Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 18/03/2014 - A162
A
edição da última terça-feira do Jornal Nacional mostrou o caso da cidade norte-americana
que está ameaçada de desaparecer do mapa. A pequena Hampton ganhou notoriedade
internacional depois das rumorosas suspeitas de corrupção que se abateram sobre
a localidade. Os auditores do estado da Flórida detectaram uma série de
irregularidades na administração municipal e por conta disso o legislativo
estadual deu o prazo de um mês para que tudo fosse regularizado, sob pena da
cidade ser anexada ao município vizinho. O prefeito está preso por tráfico de
drogas. O enredo dessa história segue
uma trajetória comum com desfecho previsível. A coisa tem começo, meio e fim; com
investigação ágil, decisões diretas, prefeito detido e município extinto. Simples,
assim. Pelo menos para o cidadão estadunidense.
O
mais interessante nisso tudo é que um caso de corrupção envolvendo o
equivalente a R$ 1,7 milhão se transformou numa epopeia planetária, enquanto que
para nós, brasileiros, esse valor é um pingo de chuva, face ao dilúvio de casos
sobre peculatos, mensalões, desmandos, malversações e dilapidações do
patrimônio público que diariamente pipocam em tudo quanto é veículo midiático.
Não há um só lugar que o cidadão brasileiro olhe que não encontre um caso de
corrupção. Ao sair de casa para o trabalho, serão pelo menos umas 50 notícias sobre
corrupção. Se for tomar um cafezinho na copa, tropeçará em mais 10 histórias
envolvendo propina, desvio de verba etc. O bombardeio pesado acontece no início
da noite com tudo quanto é canal de televisão mostrando uma cambada de
engravatados se acusando uns aos outros de corrupto. Liga-se o computador e
logo se percebe que o monitor é pequeno para a quantidade de corrupção que transborda
dos noticiários on-line. E na hora de dormir o filhinho que mal aprendeu a
falar pergunta por que os mensaleiros estão felizes da vida na capa da revista
Veja.
O
brasileiro tem estômago de avestruz. Todo dia, ao acordar, ele faz um tremendo
esforço psicológico para não querer enxergar o que existe por baixo da capa que
cobre um oceano de podridão. Essa resistente capa possui um forte colorido
produzido pela televisão e suas histórias da carochinha: os assuntos giram em
torno de dramas amorosos ou comédias preconceituosas. O objetivo é sempre
entreter (entorpecer), de forma que não haja tempo para pensar ou refletir
sobre o lamaçal cadavérico em que estão afundadas as nossas instituições
legalmente constituídas. Essa dita capa, ou esse envernizado revestimento
encouraçado, são os discursos, as declarações embusteiras, as manobras, as
falácias, a politicagem, os marqueteiros, os ternos, as caras, os olhos que não
piscam, as bocas que não tremem etc. Por isso é que apesar de estarmos há muito
tempo em guerra civil devido ao apavorante avanço e domínio da criminalidade,
as autoridades insistem na retórica da normalidade. A coisa está num nível tão alarmante
que semana passada um grupo de 15 bandidos cortou a luz da cidade baiana de
Macaúbas para atacar a polícia e explodir caixas eletrônicos.
A
criminalidade desenfreada floresce no substrato da corrupção. Um estado
corrupto jamais erradicará a criminalidade sistematizada. Se a sociedade quiser
combater a epidemia da criminalidade, ela terá primeiro que atacar o câncer da
corrupção. Ou morre os dois ou não morre nenhum.
A
já imortalizada “tarde triste” tão melancolicamente relatada pelo Ministro
Joaquim Barbosa assombrou o Brasil pela crueza do seu significado. Naquela tarde
o revestimento encouraçado foi rasgado como uma fratura exposta, onde, sem
rodeios nem pudores cada um dos novatos mostrou a que veio. Naquele momento o
povo brasileiro viu claramente as engrenagens sujas da nossa justiça e o que
está por trás de cada decisão da mais alta corte da nação brasileira. Todo
aquele palavreado rebuscado antes de cada voto é mera formalidade para cumprir um
rito protocolar acertado de antemão. O Ministro Joaquim Barbosa desnudou o STF
ao citar a “MAIORIA de circunstância formada SOB MEDIDA para lançar por terra
todo um trabalho primoroso”. Para bom entendedor meia palavra basta.
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