Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 7 / 11 / 2017 - A 312
O
empreendedor que planejava abrir um pequeno empório na Rua Ferreira Pena teve
seu processo de constituição empresarial empacado pela Secretaria Municipal de
Meio Ambiente e Sustentabilidade. A Semmas alega que a localidade do
empreendimento, que fica defronte à paróquia Sagrado Coração de Jesus, é uma
reserva ambiental, e que, por isso mesmo, precisava fazer uma série de análises
de viabilidade técnica. O pequeno comércio em nada impactará o ambiente com
fumaça, ruídos, produtos químicos, resíduos perigosos etc. Mesmo assim, o
processo, iniciado no GAP dia 10/03/2017, passou depois pelo DEFIS, DTO, DJUR,
DELIC, DIGEO, DEGTA, DELIC, DIGEO até estacionar dia 05/06/2017 no DEGTA.
Detalhe importante: Todo esse imbróglio da Semmas é apenas uma pequena parte do
processo de constituição da empresa, que depois terá que passar pela mesma
via-crúcis na Vigilância Sanitária, Corpo de Bombeiros, Receita Federal, Sefaz,
Semef, Implurb etc. O processo 201715848**********51 está empacado na Semmas
porque o dono do empreendimento se recusou a utilizar os serviços dos
“solucionadores” de problemas que orbitam os órgãos da prefeitura de Manaus. Se
a propina tivesse sido paga, o processo teria sido liberado em menos de uma
semana.
O
que o Uber nos ensina?
O
Uber mostra o quão degradante é o nosso sistema institucional de organismos
regulamentadores da vida do cidadão. O serviço de transporte por aplicativo é
dinâmico, prático, tecnológico e econômico (metade do preço do taxi). O Uber
solucionou o problema de locomoção de muita gente que jamais poderia utilizar
serviços de taxi. O contato é rápido, o passageiro monitora o deslocamento do
motorista, o preço é determinado previamente etc. O serviço do taxi está parado
na era do telefone, o passageiro fica numa espera angustiante sem ter noção
nenhuma do momento exato da chegada do motorista, e o valor é imprevisível
porque depende do tempo igualmente imprevisível do deslocamento até o destino.
O dono do taxi tem um benefício fiscal gigantesco para aquisição do automóvel;
o motorista do Uber, não. Por outro lado, os taxistas arcam com monstruosas
dificuldades para trabalhar na praça. Não querendo estigmatizar os taxistas que
sustentam suas famílias com muito sacrifício, sabe-se que a internet está cheia
de notícias de utilização dos serviços de taxi para lavagem de dinheiro. Outra
faceta perversa dessa atividade reside nos grandes conglomerados de placas nas
mãos de poucos detentores que terceirizam os carros para trabalhadores que
ficam com uma pequena parcela da renda diária. Tanto o é, que muitos taxistas
migraram para o Uber, que rende muito mais para o bolso de quem bota a mão na
massa. O Uber confronta grupos poderosos (públicos e privados).
Pois
é. Pela primeira vez na vida, o brasileiro viu uma coisa difícil se tornar
fácil. Muita gente simples e de baixa renda está experimentando as maravilhas
dum deslocamento rápido e confortável para cuidar das suas atividades diárias.
Até os proprietários de veículos estão deixando o automóvel em casa para andar
de Uber.
O
governo viu o esculachado cidadão brasileiro experimentar o gostinho da
civilidade e não gostou nem um pouco. Afinal de contas, o povão merece é muita
peia pra deixar de ser besta. Onde já se viu pobre andar de carro? É muita
petulância!! Onde já se viu motorista trabalhar sem pagar propina para meio
mundo de bandidos travestidos de funcionários públicos?
Pra
acabar com a farra da cidadania, o Congresso está correndo para aprovar o PLC
28/2017, que traz uma infinidade de procedimentos normativos junto a dezenas de
órgãos públicos que o sistema Uber terá que observar. Há quem diga que o taxi
paga imposto e o Uber, não. Acontece que o Uber já recolheu em 2017 a cifra de
495 milhões de reais ao erário. E os taxistas, quanto pagaram? Quem tem essa
informação?
O Uber escancara as razões do nosso atraso civilizatório. Tudo no
Brasil é caro e difícil por causa duma vasta e capilarizada rede de corrupção.
É espantosa a lista de coisas que no Brasil custa duas, três, quatro, cinco vezes
mais caras do que nos Estados Unidos. A diferença do preço está no tal Custo Brasil.
Esse Custo Brasil nada mais é do que o custo da corrupção. A corrupção é um
ônus que sobrecarrega tudo que o brasileiro consome. A Operação Lava-Jato vem
rotineiramente mostrando como o custo dos empreendimentos públicos é
multiplicado pelo vultoso montante de dinheiro distribuído para uma imensa rede
de famintos corruptos. E isso acontece em tudo; acontece nas fábricas, acontece
nos serviços, acontece nos juros bancários, acontece nas taxas do cartão de
crédito, acontece no preço das passagens aéreas etc. Os corruptos não param um
só minuto de roubar. Daí, o motivo do rebuliço entre os entes governamentais
que frequentemente se digladiam por cargos, privilégios e esquemas diversos. Os
políticos perderam totalmente a compostura. Ninguém mais se preocupa com
demagogia. Os atos agora são retos e sem meias palavras. A degradação é total e
absoluta.
É sabido e notório que o brasileiro só consegue alguma coisa nos
órgãos públicos mediante o pagamento de propina. Tudo é movido a propina. Cada
músculo do corpo do atendente só responde ao estímulo propinolístico. O
processo só tramita mediante pagamento de propina.
A Operação Zelotes descortinou um esquema brabíssimo de corrupção
envolvendo julgadores e julgados. A Lava-Jato vem mostrando que as legislações
são encomendadas para atendimento de interesses criminosos de grupos poderosos.
Os legisladores tributários são mestres na construção de estruturas normativas
indecifráveis. O sistema tributário como um todo é uma imensa máquina
fomentadora da corrução. Os políticos tripudiam na cara do cidadão com atitudes
obscenas e escarnecedoras. O Judiciário passou a chocar diariamente a população
brasileira com solturas sistemáticas de bandidos extremamente perigosos. O
político é filmado com a mala de dinheiro e no dia seguinte é solto pelo STF. O
sistema jurídico institucional está se dilacerando a olhos vistos. A mídia
refratária e conivente trata tudo com uma normalidade perturbadora. O único
apresentador de TV que rasga o verbo é o José Luiz Datena. Todo o resto faz
cara de paisagem quando noticia barbaridades oriundas do planalto central.
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