Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 27 / 6 / 2017 - A299
O
artigo primeiro da Lei Complementar 123 estabelece tratamento diferenciado e
favorecido às microempresas e empresas de pequeno porte no âmbito dos Poderes
da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. A alínea “a” do
inciso XIII do parágrafo primeiro do artigo décimo terceiro enquadra as
empresas no regime de substituição tributária e tributação monofásica; a alínea
“h” obriga as empresas ao pagamento do diferencial de alíquota, que é a
famigerada antecipação do ICMS que não pode ser utilizada como crédito, tal
qual acontece nos outros regimes.
Até
os cachos de tucumãs pendurados lá no mato sabem que a estrutura normativa do
Simples Nacional é um troço caótico que desmantela a legislação dos outros
regimes. Além do mais, o legislador vive mexendo e remexendo nas regras desse
enigmático sistema.
Altos
funcionários de agências fazendárias, contadores, tributaristas etc., normalmente
têm posicionamentos razoáveis sobre diversas questões fiscais, mas no momento
em que o tal do Simples entra no circuito, o raciocínio é desmantelado.
Talvez
a raiz de tantos problemas esteja na fúria arrecadatória do Fisco combinada com
a epidêmica demagogia dos governantes. Ou seja, fez-se um estardalhaço
midiático na época da instituição do Simples para angariar dividendos políticos.
Por outro lado, era preciso manter o nível de arrecadação. Para concretizar tal
proeza, os chefões do poder executivo lançaram mão de habilidades engenhosas,
próprias dos alquimistas legislativos. Prevaleceu assim a velha malandragem de
fazer não fazendo; dizer não dizendo, típico da nossa gestão pública. Por isso
é que muitos empresários tomam um susto danado quando entram no sistema achando
que pagariam pouco imposto. O cinismo normativo é tão escarnecedor que a grande
empresa pode ser ressarcida pela antecipação do ICMS, mas a microempresa, não.
Na realidade, o dito tratamento diferenciado constante na LC 123 é uma fraude
acintosa porque a Sefaz notifica todo mundo da mesma forma. Por exemplo, 40% da
nota fiscal de café são transformados em ICMS(ST) a ser recolhido para os
cofres da Sefaz. Tem mais aberrações. A Resolução GSefaz 31 contém produto com
MVA de 254%; o produto alimentício do item 24 do Anexo IIA é taxado a
inacreditáveis 328%. Por conta de tantas escabrosidades, os anexos da LC 123
tem apenas uma função prestidigitadora, visto que o custo do empresário é dez
vezes maior do que os percentuais ali contidos.
Os
anexos da LC 123 nos convidam a uma reflexão curiosa. Afinal de contas, os
tributos sobre consumo são do produto ou são do comerciante/industrial? Os
tributos próprios do empresário são aqueles relacionados à renda, patrimônio ou
seguridade social. ICMS, PIS, COFINS e IPI são impostos repassados ao
consumidor, que os pagam no momento em que adquire produtos em estabelecimentos
mercantis. A proposição do Simples passa a mensagem de que os tributos sobre
consumo não são pagos pelo consumidor e sim, por quem os produz ou
comercializa. Tal paradigma é consequência dum sistema que esconde da população
a carga tributária incidente sobre tudo que é consumido. Esse tortuoso modelo é
uma fonte inesgotável de imbróglios normativos que acaba fomentando uma
burocracia infernal. Se o imposto fosse separado do produto haveria bem menos
possibilidade de sonegação, mas também desencadearia uma guerra civil nesse
país. Motivo: o povo saberia que metade da sua renda é confiscada pela Sefaz,
que posteriormente entrega o dinheiro aos corruptos. O quadro terminal do Rio
de Janeiro é um retrato indelével dessa prática.
Se
o custo tributário elencado nos Anexos da LC 123 fosse o único suportado pela
pequena empresa, o produto por ela comercializado ficaria 30% mais barato do que
o preço praticado por um concorrente enquadrado no regime do lucro real. A
antecipação do ICMS reduz essa diferença para 20% e a substituição tributária
torna o produto somente 10% mais barato. Os preços se nivelam na ocorrência
simultânea da cobrança monofásica com substituição tributária. Desse modo, a
pequena empresa paga tudo antecipadamente e ainda paga mais quando emite a guia
de recolhimento DAS. Enquanto isso, a politicada vive na eterna discussão sobre
a utópica reforma tributária que NUNCA sairá do papel. Esculhambação, teu
verdadeiro nome é Brasil.
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