Publicado no Jornal do Commercio dia 05/03/2013 - A112
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O fenômeno cinematográfico “Lincoln”, do diretor Steven Spilberg, vende para o mundo a grandiosidade do homem, do mito, que é considerado pelos norte-americanos como o “pai da nação”. De fato, o protagonista é simplesmente brilhante nas estratégias políticas, visto que sua habilidade para conquistar corações e mentes levou alguns críticos a qualificá-lo como um manipulador maquiavélico. De qualquer forma, ninguém nega sua eloquente oratória, tanto que seu famoso Discurso de Gettysburg, de 1853, tornou-se um símbolo icônico dos deveres do seu povo. A interpretação brilhante do ator Daniel Day-Lewis mostra o esforço sobre-humano do presidente Lincoln para costurar uma engenhosa e complexa articulação com a finalidade de harmonizar interesses e correntes absolutamente heterogêneas e assim salvar a nação do cisma geográfico. Ou seja, Abraham Lincoln liderou o país de forma bem-sucedida durante a maior crise interna da história americana.
O
filme “Tudo pelo Poder”, do diretor George Clooney, mostra os bastidores da
campanha presidencial à Casa Branca. É interessante observar nessa produção
hollywoodiana o processo de construção da imagem do homem público, o qual deve
ser revestido do mais brilhante e sublime verniz democrático. O candidato é indefectível
nos modos, na elegância, na erudição; mas principalmente é convincente na
probidade e na conduta imaculada. Por conta desse obrigatório e frágil
equilíbrio moral, uma fortuita infidelidade conjugal concentra o devastador
potencial de destruir uma carreira política construída como muito sacrifício.
Em
várias nações, principalmente nas saxônicas, a conduta do homem público é uma
fortaleza que deve se manter inexpugnável, onde não se tolera desvios nem
nebulosidades. Um bom exemplo é a queda do diretor da CIA (David Petraeus)
devido a um caso extraconjugal. Outro exemplo foi o envolvimento do governador
do estado de Nova York (Eliot Spitzer) com prostitutas que lhe custou o
mandato. Pode-se também citar o emblemático caso da queda da vice do Primeiro
Ministro da Suécia que comprou chocolate com cartão corporativo.
Por
aqui, em terras tupiniquins, onde nossos aborígenes ensinaram os colonizadores
a tomar banho e cuidar da própria higiene, vivemos o paraíso da permissividade.
Aqui não existe essa coisa de eloquência, de grandeza, de nobreza de espírito.
Aqui não fazemos rodeios nem nos preocupamos com protocolos ou com ideários pomposos.
Tanto, que na cerimônia de posse presidencial o povaréu se chafurdou no espelho
d’água em frente ao Congresso. Reputação e conduta são concepções extremamente
rarefeitas que passam ao largo das preocupações dos nossos homens públicos.
Afinal de contas, o povo não consegue processar conceitos tão sofisticados; o
povo só quer saber de futebol e mulher pelada.
Assim,
parece que nada, absolutamente nada é capaz de arranhar a imagem das raposas da
política. Arnaldo Jabor até cunhou o termo “político teflon”, onde nada gruda. De
tal modo como acontece entre os detentos das penitenciárias, o único desvio
imperdoável é a traição dos pares. Isso sim, pode custar o mandato e resultar
em inelegibilidade. Fora isso, tudo é relevável, tudo é contornável, tudo é
esquecível. Ou seja, o político pode mostrar as nádegas para a delegada, pode
ser um notório pedófilo, pode espancar a esposa, pode ser condenado pelo STF, pode
assassinar uma pessoa em frente às câmeras, pode viver na esbórnia, pode
desvirginar um monte de ribeirinhas e pode quebrar compromissos institucionais sem
o menor pudor, como fez dias atrás o honorável presidente do Implurb, senhor
Roberto Moita, que não compareceu a uma reunião agendada com representantes do
Conselho Regional de Contabilidade e do Sindicado das Empresas de Serviços
Contábeis, ficando a comitiva a ver navios.
Os
nossos valores políticos em nada se compara aos dos saxônicos (não que eles
sejam perfeitos). Nossa política é marcada pelo populismo rasteiro, por homens
toscos e por repetitivos discursos impregnados de clichês. Toda nossa decepção
nos permite imaginar que nunca tivemos nem jamais teremos um político da
magnitude do presidente Lincoln. A aridez moral que impera no insalubre
ambiente político brasileiro não permite a sobrevivência de ideários nobres de
retidão moral. O mundo real da política é povoado por gente preocupada, sim,
mas com, e somente com o seu bolso. Também, nossos políticos são profundamente
dedicados à arte da interpretação teatral. Ou seja, árdua e intensivamente
treinam-se expressões, tom de voz, gesticulações, posturas e também se estuda
palavreados floridos e convincentes. Tudo feito com o objetivo de ludibriar o
povo e assim prosseguir cometendo toda sorte de impropérios.
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