Doutor Imposto
Publicado no Jornal Maskate dia 09/10/2015 - A013
Vivemos
um estado de inúmeras ilegalidades tributárias. Quando não somos obrigados a
engolir flagrantes e ostensivos atentados ao estado de direito, o poder público
tenta nos engabelar com joguinhos sofismáticos recheados de tecnicismos embusteiros
(pura malandragem).
A
nossa Carta Magna determina que a carga tributária do ICMS PODERÁ ser seletiva
em função da essencialidade das mercadorias ou serviços por ele alcançados
(artigo 155, inciso II, parágrafo 2, item III). Essa seletividade é aplicada
tributando-se com alíquotas diferentes mercadorias diferentes. Ou seja, quanto
maior a essencialidade do produto, menor a alíquota; quanto menor a
essencialidade do produto, maior a alíquota. Trocando em miúdos, cigarro e
bebida alcóolica são considerados produtos supérfluos, sendo, portanto,
sujeitos a uma taxação maior enquanto os itens da cesta básica deveriam possuir
uma carga bem pequena. Interessante, é que o termo escolhido pelo legislador
foi PODERÁ, e não DEVERÁ. Em sendo PODERÁ, as unidades federativas não se
sentem na obrigação de estabelecer alíquotas de ICMS em função dessa dita cuja
essencialidade. Por conta dessa situação facultativa estado nenhum segue à
risca esse tal PRINCÍPIO DA ESSENCIALIDADE. Por exemplo, aqui no Amazonas, os
automóveis são tributados a 12% de ICMS enquanto a energia elétrica é taxada a
25%. As telecomunicações sofrem o impacto de 30% de ICMS e o gás de cozinha,
17%. Detalhe importante: O ICMS é um tributo “por dentro”. Isso significa que a
alíquota de 17% é na realidade 23% se considerarmos o percentual de 9,25% de
PIS/Cofins. Uma carga de 25% é na verdade 33% e uma taxação de 30% representa
um peso de 42%. Essa esquizofrenia tributária acontece porque o tributo é base
de si próprio e de outros tributos. Uma artimanha tipicamente brasileira, ardilosamente
construída para engabelar o povão ignorante.
De
acordo com o entendimento do legislador amazonense, o automóvel é duas vezes
mais essencial do que a energia elétrica; e quase três vezes mais necessário do
que uma chamada telefônica. Esse grau de essencialidade é quase que o dobro do
gás de cozinha. Isto é, a nossa legislação entende que o cidadão pode muito bem
ficar sem gás em casa, mas jamais poderá viver sem um carro na garagem. Até
poucos anos atrás, a nossa cesta básica tinha a menor taxação de ICMS do Brasil
(1%), sendo que da noite para o dia passou a ser a mais pesada (17%). Como
sempre foi e como sempre será, o alvo do governo é sempre o mais pobre. Toda
sanha arrecadatória promovida pelos governos federal, estadual e municipal tem
sempre como alvo a população de baixa renda. Nos Estados Unidos os alimentos
não pagam imposto nenhum, enquanto por aqui o refrigerante mais simplesinho que
o povão consome paga 50% de tributos. Ou seja, não fosse a taxação embutido
seria possível levar o dobro de refrigerante para casa.
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