segunda-feira, 21 de setembro de 2020

REFORMA TRIBUTÁRIA IMPROVÁVEL


 
Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio  dia  22 / 9 / 2020 - A412
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As últimas semanas foram marcadas pelo arrefecimento das discussões envolvendo reforma tributária, que perdeu espaço para outro assunto igualmente polêmico, que é a reforma administrativa. Pode-se até imaginar que a reforma administrativa foi jogada no picadeiro midiático para a equipe econômica poder reavaliar com calma os aspectos controversos da proposta de reforma tributária. Na verdade, somente juntar Pis Cofins não reforma sistema nenhum. E ainda por cima, essa ideia de jerico se transformou numa grande piada que evidenciou o completo despreparo do governo.

Até os cachos de tucumã sabem que o Brasil precisa urgentemente desonerar a produção e estabelecer um único imposto indireto (por fora) que seja normatizado por legislação federal. Se isso não for politicamente viável, que então se estabeleça uma categoria de produtos sujeitos a tributação federal e que os demais paguem um tributo estadual. O importante é que se acabe com a malfadada incidência de várias taxações sobre a mesma base. E também que seja extinto o diabólico modelo de imposto “por dentro”.

Se houvesse algum indício de civilidade na alma brasileira, o próximo sistema tributário segregaria imposto de produto. Sabemos que isso nunca vai acontecer porque é exatamente esse regramento que protege os ricos e massacra os pobres. E, claro, os ricos vão manobrar os poderes da república na direção dos seus interesses. O próprio ministro Paulo Guedes não esconde sua inclinação para os ricos.

Pois é. Só Deus sabe o que se desenrola nos bastidores do poder. Como disse o estadista Otto von Bismarck, se o povo soubesse como são feitas as leis e as salsichas, não dormiria tranquilo.

Reforma tributária nenhuma vai passar no congresso nacional, uma vez que o modelo atual está profundamente enraizado no sistema econômico do país. Esse enraizamento contempla a proteção dos poderosos, o endeusamento do Judiciário, o fortalecimento duma vasta rede de corrupção e o inchaço da máquina pública. Se uma verdadeira reforma tributária acontecer, o volume de processos judiciais vai despencar, o corrupto que se esconde na sombra da burocracia vai definhar, a máquina fazendária vai emagrecer e as consultorias que se alimentam da lama burocrática vão minguar. Inclusive, é sempre bom lembrar que o Poder Público é uma coisa só; não há distinção entre executivo, judiciário, legislativo, ministério público, TCU, TCE etc. O poder público sempre atua em bloco para proteger seus pares e assim trabalhar em conjunto no sangramento do particular. Tal comportamento fica muito claro nas pouquíssimas condenações de corruptos e de corruptores. Todos sabemos que menos de 1% dos bandidos travestidos de funcionários públicos vão para a cadeia. Os raríssimos condenados cumprem prisão domiciliar em mansões compradas com dinheiro roubado dos impostos. É uma grande farsa, portanto, a ideia de “instituições públicas independentes”, visto que todo mundo é mancomunado com todo mundo; uma verdadeira orgia descarada.

As pessoas mais atentas já estão se preparando para uma reforma de mentirinha que não vai separar imposto de produto, que não vai estabelecer um único tributo sobre consumo, que não vai cortar 90% das normatizações conflituosas, que não vai mexer no sistema corrupto fazendário; enfim, que vai piorar o que já está ruim.

De todas as perversidades do nosso sistema tributário, a pior delas reside no tal imposto “por dentro”, que dificulta por demais a identificação do crime de apropriação indébita. Se esse modelo atrapalha o serviço da Sefaz, por outro lado, escraviza o cidadão comum que não é informado do que é produto e do que é imposto antes de passar no caixa. E se o comerciante se atrever a fazer essa separação, a Sefaz manda prender o criminoso que não embutiu o ICMS no preço para depois cobrar novamente ICMS. Na verdade, a Sefaz que já tratava qualquer empresário como bandido, agora quer usar uma decisão do STF para prender o cidadão trabalhador. A Sefaz arranca na base da força policial o dinheiro do contribuinte para entregar aos corruptos que nunca são punidos, já que todo mundo é amiguinho de todo mundo. Pois é. Estamos ferrados e mal pagos. O Brasil, simplesmente, é o paraíso da esperteza. E o poder público é uma fonte maligna de tudo que não presta. Curta e siga @doutorimposto




































terça-feira, 15 de setembro de 2020

Gestão fiscal e sangramento do caixa


 
Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio  dia  15 / 9 / 2020 - A411
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As questões fiscais estão pautando toda ação empresarial. Isso significa que cada passo e cada decisão segue um caminho desenhado por análises tributárias consistentes e capazes de apontar irregularidades ou armadilhas perigosas. Com esse mapeamento em mãos, a empresa poderá desenvolver suas operações com mais segurança e dinamicidade. Tais cuidados são imprescindíveis, em face do pantanoso ambiente normativo que nos cerca. Trocando em miúdos, as empresas são duramente bombardeadas pela colossal estrutura de regramentos infinitamente detalhados, conflituosos e extremamente judicializados. Ou seja, tudo é muito subjetivo, interpretativo e arriscado. Esse quadro apocalíptico empurra muita gente para o campo da ilegalidade, onde os pequenos aprendem na marra a fazer malabarismos fiscais para sobreviver. Por outro lado, os grandes apelam para o tráfico de influência, aliciamento de autoridades etc. Isso acontece porque ninguém consegue cumprir rigorosamente uma legislação sem pé nem cabeça.

Lamentavelmente, todo aquele que não decifrar o enigma tributário será fatalmente devorado pela esfinge fazendária. Isso ocorre porque meio mundo de fenômenos operacionais carece de normatização específica, jogando as empresas bem intencionadas no inferno da dúvida. Decifrar, portanto, significa definir uma política fiscal que congregue o máximo possível de respostas para as dúvidas cotidianas. É salutar que a empresa busque sustentação legal das suas operações, principalmente aquelas que fogem da trivialidade. E que formalize tudo isso num manual de procedimentos internos.   

Enquanto o contribuinte é queimado na fogueira da dúvida, os agentes públicos refestelam-se sobre a desgraça alheia com pressões, ameaças, achaques e punições variadas. Tanto subjetivismo legal já enriqueceu muito bandido travestido de agente da lei. Basta observar o noticiário que não cansa de mostrar a corrupção entranhada até o osso das instituições brasileiras. Portanto, é fundamental buscar todos os meios possíveis de se defender desse sistema diabólico. E o caminho está numa boa gestão fiscal.

Pra começo de conversa, a empresa situada na ZFM deve orientar seu fornecedor sobre a aplicação correta das desonerações previstas no Convênio ICM 65/88 e na Lei 10996/2004, que muita gente conhece por desconto Suframa. Vamos tomar como exemplo, a aquisição de mercadoria nacional dum fornecedor Lucro Real localizado em São Paulo. Na emissão da NF, Pis Cofins devem ser retirados da formação de preço, o que reduz a base do ICMS. Desse modo, quando posteriormente o ICMS é abatido do valor do produto, o total da NF fica 19,65% menor. Se o fornecedor apenas descontar ICMS, o percentual fica em 7%. Se o fornecedor somente abater os três tributos sem mexer na formação do preço, o desconto fica em 16,25%. E se for concedido desconto apenas de Pis Cofins, o percentual fica em 9,25%. Tome um volume astronômico de compras erradas e imagine o tamanho do prejuízo. Daí, que é preciso ajustar a sintonia com o fornecedor para garantir a plenitude desses benefícios fiscais.

Outra fonte de sangramento do caixa está na falta de previsão legal para operações incomuns, onde a Sefaz aplica sansões ou taxações indevidas. Nesse caso, a empresa deve agendar uma reunião com o subsecretário para solicitar mudança legislativa, regime especial etc. Inclusive, toda vez que algum processo ficar emperrado em qualquer setor, o contribuinte deve dizer para o funcionário responsável que agendará uma audiência com o subsecretário para exigir uma resposta. É só fazer isso que o processo passa a tramitar com mais velocidade.

Mesmo sendo trabalhoso, é fundamental implementar uma rigorosa gestão de produto. Isto é, cada produto deve estar com seu cadastro minunciosamente parametrizado com todas as tributações de entrada e de saída: com previsão de venda interna, interestadual, para áreas incentivadas etc. Deve-se dar atenção especial para a movimentação de mercadorias gravadas com substituição tributária do ICMS. Também, é super importante mapear tudo que esteja sujeito a qualquer enquadramento tributário diferenciado. Essa gestão de produto contempla também o gerenciamento eficiente das reanálises envolvendo cobranças indevidas lançadas no DTE.

O espaço dessa coluna é muito pequeno para detalhar a quantidade de procedimentos necessários duma gestão fiscal. Muita gente pode achar que é tolice, gastar tanto dinheiro com exageros burocráticos. Mas, infelizmente, a escolha envolve organizar a estrutura fiscal ou então passar o tempo todo na corda bamba. Curta e siga @doutorimposto





























terça-feira, 1 de setembro de 2020

NADANDO COM OS TUBARÕES FAZENDÁRIOS


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio  dia  1 / 9 / 2020 - A410
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Em meio ao turbilhão de discussões envolvendo reforma tributária, a PEC45 resplandece impávida pela força dos seus idealizadores. Essa proposta nasceu no coração do Centro de Cidadania Fiscal, cujos representantes maiores são três brilhantes e poderosos articuladores da retórica fiscal: Nelson Machado, Eurico de Santi e Bernard Appy. Este último, esgrima um conjunto de argumentos majoratórios com tal habilidade que dificulta a contestação dos opositores bem informados e bagunça o raciocínio dos ineptos. Todo esse poder foi construído ao longo dum processo de estudos e de numerosos debates que permitiram dissecar o sistema tributário brasileiro. O triunvirato se movimenta com destreza porque conhece a malícia e as idiossincrasias que há por trás de tanta normatização enigmática. E como disse o icônico orador Maurice Garçon, a arte da palavra é a mais enganadora de todas. Pois é. O pessoal do CCIF está se valendo do prestígio adquirido para defender seus patrocinadores: Ambev, Braskem, Carrefour, Coca-Cola, Huawei, Itaú, Natura, Raízen, Souza Cruz, Vale e Votorantim. Essa turma endinheirada é contra o modelo progressivo, e por tal razão manobra a fauna política para dourar a pílula amarga do brutal aumento da carga sobre serviços. A ideia central é continuar protegendo os grandes rendimentos que pagam somente 7% de IR, conforme estudo da Professora Maria Helena Zockun (USP). Se houvesse um eficiente movimento para diminuir a brutal carga do consumo, fatalmente, os magnatas teriam que pagar mais imposto de renda. E é justamente isso que os patrocinadores do CCIF mais temem.

Na verdade, o CCIF joga o legítimo jogo democrático ao defender seus interesses no ambiente apropriado, que é o Congresso Nacional. E onde está o problema? O problema está nos grupos divergentes que não possuem a mesma capacidade de organização. Os embaixadores do setor de serviços, por exemplo, não trabalharam numa contraproposta com esmero semelhante ao do CCIF; o que fazem, muitas vezes, é se deter em reclamações que são em grande parte desprovidas de estofo técnico. As fragilidades, portanto, obscurecem pleitos legítimos de quem não sabe lidar com tubarões experientes. Diversos outros posicionamentos das mais variadas categorias econômicas figuram no palco da reforma tributária, mas poucos grupos encaram o assunto com o profissionalismo do CCIF.

Pode parecer uma comparação leviana, mas a coisa de desenvolve da seguinte forma: Vamos imaginar que numa determinada reunião alguém diz que será preciso enviar uma equipe de astronautas para Marte, onde o colega sugere contratar o Seu Zé da esquina para fazer uma nave espacial rapidinho. Por incrível que pareça, é desse modo que funciona o cérebro de muita gente que encara tudo com uma simplicidade prosaica.

Em vez de apelar para discursos barulhentos, os grupos empresariais deveriam copiar o CCIF. Ou seja, as entidades unidas por interesses comuns deveriam possuir um robusto e potente centro de estudos tributários que fosse capaz de confrontar tubarões famintos para não morrer no tabuleiro de negociação. Com isso, os representantes empresariais andariam sempre municiados de potentes argumentos técnicos. 

A Sefaz AM, por exemplo, fica mansinha quando discute pleitos com um empresário bem informado. Inclusive, o dono de um grande atacarejo faz sucesso na Sefaz pelos conhecimentos tributários que tornam suas reivindicações mais palatáveis. Agora, quando o pleiteante transmite desconhecimento tributário, a Sefaz desfia um corolário tecnicista que acaba neutralizando demandas justas e urgentes. Na verdade, a Sefaz se diverte com situações rocambolescas.

Sabemos que o peso das responsabilidades suportado pelo empresário é muito grande. Por tal motivo, ele departamentaliza suas operações para conseguir focar no cerne do negócio. Mas, infelizmente, o assunto tributário requer profunda dedicação. Ainda mais agora, que só se fala em reforma tributária. O momento é de se alinhar com o contador, passar horas no Youtube e buscar outros meios de aprendizagem. Curta e siga @doutorimposto