terça-feira, 25 de agosto de 2015

A QUEM INTERESSA UM SISTEMA CONFUSO?

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Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 25/08/2015 - A223

Nos países desenvolvidos o imposto e o seu respectivo fato gerador são elementos claramente distintos. Se as coisas são óbvias, o contribuinte consegue cumprir com suas obrigações tributárias de modo a dormir sossegado. Se as coisas são óbvias, o Fisco consegue cobrar o valor devido sem temer contestações judiciais. Aqui no Brasil nada é obvio; tudo é difuso, sobreposto, misturado, escamoteado, subentendido, implícito, ininteligível etc., etc. Pra começo de conversa, qual o motivo exato da existência de mais de 60 tributos? Por que tanta tributação sobre a mesma base (IPI, ICMS, PIS, COFINS, INSS, CIDE, IR, CSLL)? Por que um tributo é base do outro, e do outro; tudo ao mesmo tempo? A quem interessa tanta maluquice? E por que ninguém mexe nesse angu de caroço? Quem ganha com isso?

O fato é que os tribunais estão abarrotados até o teto de processos complicadíssimos. Se a coisa toda é super hiper ultra mega complexa, as causas judiciais costumam envolver montanhas de dinheiro que molham a mão de um, de outro e de mais outro. Não à toa, descobriu-se que o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais é um covil de abutres carniceiros, cujo único objetivo é roubar e roubar muito dinheiro. É a patifaria em grande escala. Alguém então poderia perguntar: Como algo tão grandioso e ostensivo se mantém nas sombras da discrição? A resposta é muito simples: BUROCRACIA EXACERBADA. Tudo que é confuso tem o propósito de acobertar algo criminoso. Qualquer redação legislativa cheia de 200 voltas e 300 curvas esconde um propósito malicioso, principalmente quando a luz do sol não consegue iluminar a intenção do legislador.

O Brasil tem essa fissura pelo complicado. Talvez por isso o emblemático e icônico Odorico Paraguaçu esteja fortemente grudado no nosso imaginário coletivo, como se fosse um arquétipo. Ele falava e falava e não dizia nada. E o povo ficava embriagado com aquilo tudo. O Odorico é a personificação da esperteza em estado de glória; o sonho de qualquer político a querer fazer e desfazer infinitas vezes sem que o povo idiota deixe de idolatrá-lo. Tem gente que é tarada por textos recheados de jargões, temperados com floreios e salpicados de rococós. Seria um sinal de erudição. Pois é..!! Toda essa entulheira literária é despejada no poço sem fundo da nossa burocracia tributária.

Essa dita burocracia desenfreada está matando as empresas. Por exemplo, muita gente deixou de vender mercadorias ST para fora do Amazonas porque a burocracia é infernal e o prejuízo é gigantesco, devido à duplicação da carga tributária. Outro exemplo doloroso da virulência burocrática está numa próspera e competentíssima empresa de móveis planejados que está fechando as portas por causa da instabilidade normativa que rege a atividade. Ou seja, o custo administrativo é maior do que o custo da produção. Sem contar, os altos riscos patrocinados pela falta de clareza normativa. É realmente lamentável que a coisa toda só tende a piorar. E ninguém se mexe para combater os assassinos de negócios e de empregos. O Fisco está livre, pesado e solto, como um rinoceronte enfurecido.

Antigamente, a confusão normativa não assustava tanto porque o empresário tocava sua vida alheio aos desvarios do legislador. O problema é que agora, o Fisco corre atrás do Contribuinte com um motosserra barulhento. Ou seja, não tem como haver diálogo e não há escapatória porque a legislação é totalmente abilolada. E o culpado de tudo isso é o próprio Contribuinte que deixou a coisa toda chegar nesse ponto. Em vez de lutar pela legalidade, o Contribuinte preferiu agir nas sombras para escapar dos avanços insidiosos da legislação tributária, achando assim que seria mais esperto do que o Governo. O problema é que o Governo ganhou a parada e deu uma volta no Contribuinte, que agora está acuado sem saber o que fazer. O Governo aprendeu a usar a lei para atacar, mas as empresas não desenvolveram uma cultura litigiosa capaz de contestar cada ação exorbitante do agente fazendário. Por exemplo, o artigo 316 §1º do Código Penal (DL 2848/40) pune com prisão de oito anos por excesso de exação, aquele funcionário público que exigir tributo que sabe ou deveria saber indevido. A mesma punição se aplica quando, mesmo devido, o agente público se vale de meio vexatório ou gravoso para fazer a cobrança. Esse tipo de coisa acontece todo dia e ninguém é preso. Isto é, a lei existe, mas não é usada.

Mas ainda há tempo. E o caminho é o da legalidade. O jeitinho não funciona mais como antes. O Contribuinte pode e deve encampar um movimento em prol da racionalização das normas tributárias.

O nosso sistema tributário é injusto e paradoxal. Enquanto a carga tributária beira os 40% do PIB, temos uma das mais baixas taxações de imposto de renda, considerando os países membros da OCDE. E como não poderia deixar de ser, por aqui a pessoa jurídica paga mais do que a pessoa física, contrariando a prática mundial. As pessoas físicas brasileiras pagam no máximo 27,5%, enquanto que a Suécia taxa a 58,2%; Alemanha, 51,2%; EUA, 46,1%; México, 40%; Argentina, 35%. A razão de termos baixa tributação de imposto de renda e alta carga tributária está nos pesados impostos sobre consumo, contrariando, novamente, a prática dos países desenvolvidos. Nesse momento, acompanhamos a sanha arrecadatória do Governo para aumentar os impostos. Interessante, é que o alvo é sempre o consumo e NUNCA o imposto de renda dos mais ricos. O alvo é sempre a massa populacional que está na base da pirâmide.

Mais uma jabuticaba interessante: Na contramão das práticas tributárias da OCDE, o Brasil resolveu isentar os dividendos, renunciando assim a uma bolada anual de R$ 50 bilhões. Os ricos são sempre, sempre protegidos e isentados. A gota d´água de tanto descaramento está na intenção do Governo de aplicar uma taxa de 17% sobre a tal repatriação de dinheiro enviado ilegalmente para o exterior por corruptos, traficantes e criminosos em geral. Está claro que isso é um acintoso deboche aos trabalhadores honestos taxados a 28%. Como declarou o Tributarista Ives Gandra, todo o dinheiro desonesto deveria ser confiscado integralmente e não beneficiado com incentivos fiscais. Pois é.!! Os bandidos se protegem, uns aos outros.



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