Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 8 / 6 / 2021 - A425
Artigos publicados
Até
o ano de 2015 cada estado normatizava o enquadramento de mercadorias no regime
do ICMS substituição tributária interna. Tal situação produzia um conflito de
terminologias e dificultava a vida dos comerciantes. A partir de 2016 as fazendas
estaduais passaram a seguir uma nomenclatura padronizada pelo Convênio 92, o qual
estabeleceu 25 categorias de produtos, chamadas de anexos. O Convênio 92 foi substituído
pelo Convênio 52 que foi substituído pelo atual Convênio 142/2018. Cada anexo enumera
uma lista de produtos, onde são especificados: código CEST, código NCM e
descrição. Portanto, a mercadoria deve ter forte vinculação com um dos anexos
para ser taxada pelo ICMS-ST.
O enquadramento no regime do ICMS-ST deve considerar o código NCM, a descrição, a atividade da empresa e aplicação do produto. O código CEST pesa substancialmente nos contenciosos classificatórios. Um determinado produto deixa de ser taxado pelo ICMS-ST quando sua aplicação diverge do anexo onde está listado. Por exemplo, o item 64 do Anexo XI do Convênio 142 aponta “tubos de cobre utilizados na construção”. Sendo assim, quando esse produto é utilizado no conserto de aparelhos de refrigeração, ele deixa de ser tributado pelo ICMS-ST. O supracitado item 64 se repete no item 56 da Resolução GSefaz/AM 40 de 2015.
Os itens 60 e 61A da Resolução 39 enquadram aparelhos elétricos para filtragem de água no regime do ICMS-ST. Desse modo, o filtro para torneira de cozinha não pode ser taxado por esse regime, já que a supracitada Resolução 39 especifica produtos eletroeletrônicos.
Tempos atrás, a Sefaz obrigou uma empresa a pagar ICMS-ST sobre aquisição de uma hélice motorizada que é parte integrante dum compressor de câmara frigorífica. O produto foi enquadrado no item 52 da dita Resolução 39, cuja descrição é “ventilador”. A Sefaz cometeu um erro grosseiro, uma vez que todos os itens listados nessa resolução são objetos prontos para uso; não há menção de partes e peças.
Outra situação escalafobética impacta diariamente o álcool em gel, que está pagando ICMS-ST de cachaça (alíquota 30%; MVA 120%). Milhares e milhares de contribuintes estão sendo obrigados a pagar os percentuais diretos de 54% ou 59% ou 62%, ao invés de 6% ou 11% ou 14%. Com a faca na garganta, o comerciante acaba pagando o percentual errado. Mesmo porque, quando o contribuinte alega que pagava antecipação por Difal, o funcionário da Sefaz ameaça modificar as notificações antigas para substituição tributária, o que implicaria no lançamento monstruoso de carga fiscal no domicílio tributário eletrônico. É essa, a resposta que muitos comerciantes estão recebendo quando contestam as cobranças indevidas. O nome disso é terrorismo de Estado. Na verdade, é um caso de polícia.
Pois é. Nos últimos meses, a Sefaz vem rejeitando as reanálises que anteriormente eram homologadas. No caso dos tubos de cobre, a Sefaz cobrou R$ 15.176,02 (ST) ao invés de R$ 7.236,08 (Difal). O contribuinte prejudicado é uma empresa de 4 empregados, onde o proprietário sabe que seus concorrentes estão pagando diferença de alíquota ao invés de substituição tributária. A empresa tentou pagar da mesma forma que fazia nas operações anteriores, sem sucesso. Essa empresa chegou ao ponto de recorrer à Ouvidoria de mentirinha da Sefaz, que não deu retorno nenhum. Tal situação calamitosa mostra que a Sefaz se transformou num cassino, onde um contribuinte paga 11% e o outro paga 23% sobre o mesmo produto. Problema semelhante, está acontecendo com o filtro de torneira, com o álcool gel e com diversos outros produtos.
Não existe uma normatização legal que especifique cada produto sujeito ao regime da substituição tributária (marca, modelo, fabricante etc.). A Sefaz burocratizou tanto o ICMS que agora a tributação é produto a produto, empresa por empresa. Alguém pode dizer que é virtualmente impossível fazer uma lista capaz de conferir objetividade classificatória de tudo quanto é produto, mas é bom lembrar que quem criou essa insanidade toda foi a Sefaz, em conjunto com as Fazendas dos outros Estados. Portanto, ela que se vire para resolver o problema do comerciante amazonense.
A nossa realidade atual mostra que milhares de produtos caíram no poço do subjetivismo perverso. E já que não existe objetividade legal que classifique produto a produto, vários comerciantes sabem que o retorno dos pedidos de reanálise depende do humor do analista da Sefaz, que ora classifica como ST e ora classifica como Difal (vai da sorte de cada contribuinte). Pode ser também que um analista seja inclinado para o Difal, enquanto outro funcionário oscila para o ICMS-ST. O pior de tudo é que tais flutuações pendulares não são fiscalizadas por nenhum órgão independente. Sendo assim, milhares de produtos movem-se dum lado para o outro todos os dias (ST/Difal), abrindo caminhos para pesados esquemas de corrupção.
Todo esse chafurdo classificatório suscita a desconfiança de que determinado contribuinte pode sempre pagar menos, enquanto o concorrente pode sempre pagar mais. E como o imposto é um item expressivo na formação de preço, a Sefaz acaba por fomentar um ambiente de concorrência desleal, contrariando a determinação constitucional que proíbe tratamento desigual entre contribuintes (artigo 150 inciso II)
Milhares e milhares de estabelecimentos comerciais travam lutas individuais, onde quase sempre perdem a batalha. Essa triste realidade acontece porque os comerciantes são órfãos tributários. Isto é, não contam com um pai que os defenda. A Sefaz não ataca a indústria porque sabe que a resposta é imediata. A FIEAM faz um trabalho de permanente dissecação normativa que protege seus afiliados dos abusos governamentais. Por outro lado, a Sefaz faz gato e sapato dos comerciantes porque conhece bem a fragilidade organizacional dessa classe de contribuintes. Se o comércio tivesse a mesma força da indústria, o secretário da Sefaz já teria sido convocado para explicar a tributação do álcool gel, do filtro de água, do tubo de cobre, da hélice de compressor etc. Os comerciantes que sofrem horrores tributários deveriam cobrar da Sefaz uma formalização legal que determinasse a taxação correta de tudo quanto é produto, mesmo que a lista tivesse um milhão de páginas.
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