Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 17/06/2014 - A174
Era
uma vez um reino de criaturas otimistas, alegres e festeiras, apesar dos
infinitos problemas socioeconômicos e de infraestrutura que a maioria tinha que
conviver diariamente. Sofrimento maior cabia aos jumentos, burros, e antas, que
eram obrigados a trabalhar duro para sustentar os ratos, as raposas e as aves
de rapina – criaturas responsáveis pela administração do estado monarca. A
responsabilidade de representar a sofrida população trabalhadora cabia aos
porcos, cujo papel legislativo tinha uma importância fundamental para a
comunidade, visto que tudo era feito em nome do povo animal e para o povo
animal. A porcalhada possuía uma fenomenal habilidade com as palavras e por
conta disso sempre encontrava um jeito de contornar os incessantes ataques da
tropa de cavalos inconformada com a incestuosa relação da casa legislativa com o
poder estabelecido. Essa dita relação mais se parecia uma orgia desvairada de
tão desavergonhada que era. A coisa chegou num nível tão exagerado que certo
dia a juíza coruja resolveu contar na televisão aquilo que todo mundo estava
careca de saber. A magistrada detalhou fatos escandalosos e lamacentos que
aconteciam diariamente no chiqueiro legislativo, onde muita lama jorrava na
direção de várias instituições públicas. O chiqueiro legislativo e as demais
instituições públicas estavam atolados num denso e putrefato lamaçal, cujos
fedores se espalhavam pelos quatro cantos do reinado. Ou seja, não adiantava
camuflar a corrupção com tergiversações se a catinga sentida por todos era
insuportável – ninguém aguentava mais tanta esculhambação do poder público.
A
calejada população em nada ficou surpresa com a matéria televisiva, mas o
presidente do chiqueiro expressou toda sua indignação na tribuna legislativa,
onde afirmou com veemência que os fatos relatados pela juíza coruja em nada
tinham a ver com o chiqueiro congressista, onde todos eram limpíssimos e
perfumados. Disse ainda o presidente que inexistia qualquer traço de lama na
casa chiqueirissa. Nem também havia compra de votos nem desvio de parte das
emendas parlamentares para campanhas políticas. A casa era o mais fiel e
perfeito exemplo de ética pública, onde absolutamente nada de ilegal acontecia,
sendo seus membros, todos, impolutos nas suas condutas pessoais e
profissionais. Os demais porcos fizeram coro em apoio ao seu representante
maior e assim resolveram exigir da justiça que a coruja fosse presa e
decapitada por proferir tamanhas ofensas à instituição fundamental da
democracia animal, cujo ataque reforçava no eleitor a falsa ideia de que a
política de nada lhes servia. Dessa forma, foi dada a ordem para que os lobos
caçassem a coruja por todos os cantos da nação, justamente porque ela ousou falar
o óbvio ululante.
As
autoridades desse reino tinham a fantástica capacidade de mentir dum modo
absurdamente descarado. A dobradinha mentira/cara-de-pau era a arte mais
valorizada, sendo os experts muito bem remunerados, além de também serem
disputados no tapa pelos partidos políticos. As raposas velhas se configuravam
no símbolo máximo da ciência mentiresca por terem chegado ao clímax da
perfeição embusteira. Daí, o motivo de tanta adoração daqueles que ainda não
conseguiam mentir sem piscar.
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