segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

NÃO TÁ NADA BEM


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 29/12/2015 - A237

O campeão de boxe Joseph Climber empanturrou-se na ceia de natal e logo em seguida exagerou nas peripécias amorosas com a namorada. O rebuliço foi tamanho que sofreu um AVC, ficando paralisado de todo o lado esquerdo do corpo. Nosso personagem abandonou a carreira de lutador e arranjou um emprego de telefonista. Por motivos óbvios ele tinha dificuldades de atender ao telefone e anotar recados. Por sorte, sua capacidade criativa o fez desenvolver um atendedor automático que agilizou por demais seu trabalho. Acontece que um terrível acidente o fez perder a voz. E juntamente com a voz perdeu o emprego. Joseph passou a se comunicar com sua mão direita, sendo que em poucos meses se tornou um maestro consagrado. Mas a vida é uma caixinha de surpresas. Um infortúnio levou o nosso protagonista a ficar completamente surdo, encaminhando-o para o campo, onde conseguiu um emprego de operador de máquina. O problema é que numa bela manhã de sol a máquina triturou o seu braço direito. O senhor Climber voltou para a cidade, onde passou a pintar belos quadros com seu pé direito, o que lhe rendeu fama e admiradores. Mas, novamente, um trágico acontecimento o levou a perder as pernas. Qualquer um de nós ficaria chateado, desmotivado, abatido, mas Joseph Climber se tornou um dos mais importantes funcionários dos Correios, selando milhares de cartas por dia com sua língua prodigiosa. Esse parágrafo foi baseado num vídeo dos humoristas Melhores do Mundo.

O cidadão brasileiro é um otimista crônico. As coisas ruins vão acontecendo ao mesmo tempo em que ele insiste num jeito de se ajustar às circunstâncias. E sempre encontra algo de positivo em meio aos escombros das tragédias cotidianas. Por sua vez, as nossas autoridades capitalizam essa informação de forma magistral. Os discursos e as retóricas inflamadas arrebatam corações e mentes, justamente por explorar esse ponto sensível da alma brasileira (Sou Brasileiro; Não Desisto Nunca). Dessa forma, assistimos ao festival de mazelas, ingerências, corrupção e descaso do poder público e mesmo assim ficamos inebriados com os discursos incessantes veiculados na mídia de que “a crise é resultado de fatores externos" ou que “por enquanto faltará carne no prato do povo”, mas que “o cenário econômico ruim será desanuviado em 2017”. Resumindo, estamos à beira do abismo, com a corda no pescoço e mesmo assim mantemos a fé e o otimismo de que tudo ficará bem. Ledo engano.

Na verdade, não tá nada bem. Tá tudo errado. Num país sério, bastaria um centésimo da bandalheira promovida pelo nosso governo para a população se rebelar numa guerra civil. Por aqui, metade do Congresso é alvo de processos judiciais. Os principais ícones ligados à presidência da república foram condenados por crimes hediondos. O Judiciário, última esperança do brasileiro, foi contaminado pela desconfiança e pelo comércio de sentenças. Para piorar, o Presidente da mais alta corte resolveu tornar público uma reunião com o Presidente da Câmara, justamente por não confiar no caráter do interlocutor e por temer joguetes de versões.

Por conta de tanto descalabro que tomou conta do país, a população sensata volta todas as suas esperanças em direção ao Juiz Sérgio Moro, último e derradeiro bastião da seriedade. Nenhuma pessoa honesta e bem informada acredita em mais nada que venha do poder público. Tanto, que, se, hoje, o Deputado Tiririca se candidatasse à presidência da república, é possível que ganhasse de lavada dos demais candidatos. Infelizmente, não temos opção. As figuras que se apresentam como prováveis substitutos da presidente Dilma estão desmoralizados por infinitas denúncias. E, para piorar, os programas políticos que vez por outra invadem a televisão trazem mais do mesmo. Não conseguimos identificar nenhuma mudança nos velhos e surrados discursos – ninguém traz uma proposta nova. Tudo está ensopado com o grosso caldo do marketing político. Tanto, que é possível enxergar no semblante do candidato a leitura dum teleprompter, indicando assim que as ideias são construídas por um marqueteiro profissional. Estamos numa sinuca de bico.



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