou recolhimentos indevidos por falta de empregados tecnicamente capazes de questionar uma ação maliciosa do Fisco. Portanto, investir na qualificação dos funcionários é investir na proteção do patrimônio e na segurança dos negócios. 





terça-feira, 13 de setembro de 2016

ESTUDAR PRA QUÊ?


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 13 / 9 / 2016 - A267

O indivíduo passa a infância, adolescência e parte da vida adulta na escola, mas nada disso é suficiente para assegurar o domínio das competências demandadas pelo mercado de trabalho. Daí, que qualquer amadurecimento profissional é demorado e a tão almejada estabilidade financeira só é alcançada depois de grandes sacrifícios e muitos aborrecimentos. Em vista dessa situação esdruxula, o aluno recém-formado questiona: Afinal de contas, qual foi o motivo de ter passado tantos anos acordando cedo para frequentar a escola se toda essa bagagem de informações tem pouca utilidade prática? Por que tenho que aprender tudo do zero quando inicio a vida profissional? Por que a escola não me preparou para a realidade da vida profissional?

Quem passa anos estudando e praticando numa escola de música, aprende a dominar um instrumento musical de modo a nunca mais perder tal habilidade. É como dominar a arte de andar de bicicleta. Nesses dois exemplos, o aprendizado se transforma em conhecimento. Tal constatação nos convida a refletir sobre aquilo que o aluno leva para a vida inteira, na forma de conhecimentos, habilidades e competências. E também, deve-se considerar a formação do seu caráter e do seu discernimento. O decoreba e a pura repetição de coisas chatas só aborrece o aluno. Qual adulto, por exemplo, fixou regras das disciplinas de Física, Química ou Matemática? E quanto do que foi estudado é necessário para execução das tarefas diárias?

Antigamente, o professor era detentor quase que absoluto da informação. Era o único caminho possível do aprendizado. A nossa realidade atual quebrou o domínio feudal do professor; os alunos já podem explorar as infinitas possibilidades da internet. E não só lendo páginas e páginas de textos explicativos. O canal de vídeos YouTube  disponibiliza uma infinidade de aulas e demonstrativos de funcionamento de tudo que se possa imaginar. Portanto, o aluno minimamente curioso é capaz de engolir o professor. Outro detalhe: Os jovens foram arrebatados pelo furacão de informações dinamizadas da internet – eles vivem mergulhados num frenesi de eventos tecnológicos e compartilhamento de dados. Por isso, muitos deles detestam o marasmo de aulas chatas porque já sabem que é perda de tempo. O jovem quer dominar as tecnologias e enriquecer cedo. Ele abomina a ideia de ficar refém de um chefe tirano ou de trabalhar feito um condenado para ganhar uma mixaria.

Alguns pais chegam a pensar: Meu filho tem doze anos de idade. Portanto, vamos estudar um tema específico em conjunto por seis anos para que, quando concluir a faculdade, ele possa ter plenas condições de passar num belo dum concurso público. Ou então, vou matricular meu filho numa conceituada escola de tecnologia para ele montar o próprio negócio assim que chegar à maioridade. O importante é aproveitar o tempo para desenvolver as habilidades requeridas pelo mercado e aproveitar as diversas oportunidades de ganhar dinheiro. Famílias de advogados, normalmente, começam cedo a preparar os filhos, assim como engenheiros ou empresários, porque sabem que o tempo é valioso. Esperar a idade adulta para começar algo novo é perder anos de vida.

Voltemos à escola. É salutar que os pais façam uma reflexão sobre o papel da escola e o que, afinal de contas, seus filhos estão fazendo lá. É importante promover uma grande discussão sobre o assunto. Até mesmo os estudantes de cursos superiores precisam questionar o conteúdo pedagógico junto à diretoria da sua instituição de ensino. Anos e mais anos de aula é suficiente para entregar um profissional competente ao mercado de trabalho. Mas, na prática, as pessoas se veem obrigadas a ingressar num curso de pós-graduação. E depois, novamente, buscar cursos livres porque não preenchem os requisitos necessários dum mercado exigente.

Voltemos ao professor. Seu papel deixou de ser um repassador de informações para se concentrar na missão de fixar conhecimentos, desenvolver habilidades e influenciar o engrandecimento da conduta moral e crítica dos alunos. Lamentavelmente, poucos conseguem fazer isso. 





quinta-feira, 8 de setembro de 2016

SISTEMA MUITO ELÁSTICO


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 9 / 9 / 2016 - A266
Artigos publicados

O cargo de vereadora na cidade de Dracena foi conquistado com apenas um voto pela candidata Aline de Oliveira. Esse é apenas um exemplo de como funciona o nosso conturbado ambiente legal. Desde o agitado escândalo do Mensalão, passando pelo rebuliço da Lava-Jato e agora com a farsa do Impeachment, o país vem aos poucos enxergando cada uma das facetas que compõem o nosso sistema político e, de quebra, o enrosco normativo de um sistema jurídico entulhado de gambiarras e altamente vulnerável aos interesses daqueles que se colocam acima da lei. Na verdade, já de muito tempo estamos vivenciando uma permanente convulsão interpretativa da legislação por causa de disputas políticas. Toda essa beligerância irresponsável aprofunda o nosso agudo quadro de insegurança jurídica, e consequentemente quebra as pernas dos agentes econômicos. Efeito imediato de tantos desmandos: investimentos congelados, desemprego em alta, arrecadação em baixa, degradação social etc.

Quando todo mundo aguardava o desfecho do impeachment para respirar uma atmosfera mais aliviada de poluentes ideológicos, eis que os senadores resolveram costurar um acordão na frente das câmeras de TV, de tal sorte que a Constituição Federal ficou posicionada dois níveis abaixo do Regulamento Interno do Senado. Daí, que, discussões sobre isso e aquilo, certo e errado, legal e ilegal, polarizaram debates inflamados de gente que pouco se importa com a estabilidade do país.

Na época do escândalo do Mensalão, os famosos Embargos Infringentes, escarafunchados nos subterrâneos interpretativos do STF, confirmaram a tese espantosa de que tudo pode ser ajustado às conveniências do momento. A elasticidade do sistema é tamanha que nada é o que parece ser. Em outras palavras, no Brasil, a lei é feita para os outros. Até mesmo a teledramaturgia corrobora com essa lamentável constatação. Na minissérie Justiça, uma renomada professora de Direito é totalmente descrente do sistema. Produções desse tipo deixam o telespectador ainda mais amargurado e desesperançado.

Temos agora uma nova palavra de grande impacto semântico, que é FATIAMENTO. O tal fatiamento da votação no Senado criou um esdruxulo imbróglio jurídico que agravou ainda mais o já elevado nível de incerteza quanto à solidez das nossas instituições. Representantes políticos de todos os matizes enlouqueceram depois do histórico 31 de agosto, adicionando mais demandas judiciais à já abarrotada Corte Suprema. O pior de tudo é que o chafurdo legal, temperado com diversas manobras espúrias, fragilizaram por demais a imagem do STF. A inquietação de diversos setores da sociedade é intensificada pelo excesso de manifestações públicas de Ministros do Judiciário, de tal modo que suas opiniões pessoais são transformadas em fofocas de comadres por grande parte da mídia sectária.

É justamente nesse cenário desolador que se encontra o setor produtivo. As empresas estão atoladas no ardiloso pântano de regulamentações desencontradas, e, dessa forma, sujeitas a todo tipo de intempéries e humores dos agentes públicos. Qualquer pessoa minimamente esclarecida sabe muito bem que lei nenhuma merece confiança e que, por isso mesmo, teme ser envolvida em alguma demanda judicial. Dentre tantas regulamentações, as normas tributário/fiscais são as mais perigosas. O monumental agigantamento de obrigações superpostas e repetitivas gera uma burocracia indecifrável, que no final das contas, confere superpoderes ao Fisco. Esse perverso sistema inviabiliza qualquer tipo de medida profilática que possa manter o patrimônio a salvo das investidas de agentes maliciosos.

A legislação tributária é uma cria do nosso conturbado ambiente legal. Daí, que nenhuma regra possui clareza suficiente para esgotamento das dúvidas relacionadas à operacionalização do texto normativo. De certa forma, o empresariado tem sua parcela de culpa na criação desse monstrengo por ter deixado a coisa chegar nesse ponto. Essa mesma classe empresarial pode exigir racionalidade e clareza dos legisladores tributários. Basta tomar uma atitude coordenada entre todas as entidades representativas do setor produtivo.