quinta-feira, 21 de julho de 2022

TREINAMENTO É CARO?


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio  dia   26 / 7 / 2022 - A458
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Semanas atrás, estive numa pequena empresa para revisar notificações da Sefaz, onde observei que, apesar do porte modesto, havia gerenciamento fiscal realizado com dedicação e perseverança. A funcionária que cuida dos assuntos tributários é recém formada em contabilidade e mesmo assim já domina questões complexas e desafiadoras. Pra se ter uma ideia do porte, o DAS mensal é menor que R$ 10 mil. Outro detalhe curioso: o dono, na medida do possível, investe em treinamentos tributários.

Faz um bom tempo, a Global Refrigeração me contratou para implantar uma contabilidade gerencial com fechamento diário. Esse trabalho se desdobrou em vários outros, provocando um efeito cascata que modificou profundamente a gestão interna e a visão estratégica do proprietário, senhor Cleverson, que hoje gerencia seu negócio com habilidade superior à de muitos grandões da nossa cidade. O dono dessa empresa também investe bastante dinheiro em treinamento.

Mais um caso emblemático aconteceu no final do ano passado, quando fiz o mapeamento fiscal dos produtos da Casa dos Motores. A combinação desse mapeamento com muitos treinamentos e serviços de consultoria provocou um choque de gestão empresarial, onde a proprietária, senhora Simone, melhorou substancialmente o modo de conduzir seus negócios, sendo que se mantém firme no propósito de cumprir a normatização fiscal. Inclusive, sua equipe de funcionárias é extremamente competente.  

Agora vamos para o lado oposto. Recebi um convite para ministrar os treinamentos ICMS básico e ICMS-ST. Como se tratava duma empresa famosa e robusta, concedi um desconto expressivo mediante expectativa de prestar serviços de consultoria, já que tinha conhecimento de algumas fragilidades operacionais. E também, anos antes, essa mesma empresa recusou meus serviços por achar o valor alto demais. Pois bem. O descontão não foi suficiente, uma vez que o diretor insistiu na retirada de mais R$ 500. Isso me fez cancelar o curso, ao que o diretor desistiu dos R$ 500, mas resolveu pagar somente o ICMS básico. Ocorre que outro cliente me contratou para o período que seria do ICMS-ST que o diretor reclamão não quis pagar (entendi como sinal de desistência). Durante a semana de aula, o diretor reclamão quis pagar o segundo curso, quando então comuniquei que estava sem agenda. O homem ficou irritado e deu lá uma justificativa de erro de programação financeira etc. E ficou insistindo que eu deveria abandonar o outro cliente. Resultado final: a empresa perdeu a chance de acessar o conteúdo valioso e urgente do ICMS-ST.

Eis que descobri, durante o treinamento ICMS básico nessa empresa do diretor reclamão, que não havia um setor fiscal interno, mesmo operando volumes grandiosos de compra e venda. Ninguém na sala entendia nada de reanálise, já que tudo era feito por um serviço terceirizado, localizado num bairro distante. Na verdade, o conhecimento fiscal da equipe era incipiente e muito limitado. Eis que numa determinada aula eu disse que somente um produto deles poderia ser objeto de retenção de ICMS-ST em nota fiscal. E que mesmo assim estava errado, já que as empresas de fora do Amazonas insistem num procedimento equivocado por conta de normatizações conflituosas. Falei ainda que outro grande risco de retenção em nota fiscal estava na utilização de MVA ajustada. Reforcei que, com exceção de um determinado produto, todo pagamento de ICMS-ST deveria ser feito para a Sefaz amazonense que adota MVA original nos seus cálculos. Pois foi dito e feito. No outro dia me trazem uma nota com retenção de ICMS-ST.

Na aula seguinte, eu apresentei uma análise da dita nota com retenção indevida. E lá estava a MVA ajustada. O fornecedor ajustou de 53,13% para 73,67%. O fornecedor também cobrou indevidamente o valor de R$ 4.569,39 que, inclusive, eu já tinha passado aos alunos todo o material necessário para evitar futuras cobranças do tipo, onde teriam que fazer um trabalho junto aos fornecedores (A maioria das nossas empresas paga tais valores por puro desconhecimento normativo). Só na transmissão desse conhecimento específico, a empresa iria economizar infinitas vezes mais do que gastou com o treinamento. Continuando a análise matemática, o fornecedor não havia considerado no cálculo do ICMS-ST o desconto do Convênio 65/88 no valor de R$ 8.117,69. E pra finalizar, o fornecedor cobrou de ICMS-ST R$ 30.120,63 quando o correto seria R$ 22.133,24. Desse modo, o prejuízo total numa única nota fiscal foi de R$ 12.556,78. E para piorar, eu soube que acontecem inúmeras retenções indevidas em nota fiscal.

Agora, o fato mais inusitado de tudo isso está na briga do diretor por R$ 500 que me levou a cancelar o treinamento ICMS substituição tributária, o qual iria contribuir sobremaneira na correção de prejuízos substanciais que vêm acontecendo sem serem identificados e corrigidos pela equipe interna.

Ano passado, um treinamento in company foi sacudido por muito estresse e confusão quando eu ministrava a parte do conteúdo que tratava da carga reduzida sobre produtos oriundos de indústrias incentivadas da ZFM. Foi nesse momento que a empresa, que compra muito PIM, descobriu que há anos vinha pagando 18% ao invés de 7% (tanto produtos incentivados quanto mercadorias adquiridas de importadores locais). Também, ano passado, os donos de duas distribuidoras de medicamentos não sabiam do regime especial que economiza até 40% de ICMS sobre compras. Outro dono de uma pequena indústria de plásticos vinha sofrendo com um problema crônico junto a Sefaz de Roraima que sempre cobrava Difal nas vendas para pessoa física. No treinamento ele descobriu que empresa do Simples está dispensada dessa obrigação.

Então, se você acredita que treinamento é caro, experimente a ignorância; experimente a falta de gestão estratégica. Curta e siga @doutorimposto. Outros 457 artigos estão disponíveis no site www.next.cnt.br































terça-feira, 12 de julho de 2022

QUEBRA DE UM PARADIGMA TRIBUTÁRIO


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio  dia  12 / 7 / 2022 - A457
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O inciso I do § 3º do artigo 153 da CF diz que o IPI será seletivo em função da essencialidade do produto, ao que o inciso III do § 2º do artigo 155 afirma que o ICMS poderá ser seletivo em função da essencialidade das mercadorias e dos serviços. Ou seja, malandramente, o constituinte tornou a seletividade obrigatória somente ao IPI quando facultou essa mesma disposição para o ICMS. E, obviamente, nenhum governador jamais considerou seletividade nenhuma ao estabelecer políticas tributárias. Daí, surgiram aberrações das mais escandalosas, como, por exemplo, a carga de 12% que a Sefaz amazonense cobra dum veículo Porsche quando ao mesmo tempo cobra 18% sobre itens da cesta básica. Outra esculhambação tenebrosa que aconteceu por décadas estava na cobrança impiedosa de IPVA sobre uma motocicleta das mais simples, enquanto a Sefaz se recusava, como ainda se recusa, a cobrar o mesmo IPVA de helicópteros, jatinhos e iates. Ou seja, o governador Wilson Lima, juntamente com a Sefaz, trabalha sempre para arrombar o pobre e beneficiar o rico. Esse padrão segregacionista contamina toda a estrutura fisco tributária.

Voltando ao tema seletividade, e por conta da ordem constitucional, pouquíssimos alimentos pagam IPI, enquanto o ICMS avança ferozmente sobre itens essenciais à sobrevivência humana, como alimentos básicos e remédios, dificultando severamente o acesso pelos pobres. No caso de combustíveis, energia elétrica e telefone, as fazendas estaduais seguiram numa majoração galopante até enquadrar esses itens na categoria de armas, munições e artigos de joalheria (artigos de luxo) para assim catapultar as alíquotas lá pra estratosfera. Por exemplo, a alíquota do Rio de Janeiro é ou era de 34% (loucura, loucura, loucura...). O festival de insanidades transbordava das fazendas estaduais e se espalhava pelo país, desencadeando uma onda de críticas fervorosas. Tais discussões vinham se arrastando por décadas sem que nenhum sinal de mudança fosse observado, até a chegada do presidente Bolsonaro.

O espírito briguento e polêmico do presidente jogou lenha na fogueira da discussão sobre o fraudulento conceito da seletividade do ICMS. Desse modo, houve um verdadeiro levante que sacudiu as redes sociais até que as autoridades foram obrigadas a retirar os combustíveis do mesmo grupo de artigos de joalheria. Com isso, o efeito dominó vem provocando um rebuliço e uma verdadeira revolução taxativa, com a consequente diminuição das alíquotas e seus impactos negativos nas arrecadações estaduais. O fato é o seguinte: as administrações fazendárias estaduais vão ter que revisar suas políticas fiscais e assim cobrar de quem não vem pagando para compensar a perda dos combustíveis. Na verdade, as elevadas taxações de combustíveis, energia e telefone levou a uma acomodação dos gestores públicos que não cuidaram de melhorar suas estruturas de controle arrecadatório. Por exemplo, na semana passada a Sefa/PA fez uma transmissão no Youtube para explicar um Protocolo ICMS-ST de materiais de construção com outros Estados. Percebe-se claramente uma situação conflituosa sobre o assunto, além do constrangedor despreparo da equipe paraense. Foi nesse momento que achei a Sefaz amazonense linda e maravilhosa.

O presidente Bolsonaro é diretamente responsável por um feito histórico, dando-nos assim esperança de que vale a pena levantar outras frentes na batalha para corrigir infinitas deformações do nosso sistema tributário. A próxima grande investida poderia envolver a criminosa tributação dos alimentos básicos que é diretamente responsável pela fome, já que retira o alimento das mesas das famílias. Nesse ponto, o senhor Wilson Lima é o maior carrasco entre os governadores pelo elevado ICMS da cesta básica.

Se o movimento social em torno do ICMS continuar se expandindo, é possível que as consequências decorrentes levem a uma efetiva reforma tributária. A Sefaz amazonense vem ensaiando uma manobra rumo à tributação fixa para eliminar o modelo de substituição tributária. Tal intenção foi consubstanciada no Decreto 44752/2021, já que o modelo proposto no Decreto 41264/2019 se mostrou bastante promissor. Apesar da polêmica envolvendo o assunto, eu acredito que um modelo de tributação fixa (uma espécie de pauta) para todos os produtos garantiria altos níveis de arrecadação como também combateria a concorrência desleal, já que tudo seria objeto de cobrança monofásica. Teria que ver como fica o princípio da não cumulatividade. Curta e siga @doutorimposto. Outros 456 artigos estão disponíveis no site www.next.cnt.br















































segunda-feira, 4 de julho de 2022

NÚCLEO TRIBUTÁRIO DAS EMPRESAS COMERCIAIS



Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio  dia  5 / 7 / 2022 - A456
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No texto da semana passada eu fiz um relato bizarro sobre a monumental dificuldade para obter simples informações na Sefaz. Uma verdadeira epopeia se desenrolou em torno duma cobrança injustificada de 35%, que ao final de muita discussão baixou para 29%. E por incrível que pareça a história ainda não acabou, já que a resposta ao meu último e-mail foi: “Informo que o processo para definição do percentual, ainda está em andamento”.

Tanta dificuldade, tanta resistência e tantos ataques aos meus questionamentos indicaram que a Sefaz tinha plena consciência da cobrança indevida, o que me faz acreditar na existência de muitas outras esquisitices taxativas propositais. Pergunto então: Por que coisas assim acontecem e se mantém ao longo dos anos? E por que somente com empresas comerciais? Na verdade, somente com empresas comerciais de porte menos expressivo, uma vez que as grandes têm lá suas conexões particulares. Vamos investigar o assunto.

A Federação das Indústrias do Amazonas possui um núcleo de estudos tributários que atua como interface junto a Sefaz. O grande objetivo é alinhar procedimentos normativos de modo a promover um ambiente que viabilize políticas internas de compliance fiscal. Em outras palavras, o trabalho fiscal da Indústria flui sem muitos atropelos porque o coordenador desse dito núcleo intervém sempre que alguma dúvida normativa perturba o setor industrial. Inclusive, esse dito coordenador tem acesso livre a todos os setores da Sefaz. Eu já presenciei a entrada dele no Detri sem apresentação, indo direto às pessoas chave, enquanto eu fiquei um tempão esperando até não ser atendido. Eis uma coisa estranhíssima: A Associação Comercial está esperando uma audiência com o chefe do Detri desde o ano passado para obter esclarecimento sobre o Decreto 44752. Fatos desse tipo, mostra bem o desprezo que a Sefaz tem pelo setor comercial, que é o maior contribuinte de ICMS.

Vamos então voltar à pergunta. Por que as empresas do Comércio são bombardeadas com taxações indevidas e por que a Sefaz cria tanta dificuldade de esclarecimento quando é questionada? E por que a Sefaz não respeita o Comércio? A resposta é muito simples. O Comércio é fragmentado, acanhado e não possui o mesmo espírito de corpo da Indústria. Por exemplo, qualquer problema sofrido pela Indústria é motivo para convocação imediata de autoridades que prontamente comparecem para prestar os devidos esclarecimentos. Pois então. A coisa mais rara do mundo é encontrar o secretário da Sefaz em alguma reunião da Fecomércio, ACA ou CDL. E quando aparece, ninguém faz questionamentos objetivos, como também ninguém sabe argumentar tecnicamente, o que dá espaço para a Sefaz engabelar todo mundo. Assim, as reuniões tomam um viés político e não técnico, deixando os problemas sem solução. 

Por muitos anos, venho insistindo, em diversas reuniões das entidades comerciais, na criação desse dito núcleo tributário. Inclusive, numa delas, por duas horas e meia na Fecomércio, eu até comentei que o coordenador da Fieam se dispôs a transferir sua tecnologia para esse núcleo comercial. Com apoio do brilhante trabalho desenvolvido pelo coordenador do núcleo da Fieam, não seria necessário começar do zero. Mas, curiosamente, ninguém de nenhuma entidade jamais quis saber desse assunto. Não existe interesse na organização nem no mapeamento das normas fiscais relacionadas ao Comércio. Também não há interesse em ajudar nenhuma empresa comercial que seja alvo de cobranças pecuniárias indevidas como também cobranças descabidas de procedimentos estapafúrdios, como, por exemplo, a confusão do Registro C170 (EFD).

Se houvesse um núcleo de estudos tributários do Comércio, eu não teria sofrido tanto com o mistério dos 35% que acabei descobrindo que era 29%. Isso era um assunto para ser tratado de modo institucional, como também inúmeros outros problemas que atormentam os contadores comerciais. Basta observar que quase todo mundo que perambula nos corredores da Sefaz ou se estressa com o Plantão Fiscal é gente do Comércio. Os profissionais da indústria sofrem bem menos porque o coordenador da Fieam toma a frente de tudo. Curta e siga @doutorimposto. Outros 455 artigos estão disponíveis no site www.next.cnt.br