Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 21 / 6 / 2016 - A256
Seu
Cândido fumou a vida inteira sem que tal hábito comprometesse suas atividades
rotineiras. Sempre bem humorado e disposto, eis que lá pelos 50 anos de idade
começaram a surgir vários problemas de saúde, como indisposição crônica, tosse
persistente, cefaleia, gastrite etc. Tempos depois veio uma bronquite, uma
úlcera e um agressivo câncer de pulmão. Parece que tudo aconteceu ao mesmo
tempo. Aquele homem forte e dinâmico estava na lona. Tantos desatinos poderiam ter
sido evitados, mesmo porque amigos e familiares não cansavam de alertar o Seu
Cândido para os riscos do cigarro.
Pois
é. O cigarro do brasileiro é a corrupção. Depois de décadas queimando uma
tragada atrás da outra, eis que as consequências dessa prática corriqueira explodiram
numa interminável sucessão de escândalos cabeludos e aterradores. Nesse momento
estamos na UTI, acometidos de uma metástase cancerígena. A gravidade do momento
é tamanha que muito se diz ser a maior crise da nossa história. Não é pra
menos. A corrupção, tolerada, escamoteada, tergiversada, vinha de longa data se
expandindo e contaminando todas as células do poder público, sendo que nos
últimos tempos a coisa ganhou uma aceleração desembestada, como um agressivo câncer
terminal. O governo interino, que poderia acenar para uma moralização
administrativa, chegou cercado de denunciados em irregularidades diversas,
mostrando assim que o combate à corrupção não é um assunto prioritário. Dessa
forma, fica a impressão de que as forças políticas insistem na manutenção do
velho modelo que encheu o bolso de muita gente com dinheiro sujo.
Fato
venério (como diria Paulinho Gogó), ninguém quer seriedade no trato da coisa
pública; ninguém quer desgrudar a boca da teta, mesmo com a vaca cambaleando. Um
bom exemplo é a modificação do projeto que limitava a influência política nas
diretorias de estatais. Outra situação absurda: Assistimos de camarote à feroz
resistência dos parlamentares ao projeto do Ministério Público “Dez Medidas
Contra a Corrupção”. Impressiona o descaramento desse pessoal: O mundo
desabando sobre suas cabeças e mesmo assim os dentes das criaturas hediondas se
mantêm cravados no osso da bandalheira. Se fizermos um exercício de abstração,
iremos concluir que roubo e política representam um único corpo, com quatro
braços, duas cabeças e um só estômago. Impossível separar uma coisa da outra.
Por
que os políticos são radicalmente contra o projeto do Ministério Público? A
resposta está na proposta apresentada ao Congresso Nacional: 1 Prevenção à
corrupção, transparência e proteção à fonte de informação; 2 Criminalização do
enriquecimento ilícito de agentes públicos; 3 Aumento das penas e crime
hediondo para corrupção de altos valores; 4 Aumento da eficiência e da justiça
dos recursos no processo penal; 5 Celeridade nas ações de improbidade
administrativa; 6 Reforma no sistema de prescrição penal; 7 Ajustes nas
nulidades penais; 8 Responsabilização dos partidos políticos e criminalização
do caixa dois; 9 Prisão preventiva para evitar a dissipação do dinheiro
desviado; 10 Recuperação do lucro derivado do crime. Sabemos todos nós que o
plantel atual de políticos não vai aprovar nenhuma dessas medidas. Sabemos
também que o universo político vai se unir para derrubar todas essas propostas.
Daí, que aqueles movimentos organizados que saíram às ruas para impichar a
Dilma bem que poderiam peitar os opositores do Ministério Público. Talvez essa
possa ser a maior luta da nossa história.
Dia
17, último, na solenidade de posse da nova diretoria da ACA, o prefeito
discorreu sobre sua gestão e suas batalhas em defesa dos interesses da capital
amazonense. Por breves momentos, a plateia foi envolvida e arrebatada pela
consistente apresentação de tantas realizações da atual gestão. Fato
indiscutível, o chefe do executivo municipal é um homem erudito e um grande
líder. Foi gratificante a sensação de ver um gestor público prestando contas na
frente da sua grande equipe de auxiliares. Pena que logo depois nos lembramos
do estado terminal do corpo político. Pena que estamos tão escaldados. Não
fosse isso, poderíamos ter ido embora carregando o sentimento de que não existe
corrupção na nossa cidade.
Em
meio ao mar de lama que borbulha nos canais midiáticos fica a dúvida: Em quem
confiar? Em quem votar? O castelo de cartas desabou totalmente, não sobrando nada
que possa ser aproveitado. Nenhum discurso, por mais belo que seja, é capaz de
afastar a nuvem negra que paira sobre nossas cabeças. A coisa tá tão feia que o
Deputado Tiririca seria eleito presidente do Brasil se assim o quisesse. Mesmo
porque, corre na internet a notícia da expulsão com empurrões e xingamentos de
um operador do petrolão que queria trocar seu apoio por uma mala de dinheiro.
Esse fato é único em toda a história do Brasil: um político sem etiqueta de
preço pendurada no pescoço. Só por isso a população votaria em massa no
Tiririca. Afinal de contas, político honesto é a raridade da excepcionalidade.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Sua mensagem será publicada assim que for liberada. Grato.