Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 31/12/2013 - A151
O
seu José abriu um modesto restaurante numa ponta de rua dum bairro de
periferia. Enquanto a esposa cozinhava ele cuidava do atendimento da clientela.
O tempo passou, os negócios prosperaram e assim foi possível melhorar a
estrutura e até mesmo contratar vários funcionários. Foi preciso também alugar
o prédio vizinho para atender a crescente demanda de bocas famintas atraídas
pela qualidade das refeições servidas a preço popular. Tudo ia bem até o dia que
o empresário José resolveu formalizar o seu negócio. De início, o contador lhe
apresentou uma lista imensa de procedimentos, documentos e certidões que seriam
necessários para regularização da empresa. Cada etapa cumprida do calvário
burocrático consumia tanto dinheiro que depois de alguns meses já havia uma
parede cheia de certificados e alvarás oriundos de dezenas de órgãos estaduais,
federais e municipais. O orgulho inicial de possuir um CNPJ foi substituído
pelo desespero de ver impostos e despesas burocráticas consumir toda a receita
do restaurante. O seu José descobriu que para pagar tudo quanto é taxação seria
preciso dobrar o preço da refeição, o que fatalmente afastaria seus clientes. A
coisa foi piorando até o dia que a justiça do trabalho aplicou uma multa tão
alta que o restaurante fechou, deixando várias pessoas desempregadas. Quanto
aos clientes contumazes, estes não encontraram mais na região uma comida tão
gostosa. Resumindo, a burocracia matou o espírito empreendedor do seu José
porque ele quis fazer tudo certinho.
Já
há muito tempo ferve a discussão em torno da exacerbação da burocracia
governamental. Hoje, pagar o imposto deixou de ser o problema principal. O que
assombra todo mundo é universo infinito e indecifrável das obrigações acessórias,
cujas insanidades revelam um país afeito a uma mescla de devaneio com
esquizofrenia, como se os burocratas tivessem saído de um quadro do pintor
catalão Salvador Dalí. Parece que algum espírito perturbado baixa no momento da
composição das peças legislativo-tributárias. Se não for nada disso, há então
um motivo tenebroso por trás de tantas esquisitices.
O
aspecto mais curioso da nossa legislação tributária é que determinada coisa
nasce de uma forma e com o passar do tempo os burocratas mexem tanto nela que o
resultado é o avesso do formato original. A representação mais emblemática
dessa alquimia é o ICMS, cujo FATO GERADOR, que por muitos anos foi a venda,
agora é a compra da mercadoria. Ou seja, o ICMS Substituição Tributária é um
tributo incidente sobre compras e não sobre vendas. Mas o ente tributante
insiste em classificá-lo como imposto sobre circulação (venda) de mercadorias. O
próprio conceito “FATO” GERADOR sofreu um revestrés tão violento nos diversos
cânones tributários que só um filósofo especialista em Kant seria capaz de
encontrar algum aspecto lógico no raciocínio do legislador. O dicionário
Aurélio diz que FATO significa coisa ou ação feita. Pois bem!! Na modalidade
Substituição Tributária do ICMS não existe FATO porque a ação não foi efetivada.
Isto é, a venda não aconteceu. O que a legislação chama de FATO é na realidade
uma HIPÓTESE. Dessa forma, o termo “'FATO' GERADOR” deveria ser banido do
mundaréu de legislações Brasil afora.
Na
realidade, existe um fato gerador por trás de cada tributo. Sendo assim, por que
então o legislador não se atém ao fato? Se o fato gerador do tributo são as
compras, por que então não nominá-lo Imposto Sobre Compras de Mercadorias? Para
que tanto imposto e tanta burocracia orbitando os produtos de consumo? Por que
não acabar com a monstruosidade burocrática do ICMS e instituir um único
imposto cobrado por ocasião da entrada de produtos no estado? (Algo semelhante
ao modelo adotado no Acre). Sabemos que a estrutura tributária se tornou um
monstro bestial de infinitas cabeças enroscadas umas nas outras. Mesmo assim,
os representantes do poder econômico deveriam atacar o câncer da burocracia e
seus respectivos burocratas porras-loucas para desatar os nós que amarram a
economia do país. Teremos 365 oportunidades em 2014 para promover a mudança.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Sua mensagem será publicada assim que for liberada. Grato.