Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 21 / 9 / 2021 - A432
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O embate político decorrente das modificações no imposto de renda atiçou uma onda de reações fervorosas porque o contribuinte percebeu os efeitos futuros no próprio bolso. E apesar do governo lançar mão de malabarismos retóricos para amenizar a chuva de reações negativas, ninguém engoliu a lorota. Um levante de proporções continentais vem pressionando tanto que talvez não aconteça reforma nenhuma. Pelo menos, o modelo idealizado por seus autores. Todo esse movimento só foi possível porque o imposto de renda é um tributo direto e “por fora”. Nessa mesma categoria está o IPTU, que é outra taxação cercada de polêmicas e de reações calorosas quando majorada.
O rebuliço do imposto de renda acabou atiçando outra discussão, que envolve a reforma administrativa. Esse tipo de debate sobrevém por que, quando a sociedade pressiona por menos imposto, o governo refuta com as contas públicas. Daí, então, o foco sai da carga e vai para o gasto. O contribuinte passa a questionar o tamanho da máquina estatal e se a estrutura vigente é adequada; na verdade, o cidadão passa a desempenhar o exercício da cidadania. E ao puxar o fio do novelo, uma infinidade de esculhambações começa a emergir das profundezas sombrias da administração pública. Por tudo isso, os governantes não gostam de cavucar certos assuntos, justamente, para evitar um choque catastrófico, que seria, principalmente, não poder mais saquear o erário com a tranquilidade atual.
Pois é. Nos Estados Unidos, mais da metade da arrecadação vem do imposto de renda e cerca de 18% vem do consumo; no Brasil acontece justamente o contrário porque é difícil taxar os grandes rendimentos (super ricos). Na verdade, muito, muito, muito, muuuuito difícil. Para compensar essa dificuldade toda, o poder público tributa o consumo com uma virulência descomunal e ardilosa, que consiste basicamente em esconder cargas pesadíssimas dentro do produto; e também esconder isso do consumidor. Pra se ter uma ideia da feroz resistência da dupla Sefaz/RFB, aquela informação enigmática da carga tributária presente nos cupons fiscais demorou uma eternidade pra acontecer. Foram necessários 26 anos para que o parágrafo 5 do artigo 150 da Constituição Federal se transformasse na Lei 12.741, que aconteceu de modo confuso e embusteiro, já que não separa produto de imposto. Detalhe importante: O Fisco americano não taxa nenhum tipo de alimento.
Todo e qualquer feroz obstáculo a majorações no imposto de renda empurra o governo para a intensificação da regressividade, que também é acentuada pelo desmedido contencioso fiscal. Na verdade, toda desgraceira é depositada na conta da hiper taxação do consumo. Por consequência, temos uma população empobrecida e desnutrida. Um exemplo vergonhoso da covardia fazendária está na recente taxação do ovo de galinha pela Sefaz amazonense que jogou lá pra cima o preço da proteína que era a mais acessível antes de ir de zero por cento para dezoito por cento de ICMS. O governador atacou de modo infame e covarde, justamente o mais pobre. Esse mesmo governador não tem coragem de mexer na colossal e bilionária sonegação ICMS da energia elétrica. Pois é. O jogo é bruto. E nojento. É pra quem mergulha no esgoto sem vomitar.
Em meio ao infindável debate envolvendo imposto de renda, os tributos sobre consumo acabam preteridos e ignorados, quando deveriam integrar a discussão. E isso só seria possível se o consumidor tivesse consciência do quanto paga a cada gesto de consumo. O Projeto de Lei 990 do Senador Randolfe Rodrigues propõe que imposto e produto sejam separados na etiqueta de preço. Desse modo, o consumidor saberia o quanto sai do seu bolso para custear a máquina pública. Alguém poderia dizer que tal informação já existe nos cupons fiscais. Ocorre que o consumidor não presta atenção a detalhes burocráticos; o que ele observa de fato é o preço. E se o preço for quebrado em dois pedaços, aí, então, o comportamento do cidadão mudaria radicalmente. Imagine então, olhar para a etiqueta do videogame e constatar R$ 280 produto mais R$ 720 imposto totalizando R$ 1.000... O consumidor quebraria o videogame na cabeça do vendedor. Imagine o povo esfomeado sabendo que metade do alimento é imposto!! Imagine o povão descobrindo que poderia comprar o dobro de alimentos pelo mesmo valor que gasta hoje!! Imagine saber que a grande promotora da fome é a dupla Sefaz/RFB!!
Somente um jogo tributário completamente aberto desencadearia uma guerra contra todos os tributos, e não somente contra o imposto de renda. Somente esse cenário hipotético botaria ordem e decência nos gastos públicos. Enquanto não houver transparência e honestidade dos entes fazendários, testemunharemos o constante agravamento da regressividade. Curta e siga @doutorimposto
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