segunda-feira, 26 de junho de 2017

PARADOXO DO SIMPLES


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 27 / 6 / 2017 - A299

O artigo primeiro da Lei Complementar 123 estabelece tratamento diferenciado e favorecido às microempresas e empresas de pequeno porte no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. A alínea “a” do inciso XIII do parágrafo primeiro do artigo décimo terceiro enquadra as empresas no regime de substituição tributária e tributação monofásica; a alínea “h” obriga as empresas ao pagamento do diferencial de alíquota, que é a famigerada antecipação do ICMS que não pode ser utilizada como crédito, tal qual acontece nos outros regimes.

Até os cachos de tucumãs pendurados lá no mato sabem que a estrutura normativa do Simples Nacional é um troço caótico que desmantela a legislação dos outros regimes. Além do mais, o legislador vive mexendo e remexendo nas regras desse enigmático sistema.

Altos funcionários de agências fazendárias, contadores, tributaristas etc., normalmente têm posicionamentos razoáveis sobre diversas questões fiscais, mas no momento em que o tal do Simples entra no circuito, o raciocínio é desmantelado.

Talvez a raiz de tantos problemas esteja na fúria arrecadatória do Fisco combinada com a epidêmica demagogia dos governantes. Ou seja, fez-se um estardalhaço midiático na época da instituição do Simples para angariar dividendos políticos. Por outro lado, era preciso manter o nível de arrecadação. Para concretizar tal proeza, os chefões do poder executivo lançaram mão de habilidades engenhosas, próprias dos alquimistas legislativos. Prevaleceu assim a velha malandragem de fazer não fazendo; dizer não dizendo, típico da nossa gestão pública. Por isso é que muitos empresários tomam um susto danado quando entram no sistema achando que pagariam pouco imposto. O cinismo normativo é tão escarnecedor que a grande empresa pode ser ressarcida pela antecipação do ICMS, mas a microempresa, não. Na realidade, o dito tratamento diferenciado constante na LC 123 é uma fraude acintosa porque a Sefaz notifica todo mundo da mesma forma. Por exemplo, 40% da nota fiscal de café são transformados em ICMS(ST) a ser recolhido para os cofres da Sefaz. Tem mais aberrações. A Resolução GSefaz 31 contém produto com MVA de 254%; o produto alimentício do item 24 do Anexo IIA é taxado a inacreditáveis 328%. Por conta de tantas escabrosidades, os anexos da LC 123 tem apenas uma função prestidigitadora, visto que o custo do empresário é dez vezes maior do que os percentuais ali contidos.

Os anexos da LC 123 nos convidam a uma reflexão curiosa. Afinal de contas, os tributos sobre consumo são do produto ou são do comerciante/industrial? Os tributos próprios do empresário são aqueles relacionados à renda, patrimônio ou seguridade social. ICMS, PIS, COFINS e IPI são impostos repassados ao consumidor, que os pagam no momento em que adquire produtos em estabelecimentos mercantis. A proposição do Simples passa a mensagem de que os tributos sobre consumo não são pagos pelo consumidor e sim, por quem os produz ou comercializa. Tal paradigma é consequência dum sistema que esconde da população a carga tributária incidente sobre tudo que é consumido. Esse tortuoso modelo é uma fonte inesgotável de imbróglios normativos que acaba fomentando uma burocracia infernal. Se o imposto fosse separado do produto haveria bem menos possibilidade de sonegação, mas também desencadearia uma guerra civil nesse país. Motivo: o povo saberia que metade da sua renda é confiscada pela Sefaz, que posteriormente entrega o dinheiro aos corruptos. O quadro terminal do Rio de Janeiro é um retrato indelével dessa prática.


Se o custo tributário elencado nos Anexos da LC 123 fosse o único suportado pela pequena empresa, o produto por ela comercializado ficaria 30% mais barato do que o preço praticado por um concorrente enquadrado no regime do lucro real. A antecipação do ICMS reduz essa diferença para 20% e a substituição tributária torna o produto somente 10% mais barato. Os preços se nivelam na ocorrência simultânea da cobrança monofásica com substituição tributária. Desse modo, a pequena empresa paga tudo antecipadamente e ainda paga mais quando emite a guia de recolhimento DAS. Enquanto isso, a politicada vive na eterna discussão sobre a utópica reforma tributária que NUNCA sairá do papel. Esculhambação, teu verdadeiro nome é Brasil.






















SOLICITE UM ORÇAMENTO


terça-feira, 20 de junho de 2017

SOPA DE RAPADURA DEFUMADA


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 20 / 6 / 2017 - A298
Artigos publicados

Eis que o cliente pergunta ao garçom: – O que temos pra hoje? A resposta deixa o estômago assustado. – Nosso cardápio especial contempla jiló empanado na banha de caititu, sopa de rapadura defumada, chibé acebolado, maniçoba flambada no corote e salada de urtiga agridoce. Para sobremesa, você pode saborear o nosso delicioso picolé de chuchu diet ou experimentar a maravilhosa gelatina de quiabo. Pois, pois... É esse o exótico cardápio político apresentado ao povo amazonense, o qual terá a enfadonha missão de escolher o próximo governador nas eleições suplementares que se avizinha. O tempo passa, os escândalos pipocam na mídia, delatores rasgam a barriga do submundo político, milhões de protestos fervilham nas redes sociais, mas o caquético e anacrônico jogo político se mantém inabalável. É possível até que determinado candidato seja uma excentricidade, por fugir do centro vicioso. Mas, infelizmente, falta clareza do tino à grande massa de votantes, o que nos leva a permanecer estacionados no vergonhoso atraso civilizatório da corrupção, da incompetência e do descaso. Gerações vêm e vão enquanto o porto de lenhas reforça a máxima de que nunca será Liverpool. Os políticos amarram o progresso.

Nada de novo sob o sol.

Carrancas deslavadas, vernáculo desconstruído pelo cinismo, gestos mancos, teatralismo desconcertante e justificativas embaraçosas. Esses são os elementos-chave que estão pautando a largada da campanha para ocupar o posto máximo do governo estadual. Impressiona o fato de ninguém trazer uma proposta inovadora – tudo é muito surrado e puído pela mesmice. Mas um detalhe sutil pode ser observado pelo espectador mais atento: Trata-se duma persistente expressão de constrangimento estampada no semblante dos oradores. Isso é um indicativo do poder das redes sociais. Significa que boa parte dos eleitores já consegue enxergar além da máscara. Pena que a maioria continua mergulhada no pântano da ignorância. Tragicamente, é esse povo sem discernimento que define os rumos da nação amazonense. É pra eles que o político fala.

A razão do dito constrangimento está na completa demolição do sistema político. Os ocupantes dos cargos públicos superiores vivem dias sombrios e cheios de incertezas quanto ao modelo estabelecido. Isto é, não se sabe o que virá depois do terremoto precedido pelo dilúvio de acusações represadas numa muralha prestes a desabar. A operação Lava-Jato estabeleceu o paradigma da culpabilidade, que antes era uma peça de ficção científica. É bom lembrar que até pouco tempo atrás, o corrupto tinha plena e absoluta certeza da impunidade. A moda agora é prender corruptos e corruptores. E, claro, como é público e notório, toda gestão é cheia de pecados cabeludos porque o sistema inteiro foi moldado pelas mãos da corrupção. Se a condenação alcançar tudo quanto é ladrão do dinheiro público, será preciso decuplicar a oferta de vagas nas penitenciárias.

A roubalheira brasileira é um fenômeno sem precedente na história humana. É muito ladrão, ladrão, ladrão, ladrão, ladrão na gestão pública. Parece que toda ação pública está vinculada a algum tipo de esquema criminoso. Os antropólogos já podem estudar essa nova espécie: o “homo corruptus”.

O tal “homem da mala” flagrado pela Polícia Federal roubando 500 mil reais já teve sua imagem massacrada ao extremo pelo linchamento incessante dos canais midiáticos. A pergunta que se faz é a seguinte: Como a família desse político está administrando toda essa situação? Mãe, pai, irmãos, tios, sobrinhos, primos, cunhados, amigos; como esse povo todo está tocando suas vidas? Como fugir dos olhares, das perguntas e das censuras? Será que a família encara tudo isso como algo normal, tipo, ossos do ofício? Ou será que os parentes são tão bandidos quanto o tal protagonista midiático? Será que a professora do filho do corrupto é também bandida? Ou será que ninguém tem vergonha na cara?

Na prática, ser parente de político é pior do que ser parente de pistoleiro ou de traficante. O estrago que a politicada faz é 200 vezes pior do que a soma de todos os crimes pavorosos de latrocínio, tráfico, explosão de banco etc. Por isso, a corrupção deveria ser legalmente classificada como o mais hediondo dos crimes.
















terça-feira, 13 de junho de 2017

UM BANNER TRIBUTÁRIO EM CADA LOJA


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 13 / 6 / 2017
Artigos publicados

O ICMS é o mais perverso dos tributos porque penaliza o mais pobre. Os tributos indiretos (ICMS, PIS, COFINS, IPI) esmagam sem piedade o já minguado salário do trabalhador. Não fosse tanto imposto embutido nas mercadorias, o cidadão poderia levar o dobro de coisas pra casa. O dinheiro dos impostos que financia a ineficiência e a corrupção é tirado da mesa das famílias, as quais acabam passando necessidade. Não fosse tanto imposto, essas famílias poderiam ter uma alimentação de melhor qualidade e um padrão de vida superior. A parte mais cruel dessa história está na tumultuada política de concessão de incentivos fiscais destinada aos mais ricos, que acabam pagando muito menos do que deveriam. Nos Estados Unidos a coisa é toda ao contrário. Lá, o governo, praticamente, não cobra imposto da alimentação e de alguns produtos básicos, justamente para poupar os menos favorecidos. Por outro lado, o rico paga seu imposto direitinho para não correr risco de passar dois anos enjaulado. Por aqui, a operação Lava-Jato/Zelotes escancarou as artimanhas utilizadas pelos grandes conglomerados econômicos para fugir dos impostos. E claro, se o rico não paga, alguém tem que pagar. Por tal motivo o pobre sofre feito um condenado. A Sefaz não poupa nem a papinha do bebê. E não adianta nada o bebê chorar.

Pois é.!! Não bastasse tudo isso, a Sefaz/AM aumentou a alíquota principal do ICMS, ajustou a MVA da substituição tributária, majorou a carga de alguns produtos etc. O nosso ente fazendário estadual pegou carona na onda de majorações que dominou o país numa época de crise aguda da economia. Em vez de ter escolhido o caminho mais fácil, a Sefaz/AM poderia ter aprimorado seus instrumentos de inteligência fiscal, que, por enquanto, ainda são muito tímidos. Um Núcleo de Investigação Fiscal turbinado é capaz de desbaratar meio mundo de práticas tortuosas ou de falhas que prejudicam o erário. É imperioso que se dê mais atenção para essa área estratégica, mesmo porque, já se sabe que mecanismos de inteligência fiscal bem administrado podem até mesmo concretizar a tão sonhada justiça fiscal. A raiz de todo o mal está nas exceções e nos desdobramentos infinitos das normatizações legais. O estado do Ceará é um excelente benchmarking. Se a inteligência fiscal da Sefaz/AM fosse mais inteligente, não haveria empresa com dívida na casa do bilhão (6). Claro, há de se reconhecer que o nosso ambiente legal dificulta sobremaneira o trabalho das execuções fiscais, e, com isso, acaba favorecendo os espertinhos. Conclui-se assim que o mundo é dos espertos: quem tem bons advogados paga pouco; quem entra na onda dos “esquemas” não paga nada.

O sistema judicial brasileiro está permanentemente inclinado para o lado de quem tem dinheiro e poder. O julgamento da semana passada no TSE expôs as vísceras putrefatas dos tribunais, os quais estão besuntados com a mesma lama do sistema político. Essa dita “inclinação” também acontece em TODAS as instâncias e esferas da administração pública. Vivemos uma grande fraude legal, onde o belo e erudito vernáculo jurídico serve unicamente para ornamentar discursos demagógicos endereçados aos incautos e tapados que não conhecem o lado negro da força.

Os comerciantes precisam contar para seus consumidores toda essa história escabrosa de abuso tributário. Cada comerciante deveria pendurar um banner bem grande no meio da loja que mostre para o consumidor a carga tributária de alguns dos seus produtos. O consumidor precisa saber que 72% do valor do vídeo game vão direto para o governo. O povo precisa saber que metade do refrigerante é puro imposto. De tanto ver banner após banner o consumidor iria gradualmente tomando consciência do perverso sistema tributário que mata sua família. Portanto, é preciso trazer a sociedade para o centro da discussão.

A Lei 12741/2012, que deveria tornar público a carga tributária embutida no preço dos produtos, foi implementada de forma a ter os seus efeitos neutralizados. Explica-se. Nos Estados Unidos, o preço do produto e seu respectivo imposto são informados separadamente ao consumidor. Aqui, no Brasil, a coisa toda acontece de modo enigmático. A informação do cupom fiscal é muito técnica e fraudulenta porque o consumidor compra uma coisa travestida de outra; compra imposto travestido de produto porque a etiqueta do preço só possui uma informação. Por isso é que o Banner se faz tão necessário. 






terça-feira, 6 de junho de 2017

SANEAMENTO DO AMBIENTE POLÍTICO


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 6 / 6 / 2017

Rios que por décadas receberam toneladas de esgoto acabaram por expulsar toda forma de vida saudável para o ser humano, restando apenas coisas asquerosas e nojentas, como vermes, lesmas, bactérias e pragas diversas. Ao longo das margens, outras criaturas repugnantes completam o pacote: ratos, baratas, urubus etc. Resgatar cursos d’água estragados pela poluição intensiva é uma verdadeira epopeia. A colossal tarefa de despoluição do rio Tâmisa (apelidado de O Grande Fedor) só se tornou possível devido ao esforço conjunto das autoridades inglesas. Mesmo assim, foram necessários 120 anos de investimento pesado para permitir o retorno de uma imensa quantidade de espécies de peixes antes dadas como desaparecidas. A emblemática recuperação desse rio poderia ser interpretada por muitos como um avanço civilizatório, uma vez que o povo deixou a podridão lá atrás, nos sombrios e fedorentos anos de desgraças sociais. A sociedade paulistana ainda se debate com o problema do rio Tietê, indicando assim que a solução está muito longe de ser alcançada.

Novamente, o assunto impeachment ocupa o noticiário nacional, entupindo a internet com justificativas para sua efetivação. De fato, o Brasil está mergulhado numa crise política de proporções assustadoras. E os incessantes escândalos não dão um minuto de trégua para o governo nem descanso para uma população atônita de tanta roubalheira. Por certo, os nossos homens públicos estão mergulhados num fedorento lamaçal de vermes, lesmas, bactérias e pragas diversas. Trocando em miúdos, um ambiente tão cáustico e inóspito que somente ratos, baratas e urubus se sentem bem acomodados. O bombardeio diário não dá fôlego nem espaço para reformulações de discursos governamentais ou construção de propagandas televisivas destinadas a confundir o telespectador. As pessoas estão entorpecidas de frustração e ao mesmo tempo consumidas pela desesperança de um dia ver o poder público livre da corrupção. Ou seja, pelo andar da carruagem ninguém em sã consciência consegue enxergar uma saída para a enrascada que o governo se meteu. O estrago está feito; o leite derramou.

O brasileiro simplesmente não tem opção. Se sairmos do fogo vamos cair numa frigideira de óleo quente, uma vez que o substituto imediato do chefe da nação é tão ou mais asqueroso. O outro comandante do congresso nacional é mais um famigerado personagem que se sujou completamente perante a nação. Dessa forma, há de se questionar o deteriorado caráter dos nossos homens públicos. Parece que nada de bom pode ser aproveitado; como se tudo fosse farinha do mesmo saco. Outro fato que merece reflexão: Todo brasileiro é bandido ou somente o bandido abraça a causa pública? Muita gente diz que pessoas sérias e honestas costumam fugir de tudo que envolve assuntos políticos, tentando assim não se contaminar com gente corrupta. É o que se pode chamar de vício inerente. Traduzindo, uma coisa é parte inseparável da outra.

Alguém pode perguntar: “Onde estão os homens bons?” Outros podem dizer: “Em vez de reclamar, por que não participar ativamente do sistema político partidário?” A resposta pode está no fato de que um peixe sadio colocado no rio Tietê morreria em pouco tempo. A sujeira do ambiente é tamanha que mesmo toneladas de peixes saudáveis não seriam suficientes para acabar com a poluição. O procedimento correto a ser adotado é: LIMPAR O RIO. À medida que a sujeira for saneada os peixes naturalmente voltariam para um ambiente mais saudável, mais habitável. E graças aos céus é isso que no momento estamos vivenciando no Brasil. Todo esse turbulento processo de investigações e encarceramentos é fundamental para conferir um choque de realidade aos corruptos. É como utilizar dois litros de creolina para limpar um banheiro emporcalhado. Esse é o caminho. Vamos rezar todo dia para que as forças sombrias da nossa política não quebrem o andamento dos trabalhos da Polícia Federal e, principalmente, do Juiz Sérgio Moro. Sabemos nós que o alvo da operação Lava Jato é uma corja de bandidos poderosos e altamente entranhados em tudo quanto é instância e esfera do poder estatal. Só Deus sabe o tamanho e a amplitude dos esquemas criminosos que dominam as relações entre o público e o privado.


A sociedade inglesa levou 120 anos para se livrar da sujeira do rio Tâmisa. Nós começamos há pouco tempo o nosso processo de efetivo combate à corrupção. Se quisermos de fato uma sociedade mais justa, poderemos sanear o nosso ambiente político num espaço de tempo não tão longo. Somente um ambiente político saudável poderá despertar o interesse dos homens verdadeiramente honestos e competentes. Só depois disso é que daremos o nosso salto civilizatório.


CLIQUE NA IMAGEM