Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 05 / 05 / 2020 - A400
No
período ufanista que antecedeu a copa do mundo ocorreram diversas reuniões para
apresentação do projeto de construção da Arena da Amazônia. Vários e ilustres
representantes da sociedade manauara depositaram irrestrito apoio a tudo que envolvia
o assunto. E foram muitas e muitas pessoas. Um ou outro espectador se espantava
com o perigo de jogar bilhões de reais num elefante branco totalmente embrulhado
em múltiplas camadas de suspeições. As reuniões, na verdade, eram celebrações
da roubalheira desenfreada que iria explodir na forma de muito dinheiro endereçado
ao bolso da panelinha. Os olhos dos participantes brilhavam com a possibilidade
de tirar proveito daquele momento mágico de plena simbiose do público com o
privado. A orgia retórica provocava um clima de excitação generalizada.
Na
sequência dos delírios esfuziantes de alguns poucos jogos, veio a impactante
ressaca do rombo fiscal temperada com infinitas denúncias de superfaturamento. Por
todo o país, a farra com o dinheiro dos impostos saltava aos olhos – projetos
desastrosos de obras faraônicas, ao mesmo tempo em que áreas prioritárias
agonizavam por falta de verbas: hospitais lotados, transporte público
colapsado, segurança pública falida, sistema penitenciário em frangalhos, índices
educacionais vergonhosos etc. (muitos etc). Mesmo assim, a classe dominante
apagava a luz para não ver a bagunça, e o sistema midiático fazia denúncias de
mentirinha para vender jornal. O fato é que, na verdade, os grupos aristocráticos
envolvidos incestuosamente com o poder público seguiram catalisando os
escândalos até que seu estado de acomodação ficasse inerte. É a velha história:
Lá, em cima, tudo se ajeita (o executivo com o legislativo com o judiciário com
a mídia com os empreiteiros com os banqueiros e demais figuras pitorescas).
A
corrupção é uma obra conjunta, feita por muitas mãos. O político corrupto nunca
trabalha sozinho e a corrupção não floresce numa sociedade honesta. O terreno
das ignomínias é ricamente adubado pelos interesses particulares. A corrupção notória,
portanto, é a ponta do iceberg; submerso, reside uma vastíssima rede de apoio
sustentada por figuras honoráveis e insuspeitadas duma elite mascarada. Vez por
outra, alguns pedaços emergem, como Odebrecht ou JBS. Tudo seguia o seu curso
normal até que o Covid19 quebrou esse iceberg. Foi a mesma coisa que jogar
titica no ventilador.
Quando,
historicamente, os pobres morriam sem atendimento hospitalar, os ricos faziam
cara de paisagem. Também, as autoridades legalmente constituídas sempre
ignoraram o sofrimento dos trabalhadores espremidos nos ônibus sucateados. Pior
ainda, era o eterno descaso com a falta d'água nas residências
mais simples. Para encaroçar esse angu de injustiças sociais, o Brasil está no
topo dos países com maior concentração de renda, com impostos altíssimos no
salário e no consumo. O resultado dessa matemática espoliativa é um povo rude e
empobrecido.
Agora, o Covid19 despeja tais mazelas na casa-grande,
como numa revolta da natureza, uma espécie de Lei do Retorno. Enquanto o pobre
se arrombava, boa parte da classe mais favorecida achava que tudo estava bem
demais. Pois é. Uma chuva de pragas desabou no topo da pirâmide; pessoas endinheiradas
caíram aos montes com pulmões fulminados. E a culpa é da plebe rude. O rico presunçoso
fica revoltado com as aglomerações na frente da Caixa Econômica e mais ainda
com os ônibus lotados. Esse rico fica indignado com o pobre favelado que não
lava as mãos (cadê a água?). A madame não acredita que uma pessoa não possa ter
dinheiro para comprar álcool em gel ou máscaras de proteção. Ela acha um
absurdo, ver o pipoqueiro violando o isolamento social.
O pobre, portanto, é o grande propagador da epidemia que acaba matando não somente o próprio pobre acostumado com desgraças, mas também o magnata do condomínio esterilizado. O agravamento do número de infectados vai matar principalmente um vasto número de ricos patrimônios, com repercussão direta no desemprego. Se os pobres tivessem mais condições sanitárias e financeiras; se tivessem mais saúde, mais escolaridade, o patrimônio e a vida dos ricos seriam menos prejudicados. Curta e siga @doutorimposto
O pobre, portanto, é o grande propagador da epidemia que acaba matando não somente o próprio pobre acostumado com desgraças, mas também o magnata do condomínio esterilizado. O agravamento do número de infectados vai matar principalmente um vasto número de ricos patrimônios, com repercussão direta no desemprego. Se os pobres tivessem mais condições sanitárias e financeiras; se tivessem mais saúde, mais escolaridade, o patrimônio e a vida dos ricos seriam menos prejudicados. Curta e siga @doutorimposto
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