Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 23 / 3 / 2017 - A288
A
fábrica de fogos era imensa, com gente trabalhando dia e noite para atender o
grande número de pedidos que chegava diariamente. Apesar de possuir uma marca
consolidada no mercado, a empresa negligenciava todas as normas de segurança. O
histórico de acidentes era longo e mesmo assim o descuido perdurou até tudo ir
pelos ares numa catastrófica explosão.
Repercutiu
na internet o suposto comentário duma agencia internacional de que no Brasil
até a carne é corrupta. Esse é o ponto nevrálgico do escândalo que está
sacudindo as estruturas da nossa economia, com desdobramentos imprevisíveis,
uma vez que a Polícia Federal declarou ter elementos adicionais ainda não
divulgados.
A
Polícia Federal foi bombardeada com severas críticas por causa da divulgação da
operação Carne Fraca. Daí, que a culpa dos crimes levado a público é da Polícia
Federal. Afinal de contas, a corrupção está no sangue do funcionalismo; é assim
que a coisa funciona. O ministro Blairo Maggi e demais figuras notórias estão
culpando a janela pela paisagem. O ministro Maggi disse que a PF deveria ter comunicado
tudo ao ministério antes de deflagrar a operação. É óbvio que a PF jamais faria
isso. Num país entupido de bandido até as tampas, a operação seria desmontada
pelos funcionários públicos envolvidos na investigação.
Qual
o motivo de tamanha devastação se o número de plantas denunciadas é tão pequeno
em relação ao sistema como um todo? Por que o estrago ganhou dimensão
planetária se a quantidade de pessoas presas e já exoneradas é insignificante
frente aos milhares de fiscais sanitários?
Pois
é.
Quando
alguém carrega uma índole ruim, todo deslize é potencializado e transformado em
delito. O mundo inteiro sabe que o Brasil é a terra da corrupção e da
impunidade. A notícia das fraudes sanitárias foi imediatamente associada ao péssimo
estigma marcado na nossa testa com ferro ardente. O Brasil é um país de
bandidos engravatados que roubam milhões na cara dura porque todo o sistema
institucional apoia e defende a delinquência. Se a percepção geral é de que
todo mundo é ladrão, as pessoas sempre vão interpretar tudo da pior forma
possível. Esse é o Brasil e esse é o sistema que ninguém se interessa em mudar.
Temos
por aqui uma ferida exposta e cancerígena que se chama financiamento de
campanha política. Parece que nessa chaga está a raiz de todos os males.
Vivemos, experimentamos e engolimos a fraude escancarada das milionárias
doações de empresas para siglas partidárias de variadas colorações, evidenciando
publicamente um modelo de relação incestuosa (tudo previsto em lei). Esse
sistema pisoteia na cara do povo uma corrupção deslavada. É claro, óbvio,
ululante, que ninguém doa zilhões de dinheiro que não seja para corromper a
tudo e a todos. E esses ditos grandes exportadores de carne são mestres na arte
de embolsar o conjunto da politicada que se oferece como mercadoria em
prateleira.
O
escândalo da operação Carne Fraca dá um choque de realidade no povo brasileiro.
Ela deixa patente o destrutivo poder da corrupção. Nós, brasileiros, temos a
mania de contemporizar desvios de conduta quando o ladrão é simpático, eloquente,
bem vestido, e, principalmente, rouba milhões. A justiça tem uma dificuldade
colossal de prender esse tipo de gente. O Juiz Sergio Moro é o primeiro e único
a fugir da regra. A polícia jamais chega num bairro de rico enfileirando
moradores no muro, mas faz isso diariamente na periferia. A polícia só corre
atrás de assaltante fuleiro; ela nunca persegue um jatinho entupido de dinheiro
sujo.
A
corrupção pode matar todo um sistema econômico e assim gerar perdas
incalculáveis, com prejuízos, falências, desemprego, queda de arrecadação etc.
O cerne do estrago provocado pela operação Carne Fraca não está nos casos
investigados; está, sim, no modelo corrupto adotado pelo poder público em
conivência com a classe empresarial e também com vários segmentos duma
sociedade alienada.
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