segunda-feira, 14 de outubro de 2019

MÁQUINA DE PERPETUAR DESIGUALDADES



Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio  dia  15 / 10 / 2019 - A377

O polêmico assunto envolvendo o ingresso do Brasil na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico ilustra de forma indelével o espírito matreiro dum povo viciado na manha do jeitinho. Estamos falando duma nação que não fez o dever de casa e mesmo assim insiste na pretensão de integrar o clube dos ricos. Tal situação lembra bem aquele aluno que vai para a faculdade, não para estudar, e sim, para obter o diploma. Na televisão, observa-se filas e filas de desempregados, onde muitos deles mal sabem se expressar minimamente, apesar de tantos recursos de aprendizagem disponíveis em plataformas de fácil acesso, como o próprio smartphone.

Pois é. A característica mais acentuada e a que mais nos distancia da OCDE é a nossa brutal desigualdade social, a qual está intimamente vinculada à opção pelo modelo regressivo de tributação. A sociedade brasileira é empobrecida pela esmagadora carga de impostos escondida nos produtos que consumimos diariamente; principalmente, alimentos básicos. O trabalhador recebe líquido somente 60% daquilo que é gasto pelo seu empregador e depois tem metade da sua renda abocanhada pelos impostos indiretos, sobrando assim uma ínfima quantia para construção de algum patrimônio. O resultado desse perverso regime semi-escravocrata é traduzido num potencial de consumo sufocado pela desigualdade social.

Interessante, é que as propostas de reforma tributária em debate no Congresso Nacional são focadas única e exclusivamente na intensificação da regressividade, onde, por exemplo, a PEC45 quer aumentar o imposto sobre serviço de 5% para 25%. O ministro Paulo Guedes só fala em redução do imposto de renda. Conclui-se então que todas as forças se unem para aumentar a regressividade e diminuir a progressividade. E é com essa deformação jurídico social que o Brasil quer por que quer entrar na OCDE, onde a carga média do imposto de renda é de 37% e o peso dos tributos sobre consumo é de 25%. No Brasil acontece exatamente o contrário: o percentual de tributação sobre a renda é de 18% enquanto que o consumo responde por 51% do bolo arrecadatório. Ou seja, os números falam por si, não deixando margem para qualquer divagação tecnicista ou filosófica que tente justificar o nosso regressivo e perverso modelo tributário.

Quem está por trás da PEC45 é um conglomerado de grandes empresas patrocinadoras do projeto legislativo que não quer pagar imposto de renda. Por isso, comprou a reputação de renomados tributaristas para defenderem a renda e o patrimônio dos ricos. Curiosamente, essas grandes empresas querem vender para uma população que não tem dinheiro pra gastar. Mais curioso ainda é tentar entender o que pensam os magnatas que insistem num modelo regressivo que mata a capacidade de consumo da massa populacional. Os EUA, por exemplo, são pujantes economicamente por causa do intenso consumo das famílias que podem comprar muito porque os produtos são minimamente tributados. E para dinamizar mais ainda o ambiente econômico, as fábricas e os distribuidores estão completamente livres de qualquer tipo de imposto indireto, ficando somente o varejista responsável pela retenção e o repasse do imposto ao erário, num processo onde não se perde tempo com apuração de imposto. Isto é, tudo é simples, rápido, claro e eficiente.

O aspecto mais preocupante da discussão envolvendo reforma tributária diz respeito ao fato de que ninguém vai legislar contra o seu holerite. As pessoas envolvidas no projeto são ricas e por isso mesmo não vão aumentar imposto para si próprias. Daí, que a taxação de altas rendas e de grandes patrimônios é assunto absolutamente proibido. Corremos o risco de nos distanciar mais ainda dos requisitos necessários para ingresso na OCDE se continuarmos operando um sistema de autofagia. O prognóstico visível no horizonte é de aumento brutal dos tributos indiretos com reflexos na redução dos salários e nos aumentos de energia elétrica, combustíveis, telefone e bens de consumo em geral. A mesmo tempo, o custo burocrático e jurídico ficará pior, uma vez que a PEC45 diz que passaremos dez anos convivendo com o sistema atual e com o substituto. Que Deus tenha piedade das nossas almas. Curta e siga @doutorimposto



































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