Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 15 / 01 / 2019 - A351
A
figura do tributo nos remete à imagem do agricultor arrendatário que planta,
trata, colhe e só depois desse processo entrega parte da produção ao senhor da
terra. Ou seja, para entregar, antes, é preciso ter; para pagar, antes, é
preciso ganhar. Não é possível entregar sem ter nem pagar sem ter ganhado. Pois
o nosso criativo legislador perverteu essa gênese primordial.
O
instituto da substituição tributária do ICMS nasceu aleijado. Por isso é que foram
necessários muitos anos para acalmar a fúria dos contribuintes Brasil a fora. E
mesmo legitimada pela Emenda Constitucional 3/93, ninguém até hoje engole o
desaforo de pagar sem ter antes ganhado, por se tratar de uma perversão da
ordem natural das coisas; um estupro financeiro. Sabemos que o nosso sistema
jurídico legislativo faz qualquer coisa para satisfazer os caprichos do poder
executivo. Daí, a razão de sermos mundialmente reconhecidos como a terra da
insegurança jurídica, onde tudo pode e nada do que está escrito vale alguma
coisa. Foi justamente desse útero maculado que brotou a substituição tributária
do ICMS.
O
argumento utilizado pelos defensores da ST era de que o modelo arrecadatório
seria aplicado a produtos vendidos em larga escala e de difícil controle, como
cigarros, bebidas, combustíveis etc. Mas esse argumento caiu por terra quando
milhares de produtos desembocaram no sistema de pagamento antecipado com
eliminação da figura do substituto tributário. O modelo original previa a
figura do substituto e do substituído, como se fosse pai e mãe. Os anos se
passaram, quando então a voracidade arrecadatória fomentou a criação duma
modalidade que perverteu a própria natureza da criatura aleijada de nascença.
Ou seja, criou-se uma substituição sem substituto, batizada com o apelido de
substituição tributária interna. Desde então, o contribuinte passou a pagar
imposto antecipado tanto para o fornecedor quanto para a própria Sefaz. A bagunça
virou chafurdo com um monte de variações do mesmo imposto.
Na
realidade, o ICMS lá do passado, que era um só ICMS, foi replicado numa
infinidade de modalidades tributárias. Hoje, são muitos ICMS, sendo que um não
se confunde com o outro. Por exemplo, a Sefaz não permite compensação de uma
modalidade com outra do mesmo ICMS, o que é uma gritante ilegalidade. Mas, como
é sabido de todos, ilegalidade é o sobrenome da Sefaz. Por exemplo, uma empresa
detentora dum crédito de 700 mil reais passou dois anos pagando ICMS ST e ICMS
antecipação e ICMS estimativa porque só podia compensar o crédito com ICMS
apuração. O dono da empresa quase enfarta de tanta raiva.
O
aleijado animal de membros amputados pela própria mãe Sefaz nunca teve
descanso, justamente por ser uma aberração da natureza tributária. O fato é que
depois de uma verdadeira cruzada jurídica, finalmente o RE 593849 STF jogou uma
pá de cal na questão do ressarcimento de prejuízos causados pela antecipação do
imposto. A partir de então as administrações fazendárias estão com um espinhoso
abacaxi para ser descascado. A saída para minimizar o bombardeio de
indenizações está no sepultamento do modelo de substituição tributária do ICMS.
Nesse contexto, o estado de Santa Catarina se adiantou ainda no primeiro
semestre do ano passado ao retirar meio mundo de produtos da ST interna. O
Amazonas meteu os pés pelas mãos ao se enrolar todinho nas tais Resoluções
GSER. Um papelão.
A
modalidade de ICMS ST é ruim não somente para o contribuinte. A Sefaz reclama
muito da perda de arrecadação provocada pelo sistema. Por exemplo, quando uma
empresa compra um produto de fora do estado, ela completa a tributação pelo
pagamento da diferença de alíquota. Daí, pra frente é aplicada a alíquota
interna sobre o valor agregado pelo comerciante. Como a ST só pode ser cobrada
uma única vez, a Sefaz perde o imposto sobre os valores agregados nas fases
subsequentes de comercialização. Talvez, o ganho de eficiência arrecadatória
esteja na eliminação dos excessos normativos. Uma legislação mais enxuta e mais
objetiva possibilitaria uma melhor eficiência arrecadatória. A confusão
normativa só favorece os esquemas corruptos. Curta e siga @doutorimposto
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